A maioria de nós sabe o contexto em que esta pergunta foi feita, há muito tempo, perto da aurora da história humana. Caim disse estas palavras depois de matar seu irmão Abel, e depois de ter mentido descaradamente para Deus quando lhe foi perguntado: “Onde está Abel, teu irmão?” (Gn 4:9). O que poderia ter se passado pela mente de Caim, além desse impulso carnal de negar a culpa por seu ato brutal? Ele estava afirmando sua independência, tanto de prestar contas a Deus, quanto de assumir qualquer responsabilidade pelo bem-estar de seu irmão.
Afirmar ou defender a própria independência em questões morais e espirituais nunca é algo elogiado por Deus. A independência espiritual é a rejeição da ideia de prestar de contas a Deus. Independência moral é a recusa de prestar contas a outra pessoa ou grupo de pessoas por suas ações, e muitas vezes inclui desprezar a responsabilidade dada por Deus pelo bem-estar dos outros. Encontramos manifestações desse espírito de independência no coração do homem natural em muitos outros personagens da Bíblia, e vamos brevemente observar apenas mais dois deles.
Faraó mostra seu caráter e começa sua espiral descendente em direção à destruição ao fazer esta pergunta em tom de desprezo: “Quem é o Senhor, que eu deveria obedecê-lo para deixar ir Israel?” (Ex 5:2) Ele imediatamente responde à pergunta de sua própria condenação: “Eu não conheço o Senhor”. Não há dúvida de que a consciência de Faraó foi tocada quanto às reivindicações de Deus para com ele, mas ele desprezava qualquer prestação de contas ao seu Criador, e qualquer a responsabilidade pelo bem-estar do povo de Jeová.
Nabal era um homem “grosseiro e mau”, o oposto de sua bela e piedosa esposa, Abigail (1 Sm 25). Quando Davi e seus homens quiseram encontrar justamente alguma consideração de Nabal, ele retrucou com uma pergunta muito semelhante à de Faraó: “Quem é Davi, e quem é o filho de Jessé?”. E não contente em parar por aí, acrescentou um insulto à injúria e deu sua opinião sobre quais seriam os motivos de Davi: “Muitos servos há hoje em dia que fogem ao seu senhor.” Em outras palavras, Nabal considerou Davi um rebelde que conseguiu sua independência de Saul, e se Davi queria obter algum sustento para si e seus seguidores, ele que voltasse a se submeter a seu antigo senhor. Mas Davi era um fugitivo, não um rebelde.
Ora, para nós Davi é uma bela figura do Senhor Jesus Cristo. No relato que acabamos de mencionar, Nabal censurou David, assim como os fariseus repreenderiam Jesus séculos depois e com o mesmo espírito orgulhoso, acusando-o de ter uma missão independente, ao dizerem “tu deste registro de ti mesmo! Teu testemunho não é verdadeiro” (Jo 8:13-14) Mas nunca houve um homem mais dependente nesta terra que o nosso bendito Senhor, de modo que as acusações dos fariseus contra o maior Filho de Davi apenas serviram para manifestar o afastamento deles próprios de Deus e Sua verdade (Jo 5:30-38; 6:38-40).
Não deve ser surpresa para nós que os pecadores insistam em sua independência moral e espiritual, mas qual seria a lição para os cristãos em figuras como estas? “Porque nenhum de nós vive para si, e nenhum morre para si” (Rm 14:7-9). Que os nossos corações e consciências estejam sempre exercitados na dependência de Deus, tendo ao Senhor Jesus como nosso exemplo, e deixemo-nos ser e agir de acordo com a nossa responsabilidade para com Ele e para os demais no corpo de Cristo. Ele veio, não para agradar a si mesmo, mas “tomou sobre Si a forma de servo”.
Um espírito independente pode ser aceitável em uma sociedade que valoriza a independência política, mas o que deveria caracterizar o espírito dos justos? Nosso Deus irá certamente honrar e recompensar a vida que é dependente, responsável e conforme à imagem de Seu Filho.
John Kulp, publicado em Greater Riches.