Santidade Prática
Temos de nos sentir muito agradecidos a Deus, depois que o Espírito Santo iluminou o entendimento de um homem, dispersou a névoa do erro e o firmou na Verdade. Mas isto é apenas o começo. As Escrituras Sagradas são proveitosas não somente para o “ensino”, mas também “para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2 Tm 3.16).
Observe bem esta ordem: antes de estarmos prontos para ser instruídos na “justiça” (fazer o que é correto), há muito em nossa vida que Deus reprova e que Ele tem de corrigir. É necessário que seja assim, pois, antes de nossa conversão, tudo estava errado em nossa vida. Tudo que fazíamos tinha em vista a satisfação de nosso “eu”, sem nos preocuparmos com a honra e a glória de Deus.
Portanto, a primeira grande necessidade e o principal dever de todo novo convertido não é estudar as figuras do Antigo Testamento, ou quebrar sua cabeça com profecias, e sim examinar com dedicação as Escrituras, a fim de descobrir o que é agradável a Deus e o que não é, aquilo que Deus nos proíbe e o que Ele nos ordena.
Se você foi verdadeiramente convertido, sua primeira preocupação tem de ser determinar os detalhes de sua vida – no lar, na igreja, no mundo – de modo que agrade a Deus. E, ao realizar isto no presente, a ordem será esta: “Cessai de fazer o mal. Aprendei a fazer o bem” (Is 1.16-17); “Aparta-te do mal e pratica o que é bom” (Sl 34.14; cp. Sl 37.27). Tem de haver uma destruição, antes de ocorrer uma edificação (Ec 3.4). Tem de haver um esvaziamento do “eu”, antes de acontecer o enchimento do Espírito. Precisa ocorrer um desaprendizado, antes de acontecer o verdadeiro aprendizado. Tem de haver um aborrecimento do “mal”, antes de existir o amor pelo “bem” (Am 5.15; Rm 12.9).
Ora, se o novo crente realmente utiliza as Escrituras Sagradas, de uma maneira prática, para regular seus pensamentos, seus desejos e suas ações, por intermédio das advertências e dos conselhos, das proibições e dos preceitos das Escrituras, isso determinará a medida em que ele desfrutará da bênção de Deus em sua vida. Deus, o Governador do mundo, observa nossa conduta e, mais cedo ou mais tarde, manifesta seu desprazer contra os nossos pecados, bem como sua aprovação sobre um andar de retidão, concedendo a medida de realização que contribui para o nosso bem e para a glória d’Ele mesmo. Em guardar os mandamentos de Deus, “há grande recompensa” (Sl 19.11), nesta vida (1 Tm 4.8). Oh! quantas bênçãos temporais e espirituais muitos crentes perdem, por causa de um conduta negligente e desobediente! (ver Is 48.18).
O fato trágico é que, ao invés de o novo crente estudar diligentemente a Palavra de Deus, a fim de descobrir para si mesmo os detalhes da vontade divina, o crente novo faz muitas outras coisas. Muitos se envolvem em uma “obra pessoal” ou em alguma forma de “serviço cristão”, enquanto têm a vida repleta de coisas que desagradam a Deus. A presença dessas coisas desagradáveis, em suas vidas, obstrui a bênção de Deus sobre suas almas, corpos e afazeres temporais. E, para tais pessoas, precisamos dizer: “Os vossos pecados afastam de vós o bem” (Jr 5.25). A mensagem de Deus para seu povo é: “Desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor” (Fp 2. 12). Oh! quão pouco deste “temor e tremor” pode ser visto em nossos dias! Ao invés disso, encontramos autoestima, autoconfiança, vanglória e confiança na carne. Há outros que se dedicam ao estudo diligente de doutrinas, porém, frequentemente, falham em compreender que a doutrina das Escrituras não é uma série de proposições intelectuais, e sim a doutrina “segundo a piedade”. A “doutrina” ou “ensino” da santa Palavra de Deus é concedido não para a instrução de nosso intelecto, e sim para regular todos os detalhes de nossa vida diária; e isto acontece para que adornemos, “em todas as coisas, a doutrina de Deus, nosso Salvador” (Tt 2.10). Mas isso pode se realizar tão somente por meio de uma constante leitura da Palavra, acompanhada pelo elevado propósito de descobrirmos aquilo que Deus proíbe e aquilo que Ele ordena; bem como por meio de nossa frequente meditação naquilo que lemos e de oração fervorosa suplicando graça sobrenatural que nos capacita a obedecer. Se no início de sua vida cristã, o novo crente não forma o hábito de trilhar o caminho da obediência prática em relação a Deus, então, quando ele orar, não terá os ouvidos de Deus a escutá-lo.
O apóstolo João afirmou com clareza uma das principais condições com as quais temos de buscar graça, para que as nossas petições recebam aceitação: “E aquilo que pedimos dele recebemos, porque guardamos os seus mandamentos e fazemos diante dele o que lhe é agradável” (1 Jo 3.22). Mas se, ao invés de nos submetermos às santas exigências de Deus, seguirmos nossas próprias inclinações, então, poderá ser dito sobre nós: “As vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça” (Is 59.2). Isto é extremamente solene! Oh! que diferença faz o desfrutarmos ou não de acesso experimental à presença d’Ele!
O novo crente, ao seguir o caminho da autossatisfação, não somente reduz as suas orações a palavras vazias, mas também traz sobre si mesmo a vara de Deus e todas as consequências erradas de sua vida. Esta é uma das razões por que muitos crentes estão sofrendo tão dolorosamente quanto as infelizes pessoas mundanas: Deus está insatisfeito com os caminhos deles e não se mostra forte para com eles (2 Cr 16.9). Neste sentido, procuramos mostrar o remédio, que nos convoca à verdadeira humilhação diante do Senhor, à contrição santa, ao verdadeiro arrependimento, à confissão irrestrita, à firme determinação de corrigirmos nossos caminhos. Este remédio é: somente quando estivermos andando no caminho da completa submissão a Deus (e não antes), a fé poderá contar com a misericórdia d’Ele e com a paciente expectativa de que Ele realizará maravilhas por nós.
Arthur Walkington Pink