A Igreja Evangélica de hoje se encontra na delicada situação de estar errada ao mesmo tempo em que está certa; uma simples preposição nesse caso faz a diferença. Penso que não há dúvida, mas se deixarmos a Bíblia decidir o que está certo e o que está errado, os evangélicos estão certos em sua posição doutrinária. Até o céptico H. L. Mencken disse: “Se a Bíblia é verdadeira, os fundamentalistas estão certos”. Ele não confirmou a fidelidade bíblica, mas foi inteligente o suficiente para ver que as doutrinas básicas ensinadas pelos fundamentalistas eram idênticas aquelas ensinadas pela Bíblia.
Um ponto em que estamos errados e, ao mesmo tempo certos, está na ênfase relativa que damos às preposições para e de quando estas acompanham a palavra salvos. Por uma longa geração, defendemos a palavra da verdade ao mesmo tempo em que nos afastávamos dela em espírito porque estávamos preocupados com a questão do que fomos salvos em vez da questão para que fomos salvos.
A importância correta referente a estes dois conceitos é apresentada por Paulo em sua primeira epístola aos Tessalonicenses: “(…) e como, deixando os ídolos, vos convertestes a Deus, para servirdes o Deus vivo e verdadeiro e para aguardardes dos céus o Seu Filho” (1:10).
O cristão é salvo dos seus pecados do passado. Ele não tem mais nada a ver com eles; esses pecados estão entre as coisas que devem ser esquecidas assim como o é a noite ao romper do dia. Ele também é salvo da ira vindoura. Também nada tem a ver com isso. Ela existe, mas não para ele. O pecado e a ira tem uma relação de causa e efeito, e uma vez que o pecado do cristão é anulado, a ira também é revogada. As preposições de da vida cristã dizem respeito a preposições negativas, e interessar-se profundamente por elas é viver em um estado de negação. Contudo, esta é a situação vivida por muitos cristãos sérios na maior parte do tempo.
Não fomos chamados para ter comunhão com a inexistência. Fomos chamados às coisas que existem na verdade, às coisas positivas, e é quando nos ocupamos com essas coisas que nossa alma é curada. A vida espiritual não pode se satisfazer com situações negativas. O homem que constantemente relembra as maldades dos dias em que não era convertido está olhando para a direção errada. É como um homem que tenta vencer uma corrida olhando pra trás por sobre os ombros.
O que o cristão costuma ser é a questão menos importante a seu respeito. O que deveria ser é tudo o que deveria lhe importar. Ele pode, de vez em quando, como fez Paulo, lembrar-se da vida que outrora levava para sua própria vergonha; mas isto não deve passar de um rápido retrospecto; nunca deve ser um olhar fixo. Nosso olhar permanente e prolongado está em Deus e na glória que será revelada.
De que fomos salvos e para que fomos salvos têm a mesma relação entre si como uma doença grave e a saúde recuperada. O médico deve se colocar entre esses dois elementos antagônicos para salvar alguém de uma condição e restaurá-lo à outra. Curada a terrível doença, sua lembrança deve ser banida da mente a fim de que fique mais vaga e mais fraca uma vez que se trata de um fato muito distante; e o ditoso homem, cuja saúde foi restabelecida, deve continuar a usar sua nova força para realizar algo útil para a humanidade.
Contudo, muitas pessoas permitem que o estado debilitado de seu corpo limite sua capacidade mental de modo que, após o restabelecimento do corpo, elas ainda guardam o velho sentimento de invalidez crônica que sentiam antes. Estão restabelecidas, é verdade, mas não para alguma coisa. Basta imaginarmos um grupo de pessoas testemunhando todos os domingos sobre suas últimas enfermidades e entoando cânticos tristes sobre elas e teremos um quadro perfeito de muitas reuniões cristãs de hoje.
Há uma arte por trás do esquecer, e todo cristão deve tornar-se um mestre nela. Esquecer as coisas que ficaram para trás é uma necessidade positiva para que nos tornemos simples crianças em Cristo. Se não podemos confiar em Deus para lidar com eficiência com nosso passado, podemos pegar uma esponja e começar a apagá-lo. Cinquenta anos sofrendo por nossos pecados não podem apagar a nossa culpa. No entanto, se Deus, de fato, nos perdoou e nos purificou, então, devemos dar a questão por encerrada e não perder mais tempo com lamentações que para nada mais servem.
E, graças a Deus, o esquecimento súbito de nosso conhecido passado não nos deixa com um vazio. Longe disso. O bendito Espírito Santo de Deus corre para ocupar o lugar vazio deixado por nossos pecados e falhas, trazendo consigo toda novidade de vida. Uma nova vida, uma nova esperança, novas alegrias, novos interesses, uma nova obra significativa e, o melhor de todas as coisas, um novo e suficiente objeto para o qual voltar o olhar arrebatador de nossa alma. Deus agora enche o jardim restaurado, e não há razão para termos medo de caminhar e comungar com Ele no frescor do dia.
Bem aqui está o ponto de fraqueza de muitos cristãos atualmente. Não aprendemos o que devemos enfatizar. Em particular, não entendemos que fomos salvos para conhecer Deus, entrar em Sua presença repleta de milagres pelo novo e vivo caminho e permanecer nela eternamente. Fomos chamados para uma eterna preocupação em relação a Deus. O Deus Trino, com todo o Seu mistério e majestade, é nosso e somos d’Ele, e a eternidade não será longa o suficiente para experimentarmos tudo o que Ele é em termos de bondade, santidade e verdade.
Nos céus, a adoração extasiada da Divindade não cessa nem de dia nem de noite. Professamos estar a caminho deste lugar; não devemos começar agora a adorar na terra como adoraremos no céu?
Aiden Wilson Tozer