Quando Daniel e seus três amigos souberam que haviam sido condenados à morte, eles clamaram a Deus. O Senhor os ouviu, e eles então agradeceram. Sua oração (Dn 2:17-23) é curta, mas impressiona pela sua estrutura ordeira. Parece quase um poema escrito com cuidado e planejamento (veja alguns detalhes no final, para quem interessar).
É claro que não estou sugerindo que eles prepararam um poema para apresentar a Deus em oração, nem que nossas orações deveriam ser frias e formais, ou que quem orar com mais eloquência ora melhor — não! Creio na necessidade de orarmos com sinceridade e liberdade, derramando a nossa alma perante o Senhor (I Sm 1:15), sem formalismo. Mas creio que o Espírito Santo inspirou esta oração para nos ensinar que orar a Deus é algo que merece ser feito com todo capricho e empenho. Os muitos exemplos de louvor ordeiro e estruturado nas Escrituras (vários deles já tratados nestas Meditações), confirmam isto.
Um dos aspectos principais do ato de orar (talvez o mais importante) é que oramos a Deus, e não aos homens. Isto quer dizer que quem tentar impressionar os outros com as suas orações estará desagradando a Deus! Mesmo assim, devo entender que Deus merece o meu melhor, e antes de orar devo pensar sobre o que vou pedir, e como vou pedir. Não quero dizer que devemos sentar e escrever um poema, e depois recitá-lo diante de Deus — isto seria formalismo exagerado! Mas devo entender que orar é uma atividade gloriosa, e deve ser feita usando todos os talentos que Deus me deu! Orando de forma displicente, caímos na condenação do povo de Israel, que oferecia a Deus animais que não eram perfeitos:
“Apresenta-o ao teu governador; porventura terá ele agrado em ti?” (Ml 1:7-8).
O que estou tentando dizer é que Deus aprecia mais o balbuciar incoerente e cheio de erros gramaticais de uma criança sincera do que a oração eloquente e estruturada de um acadêmico orgulhoso — numa emergência, siga o exemplo de Neemias (Ne 2:4-5) e ore a Deus imediatamente, sem rodeios ou preparação — mas ao mesmo tempo, lembre: quem se atreveria a orar a Deus com menos do que 100% de concentração?
Dediquemo-nos, portanto, a este exercício tão nobre e eloquente, sem jamais perder a liberdade sincera e confiante da criança.
“Estando Ele a orar num certo lugar, lhe disse um dos Seus discípulos: Senhor, ensina-nos a orar” (Lc 11:1).
Pensamos resumidamente sobre a estrutura da oração curta de Daniel em 2:17-23. Quero repetir o que enfatizei: esta estrutura destaca a importância do ato de orar, mas não quer dizer que devemos orar de forma formal e acadêmica. Não podemos estar mais preocupados com a forma do que com o conteúdo da oração! Nossas orações devem ser, em primeiro lugar, sinceras e autênticas — mas isto não tira o brilho e a importância do ato de orar. “Espontaneidade” não é sinônimo de “relaxo”!
Pense um pouco, hoje, sobre como Daniel orou.
Louvor pelo que Deus é: ele começou exaltando a Deus pelos Seus atributos divinos (“Seja bendito o nome de Deus de eternidade a eternidade, porque dEle são a sabedoria e a força; e Ele muda os tempos e as estações; Ele remove os reis e estabelece os reis; Ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos. Ele revela o profundo e o escondido; conhece o que está em trevas, e com Ele mora a luz”). Quantas vezes incluímos louvor nas nossas orações? Pensando nos exemplos bíblicos, uma boa regra é que, em situações normais, devemos sempre começar nossas orações exaltando a grandeza do Deus a quem oramos. Em situações de emergência, é claro, basta clamar: “Senhor, salva-me!” e seremos ouvidos (Mt 14:30). Mas quando nos preparamos para orar com calma, o primeiro pensamento deve ser: quão grande e perfeito é este Deus a quem estou orando!
Agradecimento pelo que Deus fez: tendo usado dez linhas (na versão da Bíblia que estou usando) para louvar a Deus pelo que Ele é, cinco linhas bastam para agradecer: “Ó Deus de meus pais, eu Te dou graças e Te louvo, porque me deste sabedoria e força; e agora me fizeste saber o que Te pedimos, porque nos fizeste saber este assunto do rei.”
Foi uma oração em duas partes. O objetivo específico da sua oração (agradecer pela resposta divina) ocupa o segundo lugar, e o menor espaço. Sugiro que podemos tirar disto uma lição simples: nossas orações devem dar prioridade ao louvor. Mesmo que você passe uma hora na presença de Deus intercedendo pelos outros, tire primeiro alguns minutos para exaltar a grandeza de Deus.
A “oração modelo” do Senhor Jesus confirma esta prioridade (Lc 11:1-4). Primeiro Deus e Seu reino, depois as nossas necessidades.
“Senhor, ensina-nos a orar” (Lc 11:1)
Finalizando, e tendo pensado um pouco sobre a estrutura e o assunto da oração registrada em Daniel 2:17-23, pensemos resumidamente sobre duas coisas que ela nos ensina.
1) A força de Deus nos tranquiliza. Diz Daniel: “Ele muda os tempos e as estações; Ele remove os reis e estabelece os reis”. Este é um tema recorrente no pequeno, mas precioso, livro de Daniel. Deus está em controle das circunstâncias naturais (“tempos e estações”) e da política mundial (“reis”). Como cristãos, podemos até nos assustar com o que acontece (veja Dn 4:19), mas jamais devemos desesperar. As coisas que estão acontecendo hoje, e as decisões tomadas por aqueles que pensam estar no controle, estão todas sendo controladas pela mão onipotente de Deus! Cremos nisto hoje?
2) A sabedoria de Deus nos orienta. “Ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos. Ele revela o profundo e o escondido; conhece o que está em trevas, e com Ele mora a luz”. Não cremos apenas que Ele conhece, intimamente, as trevas e a luz, mas também que “Ele dá sabedoria … e revela o escondido”. Ele nem sempre vai nos explicar por que Ele faz o que faz, mas Ele sempre nos mostrará como devemos agir em cada situação (Tg 1:5).
“Quer dizer”, diz alguém, “Que você nunca tem medo, e sempre tem certeza sobre o que fazer?” Não — infelizmente, não! Mas sempre podemos agir como a criancinha que, completamente confusa, sente segurança ao pegar na mão do seu pai e permitir que ele a guie pelo meio da multidão até o destino seguro.
Eu nem sempre sei — mas Deus sabe, e Ele me ajudará a entender também!
Que os sentimentos de Daniel na sua oração sejam os nossos também hoje!
W. J. Watterson
Detalhes — A Estrutura da Oração
Na primeira parte da oração, Daniel fala sobre Deus, enquanto no final ele dirige-se diretamente a Deus (repare a mudança de “Ele” para “Te”).
Ele louva a Deus por Ele ser o possuidor de duas coisas: sabedoria e força. Após citar alguns exemplos do segundo elemento, força (Deus muda tempos, remove e estabelece reis), ele trata do primeiro assunto, sabedoria (Deus dá sabedoria e conhecimento, revela o profundo e escondido, conhece as trevas, mora na luz). Depois ele termina agradecendo pelas mesmas duas coisas: sabedoria e força. Veja:
Introdução: “Seja bendito o nome de Deus de eternidade a eternidade, porque dEle são a sabedoria e a força;”
Força: “e Ele muda os tempos e as estações; Ele remove os reis e estabelece os reis;”
Sabedoria: “Ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos. Ele revela o profundo e o escondido; conhece o que está em trevas, e com Ele mora a luz.”
Agradecimento: “Ó Deus de meus pais, eu Te dou graças e Te louvo, porque me deste sabedoria e força; e agora me fizeste saber o que Te pedimos, porque nos fizeste saber este assunto do rei.”
Daniel 2:17-23
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