O Senhorio de Cristo

Numa série de três artigos vamos meditar sobre o fundamental tema do cristianismo autêntico: O SENHORIO DE CRISTO. É um tema sobremodo oportuno, no contexto aflitivo e conturbado do “cristianismo” inautêntico dos nossos dias, infelizmente pouco levado a sério. É exatamente a indiferença adotada para com o assunto e a consequente ignorância sobre a matéria, que anula o usufruto das ricas bênçãos do verdadeiro cristianismo. “Vós me chamais o Mestre e o Senhor, e dizeis bem; porque EU O SOU” (Jo 13:13).

CONCEITO BÍBLICO DO SENHORIO DE CRISTO

“Porque nenhum de nós vive para si mesmo, nem morre para si. Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. Quer, pois, vivamos ou morramos, somos do Senhor. Foi precisamente para esse fim que Cristo morreu e ressuscitou. Para ser Senhor, tanto de mortos como de vivos” (Rm 14:7-9).

Esse texto formula o correto conceito bíblico do Senhorio de Cristo. Aí Paulo nos instrui, com preciosos detalhes conceituais, sobre esse fundamental assunto da experiência cristã:

a) O Senhorio de Cristo é incompatível com o egocentrismo (7) – A tendência do comportamento humano é voltada para a plena satisfação do próprio “eu”, desde que nasce até que morre. Em tudo o que se envolve, nas múltiplas atuações da sua existência física, o ser humano só vê a si próprio. Na busca desesperada da sua exclusiva satisfação pessoal, age em atitude de total autossuficiência, como se fosse ele o centro, a razão e o alvo de tudo. Aliena, por isso, completamente, o Senhor de suas cogitações e ações. O verdadeiro cristão não pode assumir essa errônea atitude. O Senhorio de Cristo é incompatível com tal porte pessoal. Esse egocentrismo deve ser totalmente afastado do comportamento do cristão, para que possa ele usufruir os benefícios da vivência do Senhorio de Cristo. Cristãos que somos devemos ser Cristo-cêntricos. Saulo era egocêntrico, antes da conversão ao cristianismo. Convertido, Paulo entendeu o crasso erro que cometera e assumiu o Cristo-centrismo e, por isso, declarou: “…já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gl 2:20). “Para mim o viver é Cristo” (Fp 1:2).

b) O Senhorio de Cristo deve ser o alvo exclusivo da realidade existencial do homem (8a) – Na realidade existencial do homem impõe-se que ele reconheça, em caráter de exclusividade, a prioridade absoluta do Senhor, como centro, razão e alvo do seu próprio ser humano. Como diz Paulo, “se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos”. Ele é exclusivo e prioritário. Isso tem a ver, essencialmente, com a própria razão de nossa existência. Fomos criados por Deus, à sua imagem e semelhança para a realização do seu exclusivo e soberano propósito. Como diz Paulo: “Tudo foi criado por Ele e para Ele (Cl 1:16). Foi essa a atitude assumida por Davi, no seu viver e, por isso, foi o homem segundo o coração de Deus. Ele declara: “Digo ao meu Senhor: Tu és o meu Senhor; outro bem não possuo, senão somente a Ti… O Senhor é a porção da minha herança e do meu cálice; tu és o arrimo da minha sorte… Bendigo o Senhor, que me aconselha; pois até durante a noite o meu coração me ensina. O Senhor, tenho-o sempre à minha presença; estando ele à minha direita não serei abalado” (Sl 16:2, 5, 7 e 8). É, ainda, Paulo quem afirma: “No qual (Cristo) fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as cousas conforme o conselho da sua vontade, afim de sermos para louvor da sua glória…” (Ef 1:11-12).

c) O Senhorio de Cristo decorre do fato de que não somos de nós mesmos, mas do Senhor (8b) – A expressão “somos do Senhor” é cristalina ao afirmar o Senhorio de Cristo em termos categóricos e tem o sentido de “propriedade exclusiva”. Considero esse pensamento notável! Ele me transmite uma sensação incomparável de segurança! Como é bom saber que somos do Senhor! Jesus Cristo afirmou: “Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, eternamente, e ninguém as arrebatará das minhas mãos” (Jo 10:28). Sabemos que todo proprietário procura guardar bem, proteger com diligência e zelar com cuidado o que lhe pertence. Ninguém o faz melhor do que o Senhor a quem pertencemos. O Senhor Jesus pagou o preço para nos ter como Seus. Em I Coríntios 6:19-20 Paulo afirma: “Acaso não sabeis que o vosso corpo é o santuário do Espírito Santo, que está em vós, o qual tendes da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por preço…”. Pedro, em I Pedro 1:18-19, assevera: “sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo”. É inquestionável o direito do Senhor Jesus de ser o Senhor dos redimidos, porque pagou o preço da sua Redenção, tornando-os seus. Por isso, somos do Senhor.

d) O Senhorio de Cristo Lhe é assegurado pela eficácia da Obra da Redenção (9) – A Obra da Redenção foi o que de mais importante já se realizou na terra. Resultou na salvação eterna do pecador perdido, que nela crê, aceitando, incondicionalmente, contrito e penitente, o Senhor Jesus, como o seu Salvador pessoal. E a maioria dos que dão esse passo de fé satisfaz-se com o fato de serem salvos, não levando em conta a importância de serem “servos”. Alegram-se com a salvação, que lhes garante a eternidade, e festejam o Salvador, mas não percebem que só isso não esgota a finalidade da Obra Redentora, a qual, acima de tudo, tem por finalidade suprema fazer-nos servos, espiritualmente capacitados para “servirmos” a Deus, nos exercícios espirituais! O uso que, no texto, Paulo faz, do advérbio “precisamente”, acentua essa preciosa verdade: “Foi precisamente para esse fim que Cristo morreu e ressurgiu: para ser Senhor (não diz: “Salvador”). A finalidade final da obra da Redenção (morte e ressurreição de Cristo) não é, simplesmente, a “salvação”, mas o SENHORIO DE CRISTO, estabelecendo entre a nova criatura e Deus a abençoada e gloriosa relação de “Senhor” e “servo”. Deus não quer que apenas sejamos “salvos”, mas que sejamos “servos”! Claro está que para sermos “servos” temos que antes ser “salvos”! Mas é no serviço fiel que prestamos a Deus, como salvos pela Sua Graça, que realizamos o sublime alvo da Obra Redentora! E isso só pode acontecer quando aceitamos, em total e voluntária submissão, o SENHORIO DE CRISTO!

À luz dos aspectos conceituais bíblicos que expusemos, podemos compreender bem a solene declaração do Senhor aos seus discípulos, em João 13:13:

VÓS ME CHAMAIS O MESTRE E O SENHOR E DIZEIS BEM; PORQUE EU O SOU!

Jayro Gonçalves