No mais profundo de cada indivíduo existe um santuário particular onde habita a misteriosa essência do seu ser. Esta realidade interior é aquela parte do homem que é o que é sem referência a qualquer outra parte de sua complexa natureza. Trata-se do “eu sou” do homem, um dom do EU SOU que lhe deu a vida.
O EU SOU que é Deus auto existente e original; o “eu sou” que é o homem tem origem em Deus e depende a cada momento das ordens de seu Criador para continuar a existir. Um deles é o Criador exaltado sobre todos, o ancião de dias, habitando na luz inatingível. O outro é uma criatura e, embora privilegiada em relação a todas as demais, não passa mesmo assim de criatura dependente de generosidade divina e um pedinte diante do seu trono.
A entidade humana oculta de que falamos é chamada nas Escrituras de “espírito do homem” (I Cor 10:11) “Porque, qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito que nele está? Assim também as coisas de Deus ninguém as conhece senão o Espírito de Deus”. Da mesma maneira que o autoconhecimento de Deus se encontra no Espírito Eterno, o do homem se faz pelo seu próprio espírito, e seu conhecimento de Deus é obtido pela influência direta do Espírito divino sobre o humano.
A importância de tudo isto jamais pode ser superestimada, à media que refletimos, estudamos e oramos. Ela revela a espiritualidade essencial do ser humano, negando que o homem seja uma criatura dotada de espírito e declarando que ele é um espírito dotado de corpo. Aquilo que faz dele um ser humano não é o seu corpo mas seu espírito, impregnado da semelhança de Deus.
Uma das afirmativas que nos dão mais liberdade no Primeiro Testamento é esta: “Os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o Pai procura para seus adoradores. Deus é Espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade” (Jo 4:23-24). A natureza da adoração mostrada aqui sendo absolutamente espiritual. A verdadeira religião não fica presa a datas e jejuns, vestes e cerimônias, sendo colocada no lugar que lhe pertence – a união do espírito do homem com o Espírito de Deus.
Do ponto de vista humano a perda mais trágica sofrida na Queda foi a partida do Espírito de Deus deste santuário interior. No ponto mais oculto do ser humano existe uma sarça (um arbusto) preparada para ser a habitação do Deus Trino. Deus planejou repousar ali e brilhar, ardendo como uma chama moral e espiritual. O homem, por ter pecado, perdeu este privilégio magnífico e indescritível e deve habitar agora sozinho nesse lugar. Tão íntimo e oculto ele é, que ninguém pode chegar até ele, senão somente Cristo, e Ele só entrará mediante o convite da Fé. “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e cearei com ele e ele comigo” (Ap 3:20).
Mediante a operação misteriosa do Espírito por ocasião do novo nascimento, aquilo que Pedro chama de “natureza divina” penetra no mais íntimo do coração do crente e estabelece ali a sua morada. “E se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele”, pois, “o próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rm 8:9, 16). Tal indivíduo é um verdadeiro cristão, e somente uma pessoa assim. O batismo, a confirmação, receber os sacramentos – nada disso tem significado a não ser que o ato supremo de Deus também tenha lugar na regeneração. As exterioridades religiosas podem ser significado para a alma habitada por Deus; para quaisquer outros elas não só são inúteis como podem tornar-se até mesmo armadilhas que os façam cair num conceito de segurança falso e perigoso.
“Guarde o seu coração com toda a diligência” é mais que um ditado sábio, mas uma responsabilidade solene colocada sobre nós por Aquele que mais interessa pela nossa pessoa. Devemos dar toda atenção a essas palavras, a fim de não escorregarmos.
Aiden Wilson Tozer