Uma consideração dos versículos 31 a 38 de João 4, mostrando a importância de cada um de nós termos os olhos erguidos em nossos dias. Originalmente publicado nos primeiros números da revista “O Caminho”.
Desde o começo de Seu ministério aqui na terra, o Senhor Jesus Cristo nunca perdeu a oportunidade de ensinar Seus discípulos e de os preparar para o futuro. Aqui em João 4 achamos um lindo exemplo deste fato quando Cristo não somente falou com a mulher samaritana, mas usou aquela ocasião para ensinar aos discípulos a grande necessidade de ter os olhos erguidos. Queremos considerar os versículos 31 a 38 para entender o valor deste ensino para cada um de nós hoje.
Em primeiro lugar, temos de observar a preocupação dos discípulos com as necessidades materiais da sua vida. Foi esta preocupação que promoveu o ensino deste trecho. Quando voltaram da cidade, trazendo comida e lhe rogavam, dizendo: “Mestre, come”, o Senhor respondeu duma maneira surpreendente: “Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis”. Quando eles ainda podiam pensar somente em comida material, o Senhor explicou: “A Minha comida consiste em fazer a vontade d’Aquele que Me enviou e realizar a Sua obra”. Os discípulos precisavam de olhos erguidos para que pudessem pensar num nível mais alto do que as necessidades materiais.
Não é assim também conosco? Temos de confessar que geralmente ficamos muito ocupados com as necessidades materiais da nossa vida – a inflação assustadora, a instabilidade destes tempos, etc… Mas o fato é que a prosperidade material é evidente em todo lugar. Temos mais hoje do que 10 anos atrás? Mas esta prosperidade material não satisfaz a alma, não é comida espiritual. Visitando vários lugares recentemente aqui no Brasil e também no exterior, e encontrando com irmãos que não tínhamos visto por 5 anos ou mais, uma coisa ficou evidente: a prosperidade material é geral, mas… e a prosperidade espiritual? Também nós sentimos a mesma situação em nossos corações. Como precisamos todos de olhos erguidos neste sentido para que possamos nos preocupar mais com a Vontade e a Obra do Pai aqui na terra! A história de Israel mostra o perigo do materialismo. “Mas, engordando-se o meu amado, deu coices, engrossou-se, ficou nédio e abandonou a Deus que o fez, desprezou a Rocha da sua salvação” (Deuteronômio 32:15).
Em segundo lugar, podemos notar no verso 35 do capítulo 4 de João como os discípulos estavam pensando que ainda não tinha chegado a hora da ceifa. Eis aqui o pensamento: “Mais tarde nós vamos trabalhar”. Certos jovens dizem: “Depois de completar o estudo na faculdade eu vou me dedicar mais à obra de Deus e à Sua igreja”. Alguns mais velhos dizem: “Depois de me aposentar eu vou trabalhar para Cristo”. Outros dizem: “Gostaria de dar um ano de minha vida ao serviço de Cristo”.
Estas atitudes mostram uma grande falta de visão espiritual. Os discípulos não consideravam que Deus tinha um trabalho a ser realizado em Samaria naquele mesmo dia. Conforme os costumes deles, os judeus não se davam com os samaritanos e, por isso, maravilharam-se que Jesus estivesse falando com aquela mulher. Nesta ocasião, o Senhor não falou dos confins da terra; isto seria mais tarde, mas falou do lugar onde estavam naquele dia: “Erguei os vossos olhos e vede os campos, pois já branquejam para a ceifa”.
Amados irmãos, vamos olhar a necessidade perto de nós e não pensar: “Mais tarde”. Agora é a hora de servir ao Senhor com olhos erguidos, no lugar onde estamos.
Finalmente, queremos notar mais uma lição que o Senhor lhes ensinou naquele dia. “Um é o semeador e outro é o ceifeiro” (v 37). Cristo fez a comparação que a obra de Deus é uma obra de semear e de ceifar. Esta ideia é muito comum nas Escrituras, mas aqui há um fato importante: mesmo que a obra seja uma, as pessoas envolvidas nesta obra tem funções diferentes. Há semeadores e também há ceifeiros, e ambos vão ter uma recompensa e alegria eternas. Os discípulos iam ser ceifeiros porque Cristo semeou a boa semente em Samaria naquele dia. A ceifa começou naquele tempo (v 39), mas foi anos depois que veio uma ceifa maior. “Felipe, descendo à Samaria, anunciava-lhes a Cristo. As multidões atendiam, unânimes, às coisas que Felipe dizia, ouvindo-as e vendo os sinais que ele operava … e houve grande alegria naquela cidade” (Atos 8:5-8).
Esta lição traz grande consolação para os servos de Deus. Cada um de nós tem um trabalho a realizar; alguns são semeadores e outros são ceifeiros. Os dois são necessários e devem trabalhar em harmonia, reconhecendo que um não pode fazer a parte do outro. O semeador não está tão interessado em ver o resultado de seu trabalho hoje, mas sabe que a parte dele é plantar a Palavra nos corações. Ele sabe também que nem toda terra é boa, mas ele tem de semear em todas as terras porque somente Deus conhece os corações. Ele não sabe como a semente produz a vida eterna, mas também não fica preocupado com isso porque é Deus que dá o crescimento no tempo certo. Assim, quem ensina as crianças na Escola Dominical é semeador, também quem trabalha com literatura evangélica é semeador, quem prega no rádio, etc. Todos estes não vão saber o resultado do seu serviço aqui na terra, mas podem esperar até aquele dia onde tudo será manifestado em seu verdadeiro valor. Não será o resultado, mas a fidelidade que será recompensada naquele dia. O ceifeiro também é necessário. Este tem o dom de pregar e, no poder do Espírito Santo, almas vêm a Cristo arrependidas e creem n’Ele. Mas este nunca deve pensar que foi somente a pregação dele que fez a obra; provavelmente a semente tenha sido plantada naqueles corações durante anos, na Escola Dominical, em casa, etc.
Precisamos de olhos erguidos sobre estas verdades nestes dias. Há uma tendência de pensar que, se ninguém se converteu, a pregação foi em vão ou que o pregador deveria ter feito um apelo. Isso é uma grande falta de visão espiritual. O semeador que procurasse ceifar no mesmo dia em que semeou estaria fora de si! Nem mesmo uma criança faria isso. Nunca deveríamos imitar os métodos usados ao nosso redor, onde se diz que 20 ou 30 almas são convertidas cada domingo. O tempo mostrará que tal “fruto” na sua maior parte não passa de joio; é uma arte de homens, e não uma obra de Deus.
Que nós possamos erguer os nossos olhos para fazer a vontade de Deus, cada um naquela capacidade que recebeu do Senhor, para que naquele dia possamos receber d’Ele a recomendação: “Muito bom, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei: entra no gozo do teu Senhor” (Mateus 25:23). Amém.
Samuel Davidson