Eles Não São do Mundo

Fomos ensinados que, apesar de estarmos no mundo, não somos dele. É lamentável que o mundo tenha invadido os nossos direitos como cristãos, que a distinção ficou seriamente ofuscada. Nesta oração do nosso Senhor em João 17, ouvimos o Filho dizer ao Pai em duas ocasiões: “Eles não são do mundo”. Será que estas palavras do nosso amado Senhor não são um desafio para nós? Será que outras Escrituras não nos ensinam o mesmo?

“Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo” (1 Jo 2:15). A oração do nosso Senhor em João 17 nos dá um discernimento do que Deus realmente pensa de nós e por que Ele nos deixou neste mundo. É interessante notar que João fala mais nos seus escritos acerca do mundo do que qualquer outro escritor no Novo Testamento. A palavra que ele mais usa é “kosmos”, que significa o mundo habitável da humanidade. Qual é, então, nosso relacionamento e responsabilidade no que concerne a este ‘mundo’? Este capítulo define isso claramente para nós. Note as declarações que o Senhor faz:

1) ‘Do mundo’ (6 e 15). No verso 6 Ele fala dos que o Pai Lhe deu do mundo, inicialmente se referindo aos Seus discípulos, mas mais tarde incluindo todos os que receberiam e creriam na Sua Palavra. Que pensamento glorioso é este – fomos salvos e resgatados deste presente mundo mau e dados como um presente de amor ao Filho pelo Pai. Apesar de estarmos ainda neste mundo, não compartilhamos da sua condenação e sentença, conforme Romanos 8:1: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”. Efésios 2:3 nos conta que não somos mais filhos da ira, como os outros que não têm esperança.

Quão maravilhoso é saber que somos salvos e seguros na Mão do Pai e do Filho (Jo 10:27-30). A nossa salvação é completa e inteiramente garantida em Deus por meio do nosso Senhor Jesus Cristo. Agora, ainda que o verso 6 nos conta que nós já fomos retirados do mundo, não mais lhe pertencemos porque somos d’Ele. No verso 15 o nosso Senhor ora que nós não sejamos tirados do mundo, mas preservados nele. “Guarda-os do mal”, ou do maligno. Não é confortante saber que enquanto estamos aqui temos Pessoas divinas cuidando de nós? ‘Os olhos do Senhor repousam sobre os justos, e os Seus ouvidos estão abertos ao seu clamor’ (Sl 34:15).

2) ‘Não do mundo’ (14 e 16). Duas vezes ele pronuncia estas palavras ao Pai. Nos ouvidos dos Seus Ele está dizendo: “Eles não pertencem a este mundo”. Este presente mundo não é o nosso lar. Escrevendo aos Filipenses, Paulo diz::”A nossa conversa”, isto é, cidadania, que é o lugar a que pertencemos, “está nos céus” (Fp 3:20). Este mundo não é amigo de Deus ou dos filhos de Deus. João descreve-o na sua primeira epístola como permanecendo na maldade e no poder do maligno. Nunca devemos esquecer que este mundo está sob o controle do maligno. O Senhor falou dele como o príncipe deste mundo; Paulo, como o deus deste mundo. É um mundo cheio de engano e falsidade. “Muitos enganadores têm entrado no mundo”. João avisa de novo.

Quão cuidadosos devemos ser, constantemente vigiando contra as astúcias do diabo, que pode apresentar-se mesmo como um anjo de luz. É a Palavra de Deus que deveria ser o nosso guia e não as filosofias dos homens. Este mundo está em inimizade contra o nosso Deus. No verso 14 Ele conta ao Pai: “O mundo os odiou, porque eles não são do mundo, como também Eu não sou”. Se Lhe pertencemos, então não somos daqui. Somos simplesmente peregrinos em trânsito. O céu é o nosso lar e ali é a nossa herança. Pedro diz: “Para uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos céus para vós outros” (1 Pe 1:4). Se o nosso tesouro está ali, então o nosso coração deveria estar ali! A exortação de Paulo em Cl 3:1-2 soa a nota corretiva para nós ‘buscarmos as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à direita de Deus.

Pensemos nas coisas lá do alto, não nas que são aqui da terra’. Isso é o nosso problema hoje em dia. Estamos ocupados demais com as coisas ao redor de nós. Nós não pertencemos a este mundo. Vamos então viver assim como os que esperam o seu Senhor do céu.

3) ‘No mundo’ (11, 12 e 13). No verso 11 o Senhor está compartilhando com o Pai o fato de que Ele não vai mais estar no mundo, mas que os Seus iam ser deixados no mundo. Ele está antecipando aquele momento glorioso quando Ele voltaria ao céu, a Sua obra terminada, a Sua missão aqui completamente realizada. Conhecendo o caráter deste mundo, Ele roga a proteção e cuidado especiais do Pai para os que Ele está deixando. Note que Ele ora especialmente para a sua unidade: “para que sejam um, assim como nós”. Unidade é uma característica da divindade, e é o propósito de Deus que todos que são d’Ele deveriam ser marcados pela unidade, porque Ele nos fez um (Ef 2:13-16). Somos um corpo no Senhor. Notamos que Ele desenvolve isso ainda mais quando, mais tarde, Ele fala ao Seu Pai não somente do grupo de discípulos, mas da inteira companhia dos que creem n’Ele, “Que todos sejam um; e como és Tu, ò Pai, em Mim e eu em Ti, também sejam eles em Nós; para que o mundo creia que Tu Me enviaste”. Oh! Se pudéssemos somente apreciar quão importantíssima a nossa harmonia, a nossa unidade é para Deus, e quanto vai afetar o nosso testemunho no mundo (Ef 4:3). A obra do inimigo é dividir e causar dissensão entre o povo de Deus. Depois, no verso 12, Ele diz: “Quando Eu estava com eles no mundo, guardava-os no Teu Nome”. Eles pouco compreenderam quanto eles deviam a Ele não somente como o seu Mestre e Ensinador, mas como o seu Pastor, Protetor e Guia.

Mesmo agora no céu ‘Ele vive para fazer intercessão por nós’. Nós estamos no mundo, mas Ele não nos deixou órfãos, Ele nos deu o Seu Espírito Santo, um outro Consolador, para que o Pai, o Filho e o Espírito Santo estejam cuidando, protegendo e tomando providências por nós. Outra vez, no verso 13, Ele nos dá uma compreensão do Seu coração e mente concernente aos Seus, “Estas coisas falo no mundo para que eles tenham o Meu gozo completo em si mesmos”. Ele pronunciou esta linda oração junto deles, para que eles, e nós também, compartilhássemos o gozo que era d’Ele por causa deles e neles. Ele queria que eles soubessem quão preciosos eles eram para Ele e para o Pai. Não é de admirar que Ele ora: “Pai, a Minha vontade é que onde estou estejam também comigo os que Me deste, para que vejam a Minha glória” (24). Sim, amados, no mundo, mas não dele, e enquanto estamos aqui não somos esquecidos, e nunca desamparados, mas somos grandemente amados e constantemente cuidados de cima.

4) ‘Ao mundo’ (18). “Assim como Tu Me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo”. Que dignidade e honra foi conferida a nós. A intenção destas palavras é para impressionar-nos de que estamos aqui para cumprir um propósito divino, e cumprir uma tarefa divinamente designada. O que é tão admirável é que Ele compara a nossa missão com a Sua grande missão, “assim como… também Eu”. Assim como o nosso amado Senhor estava aqui para o Pai, nós estamos aqui para Ele também.

Que exemplo Ele deixou para nós! Em João 5:30, Ele diz: “Não procuro a Minha própria vontade, e, sim, a d’Aquele que Me enviou”. João 7:16 declara: “O Meu ensino não é Meu, e, sim, d’Aquele que Me enviou”, e João 8:29: “Aquele que Me enviou está comigo, não Me deixou só, porque Eu faço sempre o que Lhe agrada”. Esse é o exemplo e esse é o modelo que nós também devemos seguir. É a Sua vontade, as Suas palavras, as Suas obras que estamos aqui para cumprir. Que privilégio, mas que responsabilidade! Como é que podemos cumprir tal tarefa? Talvez as palavras do nosso Senhor em João 6:57 possam ajudar-nos, porque Ele diz: “Assim com o Pai, que vive, Me enviou, e igualmente Eu vivo pelo Pai, também quem de Mim alimenta, por Mim viverá”. Isso foi o segredo de Paulo: “Esse viver que agora tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a Si mesmo Se entregou por mim” (Gl 2:20). Nunca devemos esquecer que não pertencemos a este mundo, não somos ‘do mundo’; pertencemos a Ele porque somos ‘resgatados do mundo’. Estamos aqui no mundo somente porque Ele nos enviou para O representar, para cumprir a Sua comissão, para fazer discípulos de todas as nações, e por isso somos ‘enviados ao mundo’.

Peter Davies – Revista “PRECIOUS SEED” – Traduzido por Jaime Crawford.

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