À medida que a cristandade se considera cada vez mais “rica e abastada” (Ap 3:17) materialmente e almeja ser o Israel da antiguidade, muitos acabam perdendo o desejo de que o Senhor volte a qualquer momento. Isso acontece, ou por não terem ainda visto em suas próprias vidas a prosperidade que é prometida nos púlpitos baseadas em profecias que foram dirigidas aos judeus, ou por acharem que seriam os cristãos os arautos do “Evangelho do reino” (Mt 24:14) que será pregado em todo o mundo pelo remanescente que se converterá durante os tempos de tribulação, o que obviamente ainda não se concretizou.
A “Teologia do Pacto” e também a “Teologia do Domínio” dão aos cristãos a falsa ideia de que devem interferir de forma atuante no destino sócio-político deste mundo para conseguirem esses objetivos, como quis fazer Ló, colocando-se como juiz à porta de Sodoma. Na opinião deles o mundo deve ser cristianizado e preparado para Cristo vir reinar. Os papas da Idade Média tentaram fazer isso usando a força, como hoje fazem os radicais islâmicos na tentativa de conquistar o mundo para sua fé.
Obviamente cristãos que pensam assim não irão acreditar que exista um arrebatamento da Igreja antes da vinda de Cristo para estabelecer o seu Reino, como é ensinado em 1 Tessalonicenses 4:13-18. Outros, porém, apesar de esperarem pelo arrebatamento da Igreja, acreditam que uma série de eventos deva acontecer antes, e acabam colocando o arrebatamento na metade dos sete anos que precedem a vinda de Cristo, isto é, entre o “princípio das dores” (Mt 24:8; Mc 13:8) e a “grande tribulação” (Mt 24:21). Mas quando alguém espera que alguma coisa aconteça antes de Cristo vir buscar sua Igreja esse alguém não está esperando por Cristo.
Paulo, porém, há quase dois mil anos já se incluía entre os que esperavam pelo arrebatamento, ao escrever: “nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados” (1 Ts 4:17). Ele sabia que antes disso haveria apenas o declínio do testemunho cristão no mundo, o que já começava a acontecer em seu tempo como ele e os outros apóstolos descrevem em suas epístolas. Além disso viriam também os eventos descritos em 1 Tessalonicenses 4, porém todos eles incluídos “num momento, num abrir e fechar de olhos, ao ressoar da última trombeta” (1 Cor 15:52). Então, “o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro” (1 Ts 4:16).
Aqueles que não acreditam que o arrebatamento possa ocorrer a qualquer momento, mas esperam sofrer os tempos de tribulação em parte ou em sua totalidade, acabam não acreditando também que Deus irá livrar os seus (a Igreja) dessa tribulação. A promessa de Apocalipse diz: “Como guardaste a palavra da minha paciência, também eu te guardarei da hora da tentação [provação ou tribulação] que há de vir sobre todo o mundo, para tentar os que habitam na terra” (Ap 3:10). A esperança que é apropriada ao cristão é a de “esperar dos céus o seu Filho, a quem ressuscitou dentre os mortos, a saber, Jesus, que nos livra da ira futura” (1 Ts 1:10).
Curiosamente o primeiro a falar do arrebatamento foi um homem que seria arrebatado vivo desta terra, Enoque. Ele é citado na Epístola de Judas como tendo dito: “Eis que é vindo o Senhor com milhares de seus santos” (Jd 1:14). Ele fala da vinda de Cristo para reinar acompanhado de milhares de seus santos, todos os que estarão ressuscitados e transformados naquela ocasião e já habitando no céu. Observe que Judas menciona a citação de Enoque logo após falar dos falsos profetas que hoje dominam a cristandade, como os que pregam uma salvação por obras como Caim, profetizam em troca de riquezas, como Balaão, e declaram ser o que não são nos propósitos de Deus, como Coré.
Ao falar da tribulação que se abaterá sobre o mundo, e com a qual irá sofrer o remanescente de judeus que se converterá naquele tempo, Zacarias, à semelhança de Enoque, menciona que o Senhor nessa ocasião voltará trazendo consigo os seus santos, aqueles que terão sido levados para o céu no mínimo sete anos antes. “Fugireis pelo vale dos meus montes, porque o vale dos montes chegará até Azal; sim, fugireis como fugistes do terremoto nos dias de Uzias, rei de Judá; então, virá o SENHOR, meu Deus, e todos os santos, com ele” (Zc 14:5).
Quando alguém não quer acreditar em uma promessa da Palavra de Deus acaba também deixando de desfrutar das figuras que apontam para essa promessa. É o caso do episódio da destruição de Sodoma e Gomorra nos capítulos 18 e 19 de Gênesis. Ali vemos que Abraão, nesta passagem uma figura da Igreja e pai daqueles que são salvos pela fé, fica na companhia do Senhor enquanto dois anjos vão a Sodoma e Gomorra livrar do juízo Ló e sua família, figura do remanescente judeu que estará na terra corrompida durante a tribulação.
Enquanto os anjos se dirigem para lá, Abraão não só desfruta da companhia do Senhor como também aprende coisas que o Senhor só revela aos mais íntimos (Gn 18:17-19). Mais um detalhe: dá para ver que Abraão está com o Senhor em um lugar elevado mais elevado em relação a Ló (figura do céu), enquanto os anjos lidam com Ló e sua família na “planície”: “Na manhã seguinte, Abraão se levantou e voltou ao lugar onde tinha estado diante do Senhor, e olhou para Sodoma e Gomorra, para toda a planície e viu uma densa fumaça subindo da terra, como fumaça de uma fornalha” (Gn 19:27-28).
Não é demais crer que Apocalipse 4:1 também represente o arrebatamento, quando João é chamado para assistir do céu os eventos que irão acontecer na terra durante o tempo da tribulação. “Depois destas coisas, olhei, e eis que estava uma porta aberta no céu; e a primeira voz que, como de trombeta, ouvira falar comigo, disse: Sobe aqui, e mostrar-te-ei as coisas que depois destas devem acontecer” (Ap 4:1).
Mario Persona, Manjar Celestial