De Volta ao Começo

De vez em quando somos interrogados acerca das origens dos princípios das igrejas que se reúnem em simplicidade ao nome do Senhor Jesus. Alguns acham que é um movimento que começou no século XIX e, sem dúvida, esses princípios foram redescobertos naquele tempo. Mas a nossa convicção é que devemos voltar ao começo do cristianismo, quando os primeiros cristãos foram convertidos através da primeira pregação do Evangelho, “pelo Espírito Santo enviado do céu” (I Pe 1:12).

Isso aconteceu no Dia de Pentecostes, cinquenta dias após a ressurreição do Senhor Jesus. Em Atos 2, depois da pregação do apóstolo Pedro, lemos do resultado: “… de sorte que foram batizados os que de bom grado receberam a sua palavra; e naquele dia agregaram-se quase três mil almas, e perseveraram na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão e nas orações” (At 2:41-42). Aqui encontramos este aspecto da vida Cristã, em seu estado original e puro, contemplado a forma pela qual os primeiros cristãos seguiam a Cristo.

1. Aceitação da mensagem de Cristo – “De bom grado receberam a sua palavra”. Este é o primeiro passo, pois “a fé vem pelo ouvir” (Rm 10:17). Não é por ver um milagre ou ter uma visão que uma pessoa é salva. Quando foi sugerido: “… se alguém dentre os mortos for ter com eles, arrepender-se-iam”, a resposta foi: “se não ouvem… tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite” (Lc 16:30-31). Disse o Senhor: “Quem ouve a minha palavra, e crê n’Aquele que me enviou, tem a vida eterna…”. É somente pela palavra de Cristo que a vida cristã começa. Se não aceitarmos a Sua mensagem não seremos aceitos por Ele – e não adianta ser batizado ou ser recebido na Igreja, pois não há, ainda, a vida cristã.

Como a vida cristã começa, assim continua. O verdadeiro cristão é uma pessoa que sempre aceita a Palavra do Senhor, e está sempre pronto para receber a Sua instrução e aprender a Sua vontade. Assim, depois de tomar o primeiro passo de fé na palavra do Senhor, logo o novo cristão vai querer tomar o segundo.

2. Identificação com a missão de Cristo – “Foram batizados…”. O batismo é a maneira indicada pelo Senhor para a demonstrarmos ao mundo a nossa identificação com Cristo na Sua morte, sepultamento e ressurreição. Somente o batismo por imersão pode simbolizar estas coisas. Somos colocados debaixo da água para mostrar que já morremos e fomos sepultados com Cristo para o pecado, e saímos da água para mostrar nosso desejo de andar com Ele em novidade de vida (Rm 6).

Na sua pregação, Pedro tinha dito: “Cada um de vós seja batizado”. Agora vemos que os que receberam a palavra “foram batizados todos” (At 2:38, 41). Sabiam muito bem que no próximo dia provavelmente seriam perseguidos, perderiam seu emprego, seriam rejeitados por suas famílias e zombados pelos vizinhos – mas foram batizados todos naquele mesmo dia. Havendo tomado o primeiro passo de receber a palavra do Evangelho pela fé, logo tomaram o segundo passo de obediência ao Senhor. Identificaram-se com Ele na batalha contra o pecado; passaram a ver tudo do ponto de vista da cruz, e de ganhar a vitória pelo poder da Sua ressurreição.

3. Unidade com os membros de Cristo – “Naquele dia agregaram-se quase três mil almas”. Embora separado do mundo pelo batismo, e talvez rejeitado pela própria família, o novo crente não está sozinho, nem desamparado, mas o Senhor está com ele, com certeza. Além disso, agora ele pertence ao povo do Senhor: é membro do Corpo de Cristo pelo batismo no Espírito Santo. Agora ele não anda só, mas faz parte daquele ajuntamento que se chama Igreja. Com certeza, aquele que já faz parte do Corpo de Cristo vai querer fazer parte também de uma assembleia bíblica de crentes na localidade onde mora. Portanto, naquele dia três mil novos crentes, já batizados, foram recebidos na comunhão daquela primeira igreja em Jerusalém. É importante observar que entramos na igreja “que se estende a tudo e a todos”, que é o corpo de Cristo, “por meio da regeneração”, ao passo que entramos na Igreja de Deus (não se tratando de uma denominação com este nome), fazendo parte do testemunho naquela localidade, por meio da recepção.

Assim, vem a pergunta: “Se aqueles primeiros crentes foram salvos, batizados e recebidos todos no mesmo dia, por que é que hoje em dia costumamos ter um intervalo de dias, semanas ou até meses entre esses passos de obediência?”. Fazer tudo no mesmo dia seria realmente o ideal, porém, enquanto naqueles dias a perseguição espantava qualquer profissão de fé falsa, hoje em dia é frequentemente sábio tomar cuidado para não batizar pessoas que ainda não tomaram o primeiro passo de crer, evitando-se receber em comunhão pessoas que dariam mal testemunho. Aqui, então, temos os três primeiros passos da vida cristã.

Os últimos quatro passos dizem respeito à vida coletiva do testemunho local (Igreja). Queremos deixar claro, contudo, que a qualidade de vida coletiva da Igreja depende totalmente da intensidade da devoção de cada um que faz parte dela. Assim, todos estes quatro aspectos vêm ligados à palavra “perseveraram”, querendo dizer que todos eles “continuavam com firmeza e diligência” nestas coisas.

4. Instrução da parte dos mensageiros de Cristo – “Perseveraram na doutrina dos apóstolos”. A doutrina (ensino) dos apóstolos é fundamental para a formação do alicerce da Igreja. A doutrina dos apóstolos é Cristo – a Sua Pessoa; a Sua obra; a Sua vitória; a Sua mensagem; a Sua vontade; os Seus mandamentos. Apóstolos quer dizer “mensageiros enviados”, e indica os que receberam do Senhor Jesus uma autoridade especial. Hoje não temos apóstolos, mas temos os escritos deles no Novo Testamento, que contém a mensagem que o Senhor lhes confiou.

Desde o começo esses novos cristãos se dedicavam ao estudo da palavra do Senhor. Eles tinham fome da verdade; sentiam a necessidade de receber a instrução e orientação do Senhor Jesus para as suas vidas. Vamos voltar ao começo e ter o mesmo entusiasmo para aprender a doutrina dos apóstolos.

5. Comunhão com os mensageiros de Cristo – “Perseveravam… na comunhão”. Os eruditos dizem que também devemos ligar a palavra “comunhão” aqui com “dos apóstolos”. Assim, uma versão diz: “… na doutrina e comunhão dos apóstolos”. O que é esta comunhão dos apóstolos? O apóstolo João explica: “O que (nós, os apóstolos) vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também tenhais comunhão conosco; e a nossa comunhão é com o Pai, e com Seu Filho Jesus Cristo (I Jo 1:3).

Um outro sentido em que podemos ter comunhão com os apóstolos é na proclamação da mensagem deles pela pregação do Evangelho. Quando a mensagem for recebida, e houver conversões, compartilharemos da mesma alegria, e das mesmas provações que eles quando for rejeitada e houver perseguições.

O alvo do estudo da doutrina e da comunhão dos apóstolos é chegarmos juntos ao conhecimento de Deus e de Seu filho. Isso nos prepara para o próximo aspecto, que discorremos nesta sequência.

6. Recordação da motivação de Cristo – “Perseveraram… no partir do pão”. Na véspera da Sua morte o Senhor instituiu o partir do pão a fim de que seus discípulos não se esquecessem do Seu amor – de como deu Seu corpo por eles e derramou o Seu sangue para a remissão do pecados. “Perseverar” indica a celebração frequente do partir do pão. O padrão bíblico não é uma vez por ano, nem tampouco uma vez por mês, mas a cada primeiro dia da semana (At 20:7). Começavam cada semana recordando do amor do Salvador. No Seu sacrifício temos a manifestação do amor de Deus, e a contemplação deste perfeito amor gera amor sincero em nós, tanto para com Deus, como de uns para com os outros – “Andai em amor, como também Cristo vos amou, e se entregou por nós, em oferta e sacrifício a Deu, em cheiro suave” (Ef 5:2).

7. Dependência da misericórdia de Cristo – “Perseveravam nas orações”. Os primeiros cristãos davam muita importância à reunião de oração. Diz Paulo: “Admoesto-te, pois, antes de tudo, que se façam deprecações, orações, intercessões, e ações de graça, por todos os homens…” (I Tm 2:1). Para perseverarmos nos outros aspectos já mencionados dependemos da misericórdia do Senhor. O cristão precisa da misericórdia do Senhor para ser fiel (I Cor 7:25); para não desfalecer (II Cor 4:1); e para perseverar (At 26:22).

A misericórdia do Senhor está sempre ao nosso alcance (Sl 23:6), mas ele sempre que ouvir a voz da nossa súplica, e também as nossas ações de graças pelas misericórdias já recebidas. Deus nos convida tanto individualmente, como coletivamente a chegarmos “com confiança ao trono de graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno” (Hb 4:16).

Em suma, voltando ao início do cristianismo, descobrimos estes sete aspectos. Se nos consideramos bíblicos, vamos examinar as nossas vidas e a nossa prática diária para verificar se temos as características daqueles primeiros crentes, que davam tanta glória a Deus e que eram um canal de ricas bênçãos aos outros. Percebendo que temos estas características, vamos perseverar nelas com cada vez mais devoção e amor.

Terry Julian Blackman

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