Como Não Perder Sua Alma

Pois, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Mc 8.36).

O ditado do nosso Senhor Jesus Cristo, que está no início desta página, deve soar em nossos ouvidos como o sopro de uma trombeta. Ele trata de nossos mais elevados e melhores interesses. Ele trata de NOSSAS ALMAS.

Mas que pergunta solene contêm essas palavras da Escritura! Que soma poderosa de lucro e prejuízo elas nos apresentam para cálculo! Onde está o contador que poderia calculá-la? Onde está o aritmético inteligente que não poderia ficar perplexo com essa soma? – “Pois, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?“.

Eu desejo oferecer algumas simples observações, a fim de reforçar e ilustrar a pergunta que o Senhor Jesus faz na passagem diante de vocês. Eu chamo a atenção de todos os que estão lendo este volume. Que todos os que resolverem prestar atenção possam sentir mais profundamente – mais do que jamais sentiram – o valor de uma alma imortal! Descobrir o valor de nossas almas é o primeiro passo em direção ao paraíso.

A PRIMEIRA observação que devo fazer é esta: TODOS NÓS TEMOS UMA ALMA IMORTAL.

Não me envergonho de começar minha dissertação com estas palavras. Eu ouso dizer que elas parecem estranhas e tolas para alguns leitores. Eu ouso dizer que alguns dirão: “Quem não sabe essas coisas? Quem poderia duvidar de que temos almas?”. No entanto, não posso esquecer que o mundo está agora fixando sua atenção em coisas materiais em um nível ainda maior. Nós vivemos em uma era de progresso – uma era de motores à vapor e maquinários, de locomoções e invenções. Vivemos em uma era em que a multidão está crescentemente entusiasmada com as coisas terrenas – com ferrovias e docas, minas, comércio, bancos, compras, algodão, milho, ferro e ouro. Vivemos em uma era em que há um falso brilho nas coisas do tempo e uma grande névoa sobre as coisas da eternidade. Em uma era como essa, é dever dos ministros de Cristo voltar aos primeiros princípios. A necessidade se faz presente. Ai de nós se não fizermos esta pergunta do nosso Senhor acerca da alma! Ai de nós se não clamarmos: “O mundo não é tudo. A vida que agora vivemos na carne não é a única vida. Há uma vida por vir. Nós temos almas”.

Vamos estabelecer em nossas mentes, como um grande fato, que todos carregamos em nosso âmago algo que nunca irá morrer. Este nosso corpo, a que dedicamos nossos pensamentos e tempo para aquecê-lo, vesti-lo, alimentá-lo e deixá-lo confortável; este corpo apenas não representa todo o homem. Ele não é nada além do alojamento de um nobre inquilino, e esse inquilino é a alma imortal! A morte que cada um de nós irá ter um dia para morrer não é o fim do homem. Não está tudo acabado quando o último respiro se aproxima e a última visita do médico é paga; quando o caixão desce e as preparações para o funeral são feitas, quando a frase “as cinzas às cinzas e o pó ao pó” já foi dita sobre a sepultura, quando nosso lugar no mundo é preenchido, e o vazio causado por nossa ausência da sociedade não é mais percebido. Não: não está tudo acabado quando isso acontece! O espírito do homem ainda vive. Todos têm dentro de si uma alma que não more.

Eu não me detenho a fim de provar isto. Seria uma mera perda de tempo. Há uma consciência em todos os seres humanos que vale mais do que mil argumentos metafísicos. Há uma voz interior que fala muito alto às vezes, e que será ouvida; a voz que nos diz, quer gostemos ou não, que temos, cada um de nós, uma alma imortal. Por que, então, não podemos enxergar nossas almas? Não existem milhões de coisas as quais não podemos ver a olhos nus? Quem que já olhou por um telescópio ou microscópio que pode duvidar disso? Por que, então, não podemos ver nossas almas? Podemos senti-las. Quando estamos sozinhos, doentes na cama, e o mundo se fechou para nós, quando vemos um amigo no leito de morte, quando vemos aqueles que amamos descerem à sepultura: em situações como essas, quem não conhece os sentimentos que vêm à nossa mente? Quem não sabe que, em horas como essas, algo surge em nosso coração, dizendo-nos que há uma vida por vir, e que todos – do mais elevado ao menor – têm uma alma imortal?

Você pode andar por todo o mundo e tomar provas de todas as eras e tempos. Você nunca receberá nada além de uma única resposta sobre isso. Encontrará algumas nações enterradas em uma superstição degradante, e loucas por ídolos. Encontrará outras naufragadas em uma sombria ignorância, e totalmente não familiarizadas com o Deus verdadeiro. Mas você não encontrará uma nação ou povo que, em seu meio, não haja alguma consciência de que há uma vida por vir. Os templos desertos do Egito, da Grécia e de Roma, as ruínas druídicas de nossa própria terra natal, os esplêndidos templos pagãos do Subcontinente Indiano, a adoração supersticiosa da África, as cerimônias de funeral dos chefes da Nova Zelândia, as tendas de feiticeiros entre as tribos norte-americanas; todas, todas falam com a mesma voz e contam a mesma história. Dentro do coração humano, debaixo de todo o lixo amontoado pela Queda, há uma inscrição que nada pode apagar, dizendo-nos que este mundo não é tudo, e que todos nós temos uma alma imortal.

Eu não me detenho a fim de provar que os homens têm almas, porém eu peço a cada leitor deste texto que mantenha isto em sua mente. Pode ser que seu espaço esteja no meio de alguma cidade ocupada. Você vê à sua volta uma luta sem fim a respeito de coisas temporais. Correria, agitação e negócio vai cercando-o por todos os lados. Eu posso bem acreditar que você é tentado às vezes a pensar que esse mundo é tudo e que o corpo é tudo com o que você deve se importar. No entanto, resista à tentação e a lance para longe de você. Diga a si mesmo toda manhã, ao se levantar, e toda noite quando for deitar: “A moda desse mundo passa. A vida que hoje vivo não é tudo. Há algo além de negócios, dinheiro, prazer e comércio. Há uma vida por vir. Todos nós temos almas imortais”.

Eu não me detenho a fim de provar essa questão, mas eu peço que cada leitor perceba a dignidade e responsabilidade de se ter uma alma. Sim, perceba: em sua alma você tem o maior talento que Deus confiou a você. Saiba que em sua alma você tem uma pérola acima de qualquer valor que, comparada a todas as posses mundanas, torna-as como ninharia leves como o vento. O cavalo que vence o Derby ou o St. Leger chama a atenção de milhares: pintores registram-no e gravadores em metal gravam-no, e grandes somas em dinheiro tornam-se suas conquistas. Ainda assim, a criancinha mais fraca na família de um operário é muito mais importante para os olhos de Deus do que este cavalo. O espírito do animal desce, mas aquela criancinha tem uma alma imortal. As obras em nossas grandes exposições são visitadas por multidões admiradas: pessoas olham maravilhadas para elas e falam com entusiasmo sobre as “obras imortais” de Rubens, Ticiano e outros grandes mestres. No entanto, não há imortalidade alguma nessas coisas. A terra e todas as suas obras serão queimadas. O bebezinho que chora em um sótão e não sabe nada sobre arte durará mais do que todas essas obras, pois ele tem uma alma que não morrerá jamais. Haverá um tempo em que as pirâmides e o Parthenon irão desmoronar, quando o Castelo de Windsor e a Abadia de Westminster irão ser postos abaixo e desaparecerão, quando o sol parará de brilhar e a lua não mais fornecerá sua luz. Porém a alma do mais humilde trabalhador é feita de material muito mais duradouro. Ela irá sobreviver ao desmantelamento de um universo expirante, e viverá por toda a eternidade. Perceba, eu repito, a responsabilidade e a dignidade de possuir uma alma que nunca morrerá. Você pode ser pobre neste mundo; mas você tem uma alma. Você pode ser doente e fraco em seu corpo; mas você tem uma alma. Você pode não ser um rei ou uma rainha, ou um duque ou um conde; mas ainda assim você tem uma alma. É com a nossa alma que Deus se preocupa em especial. A alma é “o homem”.

“O valor do guinéu [1] está no ouro,E não no selo posto sobre ele”.

A alma que está dentro do homem é o que existe de mais importante nele.

Eu não me detenho a fim de provar que os homens têm almas, porém eu peço a todos os homens que vivam como se cressem nisso. Viva como se realmente cresse que nós não fomos enviados a este mundo simplesmente para girar algodão, cultivar milho e acumular ouro, mas, sim, para “glorificar a Deus e gozá-lo para sempre” [2]. Leia sua Bíblia e torne-se familiarizado com seu conteúdo. Busque ao Senhor em oração e derrame seu coração diante d’Ele. Vá a um lugar de adoração regularmente e ouça o Evangelho ser pregado. Guarde e santifique o dia do Senhor e entregue a Ele o Seu dia. E caso alguém lhe pergunte o motivo disso: quer seja esposa, filho ou colega, diga: “O que o define?” – responda-lhe com firmeza, como um homem, e diga: “Eu faço essas coisas porque eu tenho uma alma”.

A SEGUNDA observação que eu tenha a fazer é esta: QUALQUER UM PODE PERDER SUA PRÓPRIA ALMA.

Esta é uma parte pesarosa da minha fala. Porém é algo que eu não ouso e não posso ignorar. Não tenho compaixão alguma daqueles que professam nada além de paz e afastam dos homens o terrível fato de que eles podem perder suas almas. Eu sou um daqueles ministros à moda antiga que creem na Bíblia inteira, e tudo o que ela contém. Não consigo encontrar nenhum fundamento bíblico para tal teologia de fala suave, que agrada a tantos atualmente e segundo a qual todos irão para o paraíso ao final de tudo. Eu creio que há um diabo real. Eu creio que há um inferno real. Eu creio que não é caridade afastar dos homens a informação de que eles podem se perder. Caridade! Devo chamar dessa forma? Se você visse um homem bebendo veneno, você manteria sua paz? Caridade! Devo chamá-la assim? Se você visse um homem bêbado cambaleando em direção a um precipício, você não iria gritar “Pare”? Afaste-se com essas falsas ideias de caridade! Não assassinemos a graça bendita, usando seu nome com um falso sentido. É da mais alta caridade trazer a verdade santa diante dos homens. É a verdadeira caridade alertá-los completamente quando eles estão em perigo. É caridade marcá-los com o fato de que podem perder suas almas para sempre no inferno.

O homem tem em si uma maravilhosa força para o mal. Fracos como somos em tudo aquilo que é bom, temos uma força poderosa para fazermos mal a nós mesmos. Você não é capaz de salvar sua própria alma, meu irmão, lembre-se disso! Você não pode, por si só, fazer as pazes com Deus. Você não pode se livrar de um único pecado. Você não pode remover uma das anotações negras que ficam no livro de Deus contra você. Você não é capaz de mudar seu próprio coração. No entanto, há algo que você pode fazer: você pode perder sua própria alma.

Mas isso não é tudo. Não apenas podemos todos nós perder nossas próprias almas, como estamos todos em um risco iminente de perdê-las. Nascidos em pecado e mortos em transgressões, não temos olhos para enxergar a cova que boceja abaixo de nós, nem temos noção de nossa culpa e de nosso perigo. E, ainda assim, nossas almas estão em terrível perigo por todo esse tempo! Se qualquer pessoa fosse navegar para a América em um barco furado, sem bússola, sem água, sem provisões, quem não veria que haveria pouca chance de navegar pelo Atlântico em segurança? Se você estivesse para colocar o diamante Koh-i-noor [3] nas mãos de uma criancinha e o mandasse que o segurasse desde a Torre Hill até Bristol, quem não perceberia a probabilidade desse diamante não chegar a salvo ao fim dessa jornada? Ainda assim, essas são exemplos tolos do imenso perigo em que nós estamos por natureza de perdermos nossas almas.

Entretanto, alguns podem perguntar: “Como pode um homem perder sua alma?”. Há muitas respostas à essa pergunta. Assim como existem muitas doenças que assaltam e machucam o corpo, também existem muitos males que assaltam e danificam a alma. Contudo, não importa quão numerosas possam ser as maneiras em que um homem possa perder sua alma, essas podem classificadas sob três pontos principais. Deixe-me apontá-las rapidamente.

Você pode assassinar sua alma correndo para o pecado deslavado e servindo a prazeres e desejos. Adultério e fornicação, embriaguez e festas, blasfêmia e quebra do dia do Senhor, desonestidade e mentira, tudo isso são atalhos para a perdição. “Ninguém os engane com palavras tolas, pois é por causa dessas coisas que a ira de Deus vem sobre os que vivem na desobediência” (Efésios 6:6).

Você pode envenenar sua própria alma, assumindo uma falsa religião. Pode intoxicá-la com tradições inventadas por homens e cercar-se de cerimônias e observâncias que nunca vieram dos céus. Você pode niná-la com soníferos que entorpecem a consciência, mas que não curam o coração. Estricnina e arsênio farão seu trabalho quase tão bem quanto a pistola e a espada, embora com menos barulho. Não deixe nenhum homem enganá-lo. “Tome cuidado com os falsos profetas”. Quando homens entregam suas almas a líderes cegos, ambos caem na valeta. Uma falsa religião é quase tão arruinadora quanto religião nenhuma.

Você pode matar sua alma de fome com leviandades e indecisão. Você pode estar ocioso pela vida com um nome no seu registro de batismo, mas não estar inscrito no Livro da Vida do Cordeiro – com uma forma de religiosidade, mas sem poder. Você pode brincar ano após ano, não se interessando nem um pouco pelo que é bom e ficar contente com um sorriso forçado para as inconsistências de professores acadêmicos, gabando-se por não ser preconceituoso, um homem festeiro, ou um professor acadêmico; ficará “tudo bem” com sua alma ao final de tudo. “Ninguém os engane com palavras tolas”. A indecisão é simplesmente tão destruidora para a alma do que uma falsa religião ou religião nenhuma. O rio da vida nunca deve parar. Quer você esteja dormindo ou acordando, você está descendo rio abaixo. Você está ficando cada vez mais próximo da corredeira. Em breve você passará pelas cachoeiras e, se morrer sem uma fé decidida, naufragará por toda a eternidade.

Essas são as três formas principais pelas quais você pode perder sua alma. Será que alguém que está lendo este artigo sabe quais dessas três formas está escolhendo? Busque e veja se você está ou não perdendo sua alma.

Mas será que dá muito trabalho arruinar uma alma? Ah, não! É uma descida morro abaixo. Não há nada que suas mãos tenham que fazer. Não há necessidade de esforço. Você apenas deve sentar quieto e fazer o que os outros fazem no círculo no qual a providência de Deus o colocou – nadar com a maré, flutuar pelo rio abaixo, seguir a multidão – e pelo tempo da misericórdia, você terá passado para sempre! “Largo é o caminho que leva à perdição”.

Mas há muitos, você irá perguntar, que estão perdendo suas almas? Sim, de fato há! Não olhe para as inscrições e epitáfios em covas se você deseja encontrar a resposta verdadeira a esta pergunta. Como Dr. Watts diz, elas são:

“Ensinadas a exaltar e a mentir”.

Pensa-se que todos os homens foram respeitáveis e “boas pessoas” assim que morrem. Mas veja a Palavra de Deus e guarde bem o que ela diz. O Senhor Jesus Cristo declara “Entre pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela” (Mateus 7.13-14).

No entanto, quem é o responsável pela perda de nossas almas? Ninguém além de nós mesmos. Nosso sangue será posto em cima de nossas próprias cabeças. A culpa repousará em nossa própria porta. Nós não teremos nada a pleitear no último dia, quando estivermos diante do grande trono branco e os livros forem abertos. Quando o Rei entrar para ver Seus convidados, e disser: “Amigo, como você entra, não tendo roupa apropriada a um casamento?”. Nós ficaremos mudos. Não teremos nenhuma desculpa para implorar pela perda de nossas almas.

Mas para onde a alma vai quando se perde? Há apenas uma resposta importante a essa pergunta. Não há mais do que um lugar para onde ela pode ir, e esse lugar é o inferno. Não existe destruição total. A alma perdida vai para o lugar em que os vermes não morrem e o fogo não se consome; onde há escuridão e trevas, desgraça e desespero para sempre. Ela vai para o inferno, o único local para onde será recebida, uma vez que não será recebida pelo paraíso. “Que fruto colheram então das coisas das quais agora se envergonham? O fim delas é a morte!” (Romanos 6.21).

Deixe-me dizer que vários de nós ministros temos muitos medos acerca de muitos que professam e se chamam cristãos. Tememos para que não percam, no final de tudo, suas preciosas almas. Tememos que aquele grande impostor, Satanás, engane-os, tirando-os da salvação, e os deixe cativos à sua vontade. Tememos que acordem na eternidade e encontrem-se perdidos para sempre! Tememos, pois vemos tantos vivendo em hábitos pecaminosos, tantos estando em formas e cerimônias que Deus nunca exigiu, tantos vagando com toda a religião e, no entanto, tantos, em resumo, arruinando suas almas. Vemos todas essas coisas e temos medo.

É apenas por sentir que almas estão em perigo que escrevo esse texto e convido os homens a lê-lo. Se eu cresse que não houvesse inferno, não escreveria como eu o faço agora. Se eu cresse que, de qualquer forma, todos iriam para o céu, eu conseguiria ter paz e deixá-los em paz. Mas não ouso fazer isso. Eu vejo perigo à frente e eu alegremente alerto cada homem a fugir da ira vindoura. Eu vejo o risco de naufrágio e acenderia um farol e pediria que todos procurassem um porto seguro. Não rejeite minha exortação. Examine seu próprio coração: descubra se você está caminhando com destino à perdição ou à salvação. Procure e veja como algumas questões se colocam entre você e Deus: não cometa a enorme loucura de perder sua própria alma. Vivemos em uma era de grande tentação. O diabo está cercando e está ocupado. A noite está quase acabando. O tempo é curto. Não perca a sua alma.

III. Uma TERCEIRA observação que desejo fazer é esta: A PERDA DA ALMA DE QUALQUER HOMEM É A MAIS ALTA PERDA QUE ELE PODE SOFRER.

Eu me sinto incapaz de prolongar esse assunto como deveria. Nenhum homem pode mostrar a extensão da perda de uma alma. Ninguém é capaz de ilustrar essa perda com detalhes. Não: nunca entenderemos até que nós passemos pelo vale da sombra da morte e acordemos em outro mundo! Até lá, nunca saberemos o valor de uma alma imortal.

Devo dizer que nada é capaz de compensar a perda da alma nesta vida. Você pode ter todas as riquezas do mundo – todo o ouro da Austrália e da Califórnia, todas as honras que seu país pode lhe dar. Você pode ser dono de meio mundo. Você pode ser aquele a quem reis se satisfazem em honrar e a quem as nações olham com admiração. Mas por todo esse tempo, se você estiver perdendo sua alma, você é pobre aos olhos de Deus. As suas honras durarão apenas alguns anos. Suas riquezas serão deixadas ao final. “Nus viemos ao mundo e nus o deixaremos”. Você não terá um coração leve nem uma consciência alegre a menos que sua alma seja salva. De todo o seu dinheiro e suas terras você não levará nada com você quando morrer. Um pouco de terra será suficiente para cobrir seu corpo quando sua vida acabar. E então, se sua alma for perdida, você se encontrará pobre por toda a eternidade. Verdadeiramente não adianta nada ao homem ganhar o mundo todo se ele perder sua alma.

Eu posso dizer que quando uma alma é perdida não há nada que possa ser feito. Uma vez perdida, está perdida para todo o sempre. A perda de uma propriedade pode ser recuperada neste mundo. A perda de saúde e caráter nem sempre são sempre irreparáveis. Mas nenhum homem que deu seu último suspiro pode recuperar sua alma perdida. As Escrituras nos revelam que não há um purgatório abaixo da cova. As Escrituras nos ensinam que, uma vez perdidos, estamos perdidos para sempre. Verdadeiramente um homem descobrirá que não há nada que ele possa dar para tomar sua alma de volta e redimi-la.

Contudo, eu sinto profundamente que argumentos como esses estão muito aquém do nível desse assunto. A hora em que iremos descobrir de verdade quanto vale uma alma ainda não chegou. Devemos olhar muito além. Devemos imaginar de uma posição diferente da que ocupamos agora, antes que façamos uma estimativa correta do que estamos considerando. O cego não pode entender um cenário belo. O surdo não pode apreciar uma boa música. O homem não pode perceber completamente a maravilhosa importância de um mundo por vir.

Algum leitor deste artigo deseja ter uma leve ideia acerca do valor de uma alma? Então vá e mensure-o a partir da opinião de pessoas que estão morrendo. A solenidade da última cena remove os enfeites e o fingimento das coisas e faz os homens verem-nas como de fato são. O que os homens fariam, então, por suas almas? Tenho visto algo sobre isso, como um ministro Cristão. Raramente, muito raramente, encontrei pessoas descuidadas, despreocupadas e indiferentes quanto ao mundo que está por vir na hora da morte. O homem que sabe contar boas histórias e cantar boas músicas a fim de alegrar aqueles à sua volta, torna-se muito sombrio quando começa a sentir que a vida está deixando seu corpo. O vanglorioso infiel em tal momento geralmente lança fora sua infidelidade. Homens como Paine e Voltaire têm frequentemente mostrado que sua filosofia gloriosa se quebra quando a cova está à sua vista. Não me diga o que um homem pensa sobre a alma quando está em plena saúde; diga-me, ao invés disso, o que ele pensa quando o mundo está afundando abaixo dele, e a morte, o julgamento e a eternidade aproximam-se. As grandes realidades de nosso ser então pedirão atenção e deverão ser consideradas. O valor da alma à luz do tempo é uma coisa, mas visto à luz da eternidade, é outra muito diferente. Nunca um homem soube o valor da alma tão bem como quando está morrendo e não pode mais acompanhar o mundo.

Alguém deseja ter uma ideia mais clara acerca do valor da alma? Então vá e mensurem-no a partir das opiniões dos mortos. Leia no decimo sexto capítulo de São Lucas a parábola do homem rico e Lázaro. Quando o rico acordou no inferno e em tormentos, o que ele disse a Abraão? “Envie Lázaro à casa de meu pai: pois eu tenho cinco irmãos – que podem testemunhar a eles, a fim de que não venham também para este local de tormento”. Aquele rico homem provavelmente pensava pouco ou nada acerca da alma dos outros enquanto viveu sobre a terra. Uma vez morto e em lugar de tormento, ele vê as coisas como realmente são. Então ele pensa em seus irmãos e começa a se importar com sua salvação. Então clama: “Envie Lázaro à casa de meu pai. Tenho cinco irmãos. Deixe-o testemunhar a eles”. Essa parábola nos ensina o que os homens pensam quando acordam no outro mundo. Ela levanta um pouco do véu que está sobre o mundo que está por vir e nos dá uma pequena ideia do que os mortos pensam acerca do valor da alma.

Alguém deseja ter uma ideia clara sobre o valor de uma alma? Então vá e mensure-o a partir do preço que foi pago por ela há 1800 anos. Que preço enorme e incontável que foi pago! Nenhum ouro, nenhuma prata, nem diamantes jamais foram encontrados em número suficiente para prover redenção: nenhum anjo no céu foi capaz de trazer um resgate. Nada além do sangue de Cristo; nada além da morte do eterno Filho de Deus na cruz, foi suficiente para comprar a libertação da alma do inferno. Vá ao Calvário em espírito e considere o que aconteceu ali quando o Senhor Jesus morreu. Veja o abençoado Salvador sofrendo na cruz. Marque o que acontece ali quando Ele morre. Veja como houve trevas por três horas na face da terra. A terra treme. As pedras são arrancadas. As sepulturas são abertas. Ouça as suas últimas palavras. “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?”. Então veja toda a maravilhosa transação que pode lhe dar uma ideia do valor da alma. Nessa cena terrível nós testemunhamos o pagamento do único preço que havia de suficiente para redimir a alma dos homens.

Todos nós iremos compreender o valor da alma se não o compreendermos agora. Que Deus garanta que ninguém que leia este artigo o compreenda tarde demais. Um manicômio é uma visão lamentável. Retorce o coração ver naquele prédio triste um homem que outrora teve uma grande fortuna, mas que foi desperdiçada e que o trouxe a uma insanidade irremediável proveniente da bebida. Um naufrágio é uma visão lamentável. É melancólico ver um corajoso navio, que outrora “andava sobre as águas como algo muito comum”, encalhado em uma costa rochosa, com uma tripulação naufragada e uma carga pela praia. Mas de todas as visões que podem afetar os olhos e entristecer o coração, não conheço nenhuma tão lamentável quanto a visão de um homem arruinando sua própria alma. Não é surpresa que Jesus chorou quando se aproximou de Jerusalém pela última vez. Está escrito que “quando se aproximou e viu a cidade, Jesus chorou sobre ela” (Lucas 19:41). Ele conhecia o valor das almas, se os Escribas e os Fariseus não conheciam. Podemos aprender a partir das lágrimas dele – se não podemos aprender a partir de mais nada – o valor da alma de um homem e a quantidade de perda que ele enfrentará se esta alma for lançada fora.

Eu ordeno que todo leitor deste artigo, no tempo que se chama hoje, abra seus olhos para o valor de sua alma. Perceba o quão terrível é perder uma alma. Esforce-se para saber a real preciosidade desse poderoso tesouro confiado a você. O valor de todas as coisas mudará bastante um dia. A hora chegará em que cédulas de um banco não valerão mais do que papel usado, e ouro e diamantes serão como a poeira das ruas, quando o palácio dos nobres e a casa de campo do camponês irão igualmente cair ao chão, quando ações e fundos irão todos tornarem-se invendáveis e a graça, a fé e a boa esperança não serão mais subestimadas e desprezadas. Nessa hora, você descobrirá, de um jeito que nunca descobriu antes, o valor da alma imortal. A perda da alma será então vista como a maior de todas as perdas e a conquista da alma será a maior das conquistas. Busque saber o valor da alma agora. Não seja como a Rainha Egípcia que, em uma ostentação estúpida, tomou uma pérola de grande valor, dissolveu-a no ácido e então a bebeu. Não perca, como ela, a “pérola de grande poder” que Deus confiou a você. Uma vez perdida, nenhuma perda pode se comparar à perda da alma.

A QUARTA e última observação que tenho a fazer é esta: A ALMA DE QUALQUER HOMEM PODE SER SALVA.

Eu abençoo a Deus que o Evangelho de Cristo permite-me proclamar estas boas novas e proclamá-las livremente e incondicionalmente a todos os que leem essas páginas. Eu bendigo a Deus, pois após todas as importantes coisas que tenho dito, posso concluir com uma mensagem de paz. Não poderia suportar a terrível responsabilidade de dizer aos homens que todos têm uma alma – que todo mundo pode perder sua alma – que a perda da alma é uma perda que nada pode superar – se não pudesse também proclamar que a alma de qualquer homem pode ser salva.

Eu penso que seja possível que esta proclamação possa soar assustadora a alguns leitores. Lembro-me do tempo em que soou assustadora para mim. Mas estou convencido de que não é nem mais nem menos do que a voz do Evangelho eterno, e não tenho vergonha de torná-lo conhecido a todos os que têm um ouvido para escutar. Eu digo com convicção que há salvação no Evangelho para o maior dos pecadores. Eu digo confiantemente que qualquer um e todos podem ter suas almas salvas. Sei que todos nós somos pecadores por natureza – caídos, culpados, corruptos, cobertos de pecado. Eu sei que Deus, a quem teremos que prestar contas, é Santo de olhos puros para contemplar a iniquidade, e alguém que não pode ignorar o que é mau. Sei também que o mundo em que nosso terreno está é um mundo difícil para a religião. É um mundo cheio de cuidados e problemas, de descrença e impureza, de oposição e ódio a Deus. É um mundo em que a religião é como um estranho – um mundo que tem uma atmosfera que faz a religião definhar. Porém, apesar de tudo isso, duro como esse mundo é, santo como Deus é, pecadores como somos por natureza, digo que qualquer um e todos podem ser salvos. Qualquer homem e qualquer mulher pode ser salvo da culpa, do poder e das consequências do pecado, e ser encontrado à mão direita de Deus em glória infinita.

Eu imagino ouvir algum leitor exclamar: “Como pode ser?”. Não é nenhuma surpresa você fazer essa pergunta. Este é o grande nó que filósofos gentios nunca puderam desatar. Este é o problema que todos os sábios da Grécia e de Roma nunca solucionaram. Esta é a questão que nada pode responder além do Evangelho do Senhor Jesus Cristo. Esta resposta da Evangelho eu, agora, desejo colocar diante de você.

Eu proclamo, então, com toda a confiança, que a alma de qualquer pessoa pode ser salva, (1) porque Cristo um dia morreu. Jesus Cristo, o Filho de Deus, morreu em uma cruz para fazer a expiação dos pecados dos homens. “Pois também Cristo sofreu pelos pecados uma vez por todas, o justo pelos injustos, para conduzir-nos a Deus” (1 Pedro 3.18). Cristo suportou nossos pecados em Seu próprio corpo no madeiro e recebeu o curso que todos nós merecíamos e que caiu em Sua cabeça. Cristo, por meio de Sua morte, satisfez à santa lei de Deus que nós desobedecemos. Aquela morte não foi uma morte comum; não foi apenas um mero exemplo de autonegação; não foi meramente a morte de um mártir, assim como foram as mortes de Ridley, Latimer e Cranmer [4]. A morte de Cristo foi um sacrifício e uma propiciação pelo pecado do mundo todo. Foi a morte vicária de um substituto Todo Poderoso, Garantia e Representante dos filhos de homem. Ela pagou nosso enorme débito para com Deus. Abriu as portas do céu para todos os crentes. Forneceu uma fonte para todo pecado e contaminação. Permitiu a Deus ser justo e, ainda assim, ser o justificador dos ímpios. Conquistou a reconciliação com Ele. Ela obteve paz perfeita com Deus para todo aquele que vem até Ele por meio de Jesus. As portas da prisão se abriram quando Jesus morreu. A liberdade foi proclamada a todos os que sentem a servidão do pecado e desejam ser libertos.

Eu me pergunto: a quem todo esse sofrimento era devido, o qual Jesus resistiu no Calvário? Por que o santo Filho de Deus foi tratado como um malfeitor, considerado um transgressor, e condenado a uma morte tão cruel? Em nome de quem aquelas mãos e aqueles pés foram pregados na cruz? Em favor de quem foi o Seu lado perfurado com a lança? Por quem que aquele sangue precioso foi vertido? Por que motivo tudo isso foi feito? Foi feito por você! Foi feito pelos pecadores, pelos ímpios! Foi feito voluntariamente e sem restrições – não por compulsão – por causa do amor pelos pecadores e a fim de fazer a expiação dos pecados. Certamente, então, visto que Cristo morreu pelos ímpios, eu tenho o direito de proclamar que qualquer um pode ser salvo.

Além disso, eu proclamo com toda a confiança que qualquer um pode ser salvo, (2) porque Cristo ainda vive. O mesmo Jesus que um dia morreu pelos pecadores ainda vive à direita de Deus, para continuar o trabalho da salvação para o qual Ele desceu do céu para realizar. Ele vive para receber todos os que vierem até Deus por meio dele, e para dar-lhes poder para se tornarem filhos de Deus. Ele vive para ouvir a confissão de toda consciência pesada e garantir, como um Sumo-Sacerdote todo poderoso, perfeita absolvição. Ele vive para derramar o Espírito de adoção em todo aquele que acredita n’Ele e para permitir que eles exclamem “Abba, Pai”. Ele vive para ser o único Mediador entre Deus e o homem, o Intercessor incansável, o bom Pastor, o Irmão mais velho, o Advogado predominante, o Sacerdote infalível e Amigo de todos os que vêm até Deus por meio d’Ele. Ele vive para ser a sabedoria, justiça, santificação e redenção a todo o Seu povo – para mantê-los vivos, apoiá-los na morte e trazê-los, finalmente, para a glória eterna.

Por quem, eu imagino, Jesus está assentado à direita de Deus? Pelos filhos dos homens. Exaltado no céu e cercado por uma glória indescritível, Ele ainda se importa com aquele trabalho poderoso que assumiu quando nasceu na manjedoura de Belém. Ele não está levemente alterado. Ele está sempre com a mesma mente. Ele é o mesmo homem que andou pela costa do mar da Galileia. Ele é o mesmo homem que perdoou Saulo, o Fariseu, e o enviou a fim de pregar a fé que um dia destruiu. Ele é o mesmo homem que recebeu Maria Madalena, chamou Mateus, o publicano, trouxe Zaqueu para debaixo da árvore e fez deles exemplos do que Sua graça poderia fazer. E ele não mudou. Ele é o mesmo ontem, hoje e para sempre. Certamente eu tenho o direito de dizer que qualquer um pode ser salvo, visto que Jesus vive.

Mais uma vez eu proclamo, com toda a confiança, que qualquer um pode ser salvo, (3) porque as promessas do Evangelho de Cristo são completas, livres e incondicionais. “Venham a Mim”, diz o Salvador, “todos aqueles que estão cansados e sobrecarregados e eu lhes darei descanso” – “Quem crê no Filho tem a vida eterna; já quem rejeita o Filho não verá a vida, mas a ira de Deus permanece sobre ele” – “Quem vier a Mim eu jamais rejeitarei” – “Todo o que olhar para o Filho e nele crer terá a vida eterna” – “Se alguém tem sede, venha até Mim e beba” – “Quem quiser beba de graça a água da vida” (Mateus 11:28; João 3:15, 18, 6:37, 40, 47, 7:37; Apocalipse 22:17).

Para quem, eu imagino, foram ditas essas palavras? Elas foram destinadas apenas para os Judeus? Não: também para os gentios! Elas foram destinadas apenas para pessoas de antigamente? Não: para pessoas de toda época! Elas foram destinadas apenas para a Palestina e a Síria? Não: para o mundo todo, para todo nome, nação, povo e língua! Elas foram destinadas apenas aos ricos? Não: tanto para os pobres como para os ricos! Elas foram destinadas apenas aos muito morais e corretos? Não: foram destinadas a todos, para o maior dos pecadores, para o mais repugnante dos criminosos, para todos os que o receberem! Certamente quando eu trago à mente essas promessas, tenho o direito de dizer que todo e cada homem pode ser salvo. Qualquer um que ler estas palavras, e não for salvo, não poderá culpar o Evangelho. Se você está perdido, não é porque você não poderia ser salvo. Se você está perdido, não é porque não havia perdão para os pecadores, nenhum Mediador, nenhum Sumo-Sacerdote, nenhuma fonte aberta para o pecado e para a imoralidade, nenhuma porta aberta. É porque você escolheu trilhar seu próprio caminho, porque você queria se apegar a seus pecados, porque não quis vir a Cristo para que, n’Ele, pudesse ter vida.

Eu não escondo o meu objetivo em lançar este volume. O desejo do meu coração e minha oração a Deus por você é que sua alma possa ser salva. Este é o grande objetivo pelo qual todo ministro fiel é ordenado. Este é o fim pelo qual pregamos, falamos e escrevemos. Queremos que almas possam ser salvas. Eles não sabem o que dizem, aqueles que nos acusam com motivos mundanos, e nos dizem que apenas desejamos avançar na nossa ordem e promover o ofício de ser um ministro. Nós não sabemos nada sobre estes sentimentos. Que Deus possa perdoar aqueles que nos acusam de tais coisas! Nós trabalhamos por objetivos grandiosos. Desejamos que almas sejam salvas! Amamos a Igreja da Inglaterra: sentimos grande afeição pelo seu Livro de Oração Comum, seus 39 Artigos, suas Homilias, suas Formas de Culto a Deus. Mas existe algo que sentimos ainda mais: desejamos que almas sejam salvas. Queremos arrancar algumas pessoas do fogo. Desejamos ser instrumentos honrados nas mãos de Deus ao levar algumas almas ao conhecimento de Jesus Cristo, nosso Senhor.

E agora concluo este artigo com três palavras de atenção amorosas, que eu de coração oro a Deus que abençoe muitas almas. Eu não sei em que mãos estás páginas irão cair. Eu reverencio a aventura. Eu posso apenas orar a Deus para que Ele possa atingir algumas consciências, e que muitos que leiam este volume possam dizer “O que eu posso fazer para ser salvo?”.

(1) Minhas primeiras palavras devem ser alerta carinhoso. Essas palavras de alerta são curtas e simples. Não negligencie sua alma.

Eu acho muito provável que este volume caia nas mãos de alguns que frequentemente são tentados com ansiedade sobre as coisas dessa vida. Você é “cuidadoso e preocupado com muitas coisas”. Você parece viver em uma constante confusão de negócios, correria e problemas. Você vê a sua volta milhares de pessoas que não se preocupam com nada além do que irão comer e beber, e com o que irão vestir. Frequentemente você é tentado a pensar que é inútil tentar ter alguma religião. Eu lhe digo, no nome de Deus, resista à tentação. Ela vem do diabo. Eu lhe digo, nunca esqueça a única coisa que é necessária! Nunca esqueça sua alma imortal!

Você talvez me diga que vivemos tempos difíceis. Eles podem ser difíceis, mas é meu dever lembrá-lo que o tempo é curto e que ele, em breve, será trocado pela eternidade. Talvez você me diga que você deve viver, mas é meu dever lembrá-lo que você também deverá morrer e estar pronto para encontrar seu Deus. O que devemos pensar de um homem que em tempos de penúria alimentou seu cão e matou o filho de fome? Não devemos dizer que ele foi um pai cruel e anormal? Bem, tome cuidado para que você não faça algo parecido. Não se esqueça de sua alma em sua ansiedade pelo seu corpo. Em sua preocupação com a vida de agora, não se esqueça daquela que está por vir. Não negligencie sua alma!

Não importa o que você possa ter sido no passado, eu imploro que viva o tempo que está por vir como alguém que sente que tem uma alma imortal! Guarde este livro, com a ajuda de Deus, com uma determinação santa a “parar de fazer o mal e aprender a fazer o bem”. Não tenha vergonha, de agora em diante, de se importar com os interesses de sua alma. Não tenha vergonha de ler sua Bíblia, de orar, de guardar e santificar o dia do Senhor, e de ouvir o Evangelho ser pregado. Do pecado e da impiedade você pode se envergonhar. Você nunca precisa se envergonhar de se importar com sua alma. Deixe que os outros riam se quiserem: um dia eles não rirão de você. Seja paciente. Suporte isso em silêncio. Diga-lhes que você se decidiu e que não planeja mudar. Diga-lhes que você aprendeu uma coisa, se não outras, que é que você tem uma alma preciosa. E diga-lhes que você decidiu que, venha o que vier, não mais irá negligenciar esta alma.

(2) Minha segunda palavra de atenção é um convite amoroso a todos que desejam que suas almas sejam salvas. Eu convido todos os leitores desse texto que sentem o valor de sua alma, e que deseja a salvação, a vir até Cristo sem demora, e ser salvo. Eu o convido a vir a Cristo pela fé e a comprometer sua alma a Ele, a fim de que possa ser liberto da culpa, do poder e das consequências do pecado.

Minha língua não é capaz de dizer, e minha mente é fraca demais para explicar a completa extensão do amor de Deus aos pecadores, e da vontade de Cristo de receber e salvar almas. Você não está em apuros em Cristo, mas em si mesmo. Você erra muito se dúvida na prontidão de Cristo em salvar. Eu sei que não há obstáculos entre essa sua alma e a vida eterna, exceto sua própria vontade. “Há alegria na presença dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende” (Lucas 15.10). Você deve ter ouvido algo sobre as maravilhas dos coros em concertos no Palácio de Cristal [5]. Mas o que é todo esse estouro de harmonia no coro “Aleluia” de Handel comparado à explosão de alegria que é ouvida no céu quando uma alma passa das trevas para a luz? O que é isso além de um mero sussurro, comparado à “alegria dos anjos” por um pecador ensinado a ver a insanidade do pecado e a buscar a Cristo? Ah, venha e junte-se a essa alegria sem demora!

Se você ama a vida, eu o peço que segure-se em Cristo de uma vez, a fim de que sua alma possa ser salva. Por que não fazer isso agora? Por que não juntar-se hoje ao Senhor Jesus em uma aliança eterna que não pode ser quebrada? Por que não decidir, antes da aurora de amanhã, dar as costas para o serviço do pecado e voltar-se para Cristo? Por que não ir até Cristo nesse dia e lançar sua alma Nele, com todos os pecados dela e sua descrença, com todas as suas dúvidas e medos? Você é pobre? Busque tesouros no céu e seja rico. Você é velho? Corra, corra para estar pronto para seu fim e prepara-se para encontrar-se com Deus. Você é jovem? Comece bem e busque em Cristo um amigo infalível, que nunca irá abandoná-lo. Você está em apuros, preocupado com esta vida? Busque Aquele que é o único que pode ajudá-lo e carregar seu fardo: busque Aquele que nunca o desapontará. Quando outros viram as costas para você, então Cristo Jesus irá assumi-lo. Você é um pecador, um grande pecador, um pecador da pior espécie? Tudo isso nunca mais será lembrado se você simplesmente vier até Cristo: o Seu sangue irá lavar todo o pecado. Embora seus pecados sejam como escarlate, eles serão brancos como a neve.

Vá, então, e clame ao Senhor Jesus Cristo. Pense no valor de sua alma e pense no único caminho para a salvação. Clame ao Senhor em uma oração sincera. Faça como o ladrão arrependido fez: derrame seu coração diante Dele: clame: “Senhor, lembre-se de mim, até mesmo de mim”. Diga-O que você veio até Ele pois ouviu que Ele “recebe pecadores” e porque você é um pecador e deseja ser salvo. Diga-O toda a história de seu passado. Diga-O, se desejar, que você tem sido um descrente, um libertino, um descumpridor do dia do Senhor, um ímpio, inconsequente e um homem de mau comportamento. Ele não o rejeitará. Ele não o lançará fora. Não irá virar Suas costas para você. Ele nunca quebra o caniço rachado ou apaga o pavio fumegante. Nenhum homem jamais veio até Ele e foi lançado fora. Ah, venha a Cristo e sua alma será liberta!

(3) Minha última palavra de atenção será uma afetuosa exortação a cada leitor desse texto que descobriu o valor de sua alma e creu em Jesus Cristo. Esta exortação será curta e simples. Eu rogo que você se apegue ao Senhor com todo o seu coração e que prossiga para o alvo a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial.

Posso imaginar como descobrirá que seu caminho é bastante estreito. Há poucos com você e muitos contra você. O seu terreno na vida pode soar duro e sua posição pode ser difícil. Porém, ainda assim, agarre-se ao Senhor e Ele nunca o abandonará. Agarre-se ao Senhor no meio da perseguição. Agarre-se ao Senhor, ainda que homens riam e zombem de você, e tentem o envergonhar. Agarre-se ao Senhor, ainda que a cruz seja pesada e a luta, difícil. Ele não teve vergonha de você sobre a Cruz do Calvário; então não tenha vergonha Dele sobre a terra, para que Ele não se envergonhe de você diante de Seu Pai que está no céu. Agarre-se ao Senhor e Ele nunca o abandonará. Neste mundo, há muitos desapontamentos: em propriedades, famílias, casas, terras e situações. Mas nenhum homem jamais foi desapontado por Cristo. Nenhum homem jamais falhou e não pôde encontrar em Cristo tudo o que a Bíblia diz que Ele é, e mil vezes melhor do que jamais ouviu antes.

Olhe adiante, olhe de cima e até o fim! As melhores coisas ainda estão por vir. O tempo é curto. O fim está se aproximando. Os últimos dias do planeta estão diante de nós. Lute o bom combate. Trabalhe. Esforce-se. Persista. Ore. Leia. Batalhe duro pela prosperidade de sua própria alma. Trabalhe duro pela prosperidade da alma de outros. Esforce-se para trazer mais alguns com você ao paraíso, e faça de tudo para salvar alguns. Faça algo, com a ajuda de Deus, para tornar o céu mais cheio e para deixar o inferno mais vazio. Fale para aquele jovem ao seu lado e para aquela idosa que vive perto de sua casa. Fale para aquele vizinho que nunca vai a um lugar de adoração. Fale para aquele parente que nunca lê a Bíblia a sós e que zomba de uma religião séria. Peça-lhes que pensem em suas almas. Implore a todos eles que vão e ouçam algo aos domingos, que será para seu próprio bem para a vida eterna. Tente persuadi-los a viver, não como animais que perecem, mas como homens que desejam ser salvos. Grande é sua recompensa no céu se tentar fazer o bem a almas. Grande é a recompensa de todos que confessarem a Cristo diante dos filhos dos homens. As honras deste mundo logo se acabarão para sempre. As recompensas que nossa graciosa Rainha concede são apenas apreciadas por alguns curtos anos. A “Cruz Vitória” não mais será usada por aqueles bravos soldados que ganharam-na tão corajosamente e que a mereceram tanto. O lugar que hoje os conhece em breve não mais os conhecerá: mais alguns anos e eles estarão reunidos com seus pais. No entanto, a coroa eu Cristo concede nunca desaparece. Busque esta coroa, meu caro leitor. Batalhe por esta coroa. Ela irá corrigir tudo aquilo por que você deve passar nesse mundo turbulento. As recompensas dos soldados de Cristo são para sempre. Seu lar é eterno. Sua glória nunca chega ao fim.

John Charles Ryle – Sermão pregado em Liverpool e publicado como capitulo no livro “Os Velhos Caminhos”, com o nome original de “Nossas Almas!”. Fonte: Evangelical Tracts | Projeto Ryle – Anunciando a Verdade Evangélica.

Notas:

[1] Moeda inglesa antiga (Nota da Tradutora). [2] Primeira resposta do catecismo menor de Westminster (Nota do Revisor). [3] O O Koh-í-noor é um dos diamantes mais famosos do mundo. Em 1850, quando a Grã-Bretanha anexou a Índia ao Império, e a Rainha Vitória foi declarada Imperatriz da Índia, ela recebeu o Koh-í-noor das mãos de Lorde Dalhousie; e desde 1937 ornamenta uma coroa especialmente feita para a rainha mãe, para o dia da coroação do seu esposo, o rei Jorge VI. [4] Mártires protestantes que foram queimados no reinado da católica Maria I no século XVI. [5] Palácio de Cristal foi uma enorme construção em ferro fundido e vidro erguido no Hyde Park, em Londres, para albergar a Grande Exposição de 1851. Spurgeon pregou nessa local em 1857 para quase 24.000 pessoas, foi sua maior audiência em um único local.