Chamado Para Missões

O livro de Atos tem sido chamado, com razão, de “Manual Missionário da Igreja”. Há duas coisas que devem ser lembradas ao estudarmos esse quinto livro do Novo Testamento. Primeiro, aqui estão os princípios bíblicos e espirituais para seguirmos em nosso trabalho missionário. Em segundo lugar, embora esses princípios não mudem, os métodos estratégicos de execução desses princípios variam. Antes de estudar Missões no livro de Atos, há algumas características desse livro que merecem nossa atenção.

(a) Havia total dependência de Deus, o Espírito Santo, de modo que esse livro é frequentemente chamado de “Os Atos do Espírito Santo”.

(b) Houve um desenvolvimento simples e natural da obra, pois a obra de Deus é frequentemente descrita como um crescimento.

(c) Após o evangelismo, houve uma ênfase no estabelecimento de igrejas locais para que os crentes pudessem se reunir para adoração, comunhão e instrução.

(d) Não havia uma organização, diretoria ou conselhos que exercessem autoridade sobre as igrejas locais.

(e) Há pouca menção sobre o apoio financeiro dos obreiros e nenhum registro do número de convertidos (exceto em números redondos em dois casos – 2:41, 4:4).

Neste estudo, consideraremos o Chamado para Missões. Todos nós conhecemos a Grande Comissão dada por Cristo a Seus discípulos. Sua importância pode ser avaliada pelo fato de que ela é encontrada em palavras diferentes em cada um dos quatro Evangelhos e no primeiro capítulo de Atos. Suas palavras finais, Sua bênção de despedida antes de ascender, continham isso: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e ser-me-eis testemunhas, tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria, e até os confins da terra.”

Naquela época, como de fato em toda a história da Igreja, parece ter havido hesitação em cumprir essa última frase. Foi somente quando houve perseguição em Jerusalém que eles foram mais longe (8:1, 11:19). Então, alguns “viajaram até …. Antioquia” e isso levou ao estabelecimento de uma igreja em Antioquia, que se tornou a base para a expansão missionária. Sem dúvida, Deus tinha um propósito ao usar Antioquia como base, em vez de Jerusalém. Essa igreja era composta em grande parte por crentes gentios e a escolha de Antioquia dissiparia qualquer ideia de que Jerusalém era a igreja “mãe” ou principal com autoridade sobre as outras.

Vamos estudar esse chamado sob três aspectos:

(a) O chamado do Espírito Santo;

(b) O consentimento da igreja local;

(c) A consagração dos missionários.

Em relação ao chamado do Espírito Santo, observamos que foi Sua prerrogativa chamar e foi por Seu poder que os obreiros foram enviados. Embora existam muitos dons ou habilidades diferentes concedidos aos membros do corpo de Cristo, ao distribuir esses dons, o Espírito Santo é soberano. Ele divide a cada homem “como quer” (I Cor. 12:11). Os crentes devem desejar sinceramente os melhores dons, mas a designação desses dons cabe ao Espírito Santo. Foi o Espírito que disse: “Separai-me Barnabé e Saulo”. Eles não estavam simplesmente seguindo suas próprias inclinações, nem foram movidos pelo apelo emocional de algum outro obreiro. Não foi a igreja, nem os anciãos e mestres daquela igreja que os chamaram, mas o Espírito Santo. Não nos é dito exatamente como o Espírito falou com eles. Eles ouviram uma voz? Ou tiveram uma visão? Ou foi simplesmente uma convicção interior em seus corações a respeito da vontade do Espírito? Os detalhes não são revelados para que não pensemos que teria de ser dessa maneira específica. O Espírito de Deus tem diferentes maneiras de tornar Sua vontade conhecida. Também é importante observar as palavras do versículo 4: “E eles, sendo enviados pelo Espírito Santo, partiram…” Assim como o Espírito de Deus os havia chamado, Ele também os enviou em sua missão. Eles não foram enviados por nenhuma organização, nem mesmo pela igreja em Antioquia. Uma palavra diferente é usada no final do versículo três para indicar a ação da igreja ao deixá-los partir. Nesse caso, a Bíblia Tagalog tem uma tradução melhor do que a versão inglesa King James.

A igreja em Antioquia, que assim deu seu consentimento, era, em muitos aspectos, uma igreja modelo. Eles haviam sido bem ensinados por Barnabé e Saulo (11:26) e tinham uma variedade de professores (13:1). Era uma igreja ativa, pois ministrava ou servia ao Senhor. O jejum deles indicava a preocupação e o exercício de seu coração, de modo que reconheceram prontamente o chamado do Espírito. Nós nos perguntamos se eles estavam jejuando porque estavam preocupados com as necessidades daqueles que não tinham ouvido o evangelho! Quando ouviram o chamado do Espírito, jejuaram e oraram, pois não era fácil abrir mão de seus melhores homens. Por algum tempo, eles haviam sido edificados pelo ministério de ensino de Barnabé e Saulo. A saída deles significaria mais responsabilidade para os que ficaram em Antioquia. No entanto, mesmo enquanto oravam, dificilmente poderiam ter se dado conta da importância dessa ação na história da Igreja, nem do alcance que seu resultado teria. Quando impuseram as mãos sobre Barnabé e Saulo, não foi no sentido de conferir a eles qualquer capacidade ou autoridade. Esses dois já haviam demonstrado sua capacidade e autoridade como professores em Antioquia. A imposição de mãos foi um ato de identificação. Assim como o israelita de antigamente se identificava com o sacrifício animal, a igreja em Antioquia, por meio de seus líderes, indicava que os missionários estavam indo em seu nome para realizar uma tarefa que era comum a todos. Assim, eles os recomendaram à graça de Deus pela obra do Senhor (14:26). Vale a pena notar que isso foi feito totalmente à parte dos apóstolos e da igreja em Jerusalém.

Agora vamos observar brevemente a consagração dos missionários. Isso não foi algo oficial por parte da igreja, mas sim a dedicação pessoal desses obreiros. Esses homens obedeceram prontamente ao chamado do Espírito e se dedicaram completamente ao trabalho para o qual haviam sido chamados. Eram homens que já haviam provado sua capacidade e, portanto, demonstraram estar aptos e prontos para o chamado para uma esfera mais ampla de serviço ao Senhor. Sem dúvida, não foi fácil para eles abandonar o trabalho que estavam fazendo em Antioquia nem deixar a feliz comunhão com os irmãos. No entanto, a autoridade do Espírito Santo era suprema, o chamado de Deus era inequivocamente claro, então eles partiram. Como Abraão no passado – “Pela fé, Abraão, quando foi chamado… obedeceu; e saiu, sem saber para onde ia”.

Como é importante ter certeza do chamado de Deus quando se parte para a obra missionária. Barnabé e Saulo levaram um companheiro com eles, o jovem João Marcos. Não demorou muito para que esse jovem voltasse para casa. Foram apresentadas várias razões para esse fato. Será que foi porque ele não estava fortalecido pela convicção de que havia sido chamado por Deus? Um irmão dos estados do sul encontrou um obreiro de cujo chamado ele tinha algumas dúvidas. Finalmente, um dia, exasperado, ele disse: “Brudder, você foi enviado ou simplesmente foi?” Barnabé e Saulo foram chamados pelo Espírito, mas parece que Marcos “simplesmente foi”.

Cyril H Brooks – “Escritos dos Irmãos de Plymouth”