Nenhum verdadeiro cristão negaria o fato de ter que lutar constantemente contra o inimigo de nossas almas, que “tenazmente nos assedia” na tentativa de levá-lo a pecar contra Deus (Mt 4.1-11).
Como podemos nós enfrentar e vencer a tentação? Creio que não podemos encontrar uma resposta melhor do que a que nos é dada no exemplo prático do nosso Salvador, que é relatado por Mateus no trecho acima enunciado. Abordá-lo-emos sob os seguintes tópicos: 1. O tentador. 2. A tentação. 3. O Caminho da vitória.
1. O TENTADOR
Notemos, em primeiro lugar, os seus nomes, os quais todos descrevem o caráter maligno da sua pessoa e das suas obras. No versículo 1 ele é chamado “o diabo”, palavra que significa “acusador”, ou “caluniador”. Seu grande intento é caluniar Deus perante o homem (Gn 3.1-7) e acusar ou caluniar o homem perante Deus (Jó 1.9-11; 2.4-5). Ele é o acusador dos filhos de Deus (Ap 12.10). Ele quer ver os homens em constante inimizade contra Deus.
No versículo 3 ele é apresentado como “o tentador”, palavra que indica o seu constante propósito e esforço para induzir os crentes ao pecado. Empregando toda a sua astúcia e sutileza ele procura convencê-los das vantagens ou da legitimidade da prática de atos pecaminosos. E ele não dá tréguas, pelo contrário, trabalha incessantemente!
No versículo 10 o Senhor chama-o de “Satanás”, palavra que significa “adversário”. Ele é o grande adversário de Deus e dos homens. Movido por um ódio implacável contra Deus e contra todo o bem, Satanás encontra-se em permanente conflito com o Senhor, procurando por todos os meios frustrar os planos Divinos. Como “o sedutor de todo o mundo”(Ap 12.9), ele age entre os homens procurando impedi-los de receber pela fé a graça Divina, levando-os assim à ruína. Ele combate violentamente o povo de Deus, “como leão que ruge procurando alguém para devorar” (1 Pe 5.8). Ele ataca os servos de Deus tentando inutilizar o seu trabalho (2 Cor 12.7; 1 Ts 2.18).
A Bíblia apresenta Satanás por outros nomes. Destes, quero destacar alguns. Em 2 Cor 11.3, Ap 12.9 e 20.2 ele é chamado de serpente, expressão que indica a sua malícia, astúcia e falsidade. Ele é também chamado “o deus deste século” (2 Cor 4.4), “o príncipe da potestade do ar” (Ef 2.2), “o príncipe deste mundo” (Jo 12.31; 14.30) e, finalmente, “o maligno” (Mt 13.19; Ef 6.16; 1 Jo 2.13-14, etc.). Esta última palavra resume tudo quanto Satanás é e faz. Ele é a personificação do mal em todas as suas formas e procura disseminar o mal onde quer que lhe seja possível.
Notemos, em segundo lugar, o seu poder. A Bíblia fala-nos sobre a nossa luta “contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes”(Ef 6.12). Isto indica que as hostes do mal funcionam sob uma grande e poderosa organização. Aprendemos de Efésios 2.2 que Satanás é “o príncipe”, portanto, o líder dessas hostes. Como já foi mencionado, Satanás é chamado “o Príncipe deste mundo”, e isso parece indicar a sua influência sobre os governos do mundo, sobre os quais ele exerce absoluto controle: “o mundo inteiro jaz no maligno” (1 Jo 5.19).
Ele age muito no campo religioso, onde tem os seus ministros (2 Cor 11.14-15), seus ensinos (1 Tm 4.1), sua sinagoga (Ap 2.9) e seus sacrifícios (1 Cor 10.20). Isto indica que ele é o autor e inspirador de toda perversão religiosa. Hoje mais do que nunca estamos rodeados de seitas e religiões que, mesmo com a Bíblia nas mãos, estão propagando doutrinas diabólicas. E como as multidões são fascinadas por essas doutrinas!
Sim, Satanás é realmente poderoso, e comanda forças poderosíssimas, atingindo através delas todo o mundo e todas as esferas de atividade no mundo. Porém graças a Deus, ele não é todo-poderoso, pois este é um dos atributos exclusivos de Deus.
Notemos, em terceiro lugar, a sua astúcia. Ele arma ciladas contra nós (Ef 6.11;1 Tm 3.7). Para enganar o povo de Deus ele emprega a mesma astúcia que empregou quando enganou a Eva (Gn 3.1-5 c/ 2 Cor 11.3), mentindo (Jo 8.44), falsificando (2 Cor 11.11-15) e assim seduzindo e levando após si quantos puder (1 Tm 5.15; 2 Tm 2.26). Ele não deixa passar uma só oportunidade de induzir-nos ao pecado, mas está sempre atento para tentar-nos em cada setor da nossa vida onde lhe permitirmos chegar (1 Cor 7.5; 1 Ts 3.5), pois está sempre empenhado em alcançar vantagem sobre nós (2 Cor 2.11). É por isso que somos exortados: “Não deis lugar ao diabo” (Ef 4.27). Convém estarmos sempre atentos, pois quanto mais fiéis formos ao Senhor, e quanto mais úteis formos à Sua Causa, tanto mais o tentador estará nos perseguindo e procurando impedir-nos de continuar. Ele não poupou ao nosso Senhor e jamais nos poupará também.Notemos, finalmente, a sua atuação incessante. Ele não dorme, não tem “descanso semanal” e nem “férias”. A Bíblia nos ensina que ele trabalha de dia e de noite (Ap 12.10).
Portanto, o tentador é perigosíssimo, pois ele exerce a sua influência maligna no mundo em todo tempo e em todas as esferas de atividade sobre a terra.
Além disto ele é sagaz e traiçoeiro, tem grande habilidade estratégica (2 Cor 2.11), de modo que não convém facilitar com ele. Não é para chegarmos ao extremo de algumas seitas que não proferem duas palavras sem proferir o nome de Satanás ou mencionar os demônios, mas também não é para chegarmos ao outro extremo, igualmente perigoso, de ignorar totalmente a sua existência e o seu perigo.
Este adversário é perigoso sobretudo porque atua no mundo espiritual, invisível, e não temos condições para defender-nos dele com recursos naturais. Entretanto, Deus nos fornece armas sobrenaturais para essa luta. Ele nos oferece a Sua armadura, da qual lemos em Efésios 6.10-20, um equipamento espiritual completo. Revestidos dessa armadura somos fortalecidos “no Senhor e na força do Seu poder” e alcançamos capacidade para ficar firmes contra as astutas ciladas do diabo.
Conhecer o tentador e saber das suas artimanhas e, em contrapartida, conhecer os recursos de Deus e recorrer aos mesmos é a melhor maneira de vencer a tentação.
Querido irmão, ou irmã que me lê: será que você está assustado diante de tentações fortíssimas pelas quais esteja passando? Será que o inimigo, aproveitando-se disso, tem tentado levá-lo até a duvidar da sua conversão, como muitas vezes acontece?
Gostaria de dizer-lhe que a tentação, em si, não é pecado. Pecamos quando acolhemos as sugestões do adversário e cedemos ao pecado. Nossa velha natureza nos persegue, apesar de sermos convertidos e salvos e a prova disso é que trava-se dentro de nós uma ferrenha luta entre a carne e o Espírito, cada um querendo prevalecer. Leia Gálatas 5.16-22. Essa luta íntima é mencionada ali, antecipada pelo conselho: “Andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne”. Embora Deus permita que sejamos tentados, Ele nos dá os recursos e o poder para vencer a tentação. A Bíblia diz: “Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel, e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar” (1 Cor 10.13).
Estejamos, pois, vigilantes, precavidos contra o perigoso tentador. Deus nos dará a vitória.
2. A TENTAÇÃO
Esta palavra tem um lado positivo e um negativo. Positivamente ela significa “testar”, “pôr à prova” para o bem. Deus “pôs Abraão à prova” (Gn 22.1), e até hoje Ele prova o Seu povo, sendo tais provações para o benefício dos Seus filhos (Tg 1.2-4, 12; 1 Pe 1.6, 4.12-13). Negativamente significa “testar” ou “pôr à prova”, porém, com má intenção (como no caso dos inimigos do Senhor quando queriam apanhá-Lo em erro Mt 16.1), ou desejando induzir ao mal. Essa era a intenção de Satanás contra nosso Salvador no trecho que estamos estudando.
Notemos, inicialmente, a realidade da tentação de Cristo. Durante o período da tentação Satanás tinha diante de si um verdadeiro homem, não um espírito, anjo ou coisa semelhante. Isto deve trazer-nos grande conforto. Nosso Sumo Sacerdote é alguém que já provou a tentação e pode, em razão disto, ter simpatia para conosco e socorrer-nos quando somos tentados (Hb 2.17-18; 4.15).
Notemos, em segundo lugar, o caráter ilusório da tentação. Ela apresenta-se muitas vezes sob as formas mais sutis. Satanás sabe dar toda aparência de legitimidade aos seus argumentos. Assim ele agiu no Éden, assim agiu com nosso Salvador, e assim age conosco. Cuidado, pois, quando quiser justificar a legitimidade de certos atos, decisões ou situações em que esteja envolvido. Verifique bem se não se trata de uma armadilha de Satanás para estragar a sua carreira cristã. Examinemos as três tentações às quais foi nosso Senhor submetido:
a) Ao desafiá-Lo a transformar pedras em pães o inimigo não O tentou a um crime vergonhoso. Que mal havia naquilo? Afinal Ele tinha necessidade de pão, e podia transformar pedras em pães. Não seria natural e justo que o fizesse? Contudo, isto seria nada mais do que aquiescer a um pedido diabólico, procurando, sem a aprovação do Pai, um meio mais fácil para prover as Suas necessidades.
É assim, também, de modo sutil e sorrateiro, que o tentador nos ataca. Quantas vezes ele sussurra aos nossos ouvidos: “Você precisa e tem todo direito de ganhar mais. Você é crente, mas também é chefe de família. É sua a responsabilidade de sustentar e educar seus filhos, bem como de proporcionar conforto à sua família. É verdade que a sua consciência cristã protesta, achando que a atividade que lhe estão propondo não é lá muito digna de um crente, mas proporciona-lhe muito maior salário com muito menos esforço. Por que cansar-se tanto para ganhar tão pouco, quando pode, sem tanta dificuldade, ganhar o dobro? Além disso, você estaria conservando o seu corpo para melhor servir a Deus e ainda poderia fazer contribuições muito mais generosas para os cofres da igreja!”.
E quantos estão caindo nessa!… Não percebem que o lucro material que auferem e que lhes traz muita prosperidade material está-lhes privando da comunhão com Deus e do serviço cristão. Lembremo-nos sempre de que mesmo o trabalho cem por cento legítimo e honesto pode trazer sérios prejuízos à nossa vida espiritual se nos deixarmos absorver por ele de tal modo que não tenhamos mais tempo para pensar em outra coisa. Cuidado, irmão, com a preocupação excessiva com o conforto material.
b) Ao desafiar o Senhor a atirar-se do pináculo do templo, o tentador sugeriu-lhe um meio mais fácil de atrair a atenção pública. E, querendo provar a legitimidade da sugestão, citou as Escrituras. Que mal havia naquilo? Afinal Ele desejava comunicar a todos a Sua mensagem, e se as próprias Escrituras apresentavam-Lhe a promessa de apoio e proteção divinas, não seria uma excelente oportunidade de, através de um ato tão espetacular, provar a veracidade das Escrituras, e assim atrair a atenção, granjear a simpatia e confiança da multidão e transmitir-lhe o seu ensino? Mas isso seria presumir do poder de Deus, tentando-O a operar um milagre desnecessário e fora dos Seus planos. Seria, portanto, um desvio do programa de Deus.
Essa tentação é-nos apresentada nas mais variadas formas. Satanás sugere que nos relacionemos com a roda dos escarnecedores, que adotemos a linguagem deles, pois “a Bíblia diz” que devemos proceder como os judeus, para ganhar os judeus, como fracos, para ganhar os fracos e assim por diante. E quantos, por aceitarem esta sugestão, acabam seguindo o curso deste mundo, ficando inapelavelmente comprometidos!
Ele nos sugere que trabalhemos além das nossas possibilidades físicas, pois “a Bíblia diz” que devemos apresentar os nossos corpos por sacrifício a Deus. E quantas vezes deixamo-nos levar e ficamos impossibilitados de servir por causa de alguma enfermidade que contraímos como resultado do nosso descuido. Ou, atacando pelo lado oposto, ele sugere que não devemos esforçar-nos demasiadamente no serviço do Senhor, pois “a Bíblia diz” que Deus quer misericórdia e, não, sacrifício. E podíamos ir além, mostrando como o diabo, pela má aplicação das Escrituras, pode tentar-nos a presumir do poder de Deus.
c) Ao propor ao Senhor que O adorasse, Satanás sugeriu-Lhe um meio mais fácil para o estabelecimento do Seu reino. Por que enfrentar as perseguições, o sofrimento, a cruz, quando podia evitar tudo isso e, facilmente, conseguir o Seu objetivo? Porém, antecipar a recepção daquilo que Lhe fora prometido por Deus (Sl 2.8) para recebê-lo das mãos de Satanás seria um ato de deslealdade ao Pai e de descrença na realização dos Seus propósitos.
Facilidade foi a nota tônica das três tentações: um meio mais fácil para conseguir pão, pondo em dúvida a bondade de Deus como Provedor. Um meio mais fácil de estender o ministério, abusando das promessas divinas. Um meio mais fácil de conquistar o Reino, fugindo às responsabilidades entregues por Deus. Cuidado, irmão, com as “facilidades” do tentador! O caminho da vontade de Deus é reto. Não entre nos atalhos do inimigo!
Notemos, finalmente, o objetivo da tentação. O tentador quis levar Cristo a agir por conta própria, sem consultar a vontade de Deus. Assim, desviando-Se do caminho da fé e da obediência, seria frustrada a Sua missão como Messias e como Redentor.
E, quanto a nós, ele quer induzir-nos a pecar contra Deus, afastar-nos da comunhão com Ele, inutilizar a nossa vida espiritual, impedindo-nos de viver uma vida obediente e agradável ao Pai.
Por tudo quanto temos considerado, devemos exercer uma severa vigilância, pois precisamos da sabedoria de Deus para podermos discernir as ciladas que nos são armadas pelo nosso inimigo, e do poder de Deus para desviar-nos delas.
O que Satanás mais deseja é que vivamos derrotados, impedidos de gozar a plenitude da alegria da nossa fé. Mas não precisamos proporcionar-lhe essa satisfação. Graças ao Senhor temos recursos para enfrentar as tentações. Ninguém está isento de ser tentado e o mínimo descuido pode ser-nos fatal, mas venceremos se atentarmos para as advertências da Palavra: “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar” (1 Pe 5.8). Ainda: “Não deis lugar ao diabo” (Ef 4.27). E mais: “Resisti ao diabo e ele fugirá de vós” (Tg 4.7).
Permita Deus que cada irmão ou irmã que lê estas linhas seja estimulado a permanecer em comunhão com o Senhor e, guiado pelo Seu Espírito, possa desviar-se dos ardis do tentador e encontrar a vitória em toda a sua carreira cristã.
3. O CAMINHO DA VITÓRIA
Nosso Salvador venceu o adversário e nos deu o exemplo de como nós também podemos vencê-lo. Ele não usou os Seus recursos divinos para alcançar a vitória, mas, como Ser verdadeiramente humano, utilizou os mesmos recursos que nós devemos usar contra o tentador. Leiamos, uma vez mais, Mateus 4.1-11.
a) Ele venceu porque foi guiado pelo Espírito (1). O Espírito sempre nos guia à submissão e obediência à vontade de Deus. Por isso é que a Palavra nos exorta a nos enchermos do Espírito (Ef 5.18). Esse foi o segredo da vitória do Senhor. Lucas nos conta, ao relatar este mesmo fato, que o Senhor estava “cheio do Espírito”.
b) Ele usou a Palavra de Deus. Ela é “a espada do Espírito”(Ef 6.17b). Só podemos vencer a Satanás quando fazemos uso da Palavra no poder do Espírito Santo. Com que prontidão nosso Senhor pôde responder: “Está escrito”! Isto prova que Ele era familiarizado com a Palavra e que Sua vida era orientada por ela. Nisto vemos a importância da leitura atenta e frequente da Bíblia, bem como da meditação nela. O homem cujo prazer está na lei do Senhor, e nela medita dia e noite, é bem-aventurado(Sl 1.2). Por quê? Porque a Palavra do Senhor guardada em seu coração dá-lhe a vitória sobre o pecado (Sl 119.11). Deus nos deu a Sua Palavra e o Seu Espírito como os meios disponíveis para vencermos as tentações.
Precisamos, portanto, encher nossas mentes e corações com a Palavra do Senhor. Deixar que ela nos fale, apontando-nos a vontade de Deus. O crente que não encontra tempo para ler a sua Bíblia certamente sucumbirá aos ataques do tentador, mas aquele que dá o primeiro lugar em sua vida à Palavra do Senhor, certamente vencerá. Quando o tentador chegar, o Espírito não lhe dará uma “inspiração” momentânea se você não se importa com a Palavra de Deus. Mas se você é alguém que está sempre procurando conhecer a vontade do Senhor nas Escrituras Ele lhe fará lembrar o que for necessário (Jo 14.26) para combater o inimigo, e assim, respondendo: “Está escrito”, você derrotará o adversário das nossas almas.c) Ele vivia em constante espírito de oração. Lucas nos conta que Ele estava orando, quando o céu se abriu, o Espírito desceu sobre Ele, e o Pai proferiu aquelas palavras honrosas a respeito d’Ele. Logo após, foi Ele conduzido pelo Espírito ao deserto. Quantas vezes vemos nosso Senhor em oração durante os Seus dias aqui no mundo! E se Ele, em cuja natureza não havia nada que apelasse ao pecado, sentiu necessidade de orar, quanto mais necessidade desse recurso temos nós, herdeiros da natureza adâmica! Oremos, leiamos a Palavra, submetamo-nos ao Espírito, em todo o tempo (Ef 6.18), e assim estaremos exercendo vigilância e resistindo ao diabo, o qual fugirá de nós (1 Pe 4.8-9; Tg 4.7).
À primeira tentação Cristo respondeu demonstrando a Sua completa dependência do Pai para o Seu sustento, bem como a Sua plena obediência à Palavra de Deus. Era esta que condicionava o Seu viver. Por isso, citando Deuteronômio 8.3, Ele demonstrou não ser necessário agir por conta própria, independentemente da vontade do Pai, e operar um milagre para saciar a própria fome, pois o Deus que pôde sustentar o Seu povo no deserto, sem pão, durante quarenta anos, podia, agora, segundo a Sua vontade, providenciar o sustento para o Seu Filho. E de fato, após a retirada do tentador, “vieram anjos e O serviam”. Comer ou não comer não era o que mais Lhe importava. A “comida” que mais Lhe interessava era a obediência à vontade do Pai e a realização da Sua obra (Jo 4.34). Antes do estômago estava a vontade de Deus. Por isso, naquela ocasião, Ele não produziu pão para saciar a própria fome. Porém mais tarde, motivado pelo amor e compaixão, multiplicou uns poucos pães e saciou sobejamente a uma grande multidão.
O mesmo princípio deve nortear a nossa vida cristã. Todos temos legítimas necessidades materiais que precisam ser supridas. Precisamos “ganhar a vida”, e nada há de pecaminoso nisso. Porém, pode haver muito de pecaminoso nos meios de que nos valemos para isso. Nossos meios de vida devem estar regidos pela Palavra de Deus. A vontade do Senhor está acima mesmo das nossas mais legítimas necessidades.
À segunda tentação Cristo respondeu com Deuteronômio 6.16, demonstrando ser incredulidade pôr Deus à prova para ver se Ele cumpre as Suas promessas. A verdadeira fé não presume do poder e das promessas Divinas, mas aguarda pacientemente seu cumprimento. Ele demonstrou, também, que uma Escritura não invalida outra, e que só a aplicação correta da Palavra tem valor para a vida do servo de Deus. Assim, Cristo não precisava antecipar-Se, procurando por Si mesmo expandir o Seu ministério, mas tinha de fazê-lo segundo o programa traçado pelo Pai. Por isso Ele não Se atirou no vácuo para provocar um milagre. Porém, mais tarde, após ter passado muito tempo em oração, Ele andou sobre as águas, ultrapassando as leis naturais (Mt 14.22-25).
O princípio para nós é o mesmo. Só podemos contar com a proteção de Deus se permanecermos dentro dos limites da Sua vontade. Se nos expusermos à tentação não devemos esperar pelo Seu livramento. Por outro lado, não temos o direito de mal interpretar as Escrituras para justificar nossos erros.
À terceira tentação Cristo respondeu com Deuteronômio 6.13, demonstrando que o homem de Deus adora exclusivamente a Deus, custe-lhe isso o que custar. O reino e as glórias estavam-Lhe assegurados, mas Ele havia de recebê-los das mãos de Deus, e não de Satanás. Pelos métodos de Deus, e não pelos de Satanás. O plano de Deus era que Ele padecesse antes de entrar na Sua glória (Lc 24.26). As glórias teriam de vir após os sofrimentos (1 Pe 1.11). Não era por curvar-Se a Satanás, mas por afastá-lo que o plano Divino seria cumprido. Por isso, pela alegria que Lhe estava proposta, Ele suportou a cruz com todo o seu peso e hoje está sentado à destra do trono de Deus (Hb 12.2), tendo sido coroado de glória e de honra (Hb 2.9) e recebido um Nome acima de todo nome (Fp 2.9). E está próximo o dia glorioso quando o governo do mundo passará às Suas mãos para sempre (Ap 11.15).
Também para nós não pode haver glória sem cruz. Nossa vida tem de ser oferecida a Deus como um permanente culto de adoração. Evitar o sofrimento acarretado pelo amor de Cristo é curvar-se ao tentador. Devemos ser leais ao Senhor, custe-nos o que custar. Precisamos cumprir o ministério que Ele nos tem confiado seguindo o plano por Ele traçado. Só assim podemos contar com a Sua aprovação e bênção.
Que Deus nos ajude a seguir o exemplo do nosso Salvador e assim, pela obediência à Palavra de Deus, pela oração e submissão ao Espírito, sermos sempre vitoriosos em todas as tentações.
Luiz Soares – Revista “Vigiai e Orai” | Edições 77, 78 e 79 de julho de 1996 a março de 1997.