A Vinda do Senhor
“Aquilo que Caracteriza a Vida Cristã” – Proponho falar de um assunto que sinto ser de extrema importância – a vinda do Senhor Jesus. Meu propósito não é prová-la como uma doutrina, mas demonstrar que, já no início, era parte substancial do próprio cristianismo. Refiro-me à primeira vinda de Cristo, a qual está baseada na Sua morte redentora. Se olharmos para além do fato em si, veremos então que a vinda do Senhor não é só um conhecimento, mas parte substantiva da fé da Igreja de Deus; e dela depende também o estado moral dos santos e, por consequência, da Igreja de Deus. Você perceberá, à medida que observarmos algumas passagens, que a vinda está ligada e até mesmo permeia todos os aspectos do cristianismo, caracterizando-o e de alguma forma sempre associando-se a todo pensamento e sentimento do cristão. É impossível alguém ler sem preconceito as Escrituras e não ver esta ligação: ela se apresenta em quase todas as páginas.
Algumas pessoas tiveram o trabalho de contar quantas vezes a vinda do Senhor é mencionada na Bíblia; porém, o que eu digo vai além de contagem: ela está tão ligada a todo aspecto da vida cristã que, se a desconsiderar, você remove aquilo que caracteriza toda a vida cristã. A vinda fazia parte da identidade do “sistema” que se apregoava ao mundo. Veja a conversão. Alguém pergunta: “O que isto tem a ver com a vinda do Senhor?”. Pois este é um dos propósitos para o qual pessoas se convertiam: “esperar a vinda do Filho de Deus dos céus”. Este esperar pelo Filho de Deus caracterizava a conversão das pessoas. Elas se converteram para servir a Deus verdadeiramente, mas também para “aguardar dos céus o seu Filho” (1 Tessalonicenses 1:10).
Assim que a questão da salvação pessoal é resolvida, a Escritura começa a ocupar-se com outros dois assuntos: um é a graça soberana que, tendo-nos redimido do pecado, nos torna semelhantes a Cristo na glória (esta é a porção abençoada da Igreja de Deus); e o outro é o governo deste mundo. O centro do governo do mundo são os judeus. “Quando o Altíssimo distribuía as heranças às nações, quando separava os filhos dos homens uns dos outros, fixou os termos dos povos, segundo o número dos filhos de Israel. Porque a porção do Senhor é o seu povo; Jacó é a parte da sua herança” (Deuteronômio 32:8-9). Vemos, portanto, que em seu governo para o mundo, Israel é o elemento central; mas Israel rejeitou a Cristo e então foi colocado de lado por um tempo. O trono de Deus foi tirado de Jerusalém quando do cativeiro babilônico, mas um remanescente ainda foi poupado e trazido de volta para que lhes fosse apresentado o Rei; porém a Este eles recusaram, e por isso agora permanecem de lado até o retorno d’Ele. Da profecia de Daniel sobre as 70 semanas, somente 69 estão definitivamente cumpridas. Resta, portanto, a última semana – que ainda não se cumpriu; está por vir.
O mesmo se aplica às grandes festas: a Páscoa é cumprida – “Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós” – e a festa do Pentecostes teve o seu cumprimento na descida do Espírito Santo. Resta, no entanto, uma única festa que ainda não se cumpriu: a dos Tabernáculos – não existe ainda o antítipo para ela.
Mas isto tem sido ocasião para que Deus opere outra obra bendita, pois neste ínterim Deus está chamando pobres pecadores para terem parte com Seu Filho e serem iguais a Ele, visto que somos predestinados a conformar-nos à imagem de Seu Filho, para que Ele seja o primogênito entre muitos irmãos. Deus toma a nós, pobres pecadores, para que tenhamos a mesma glória de Seu Filho. É um aspecto confirmado na profecia, o fato de termos uma porção relativa ao mundo e ao povo judeu. Quando Ele aparecer, nós apareceremos com Ele em glória.
A postura do cristão quanto à vinda do Senhor é a de aguardar a Sua volta segundo a Sua promessa. Algumas pessoas dizem que Cristo vem na ocasião da morte. Eu respondo: Você faz da morte a mesma coisa que Cristo? Se este fosse o caso, então Ele voltaria ao mundo centenas e centenas de vezes, enquanto nas Escrituras lemos. que Ele virá apenas duas vezes ( Hebreus 9:28). Devo-lhe falar do que acontecerá quando Cristo voltar? A ressurreição! Isto é algo bem diferente da morte. Para os santos, a vinda de Cristo é o fim da morte – exatamente o contrário. Creio eu que ninguém pode encontrar na Escritura a ideia de que Cristo vem na morte. Antes, pelo contrário, em vez de ser morte, a vinda de Cristo é ressurreição. E tem mais: por ocasião da morte, somos nós que vamos para Cristo, não é Cristo que vem a nós. Bem aventurado é “deixar o corpo e estar presente com o Senhor”, “ausente do corpo, presente com o Senhor”. Mas o meu propósito hoje é mostrar que este tema da vinda de Cristo caracteriza e se mistura com todo aspecto da vida cristã.
Em primeiro lugar, como já foi dito, temos a conversão. Os cristãos primitivos se convertiam para aguardar o Filho de Deus dos céus. Citarei outras passagens para sustentar este argumento, mas primeiro vamos para Tessalonicenses. No final do segundo capítulo da primeira epístola, o apóstolo declara seu conforto e alegria no serviço cristão. Ele fora perseguido e expulso da presença dos tessalonicenses e, ao escrever-lhes, comenta seu alento e consolo quando lembra-se deles. Mas como? “Pois, que é a nossa esperança, ou alegria, ou coroa em que exultaremos? Não estão vós na presença de nosso Senhor Jesus na sua vinda?”(1) Ele não pode falar de seu interesse por eles e de sua alegria sem colocá-los no contexto da vinda do Senhor Jesus. Mais adiante na epístola coloca ainda um outro assunto em conexão com a vinda do Senhor: a santidade: “O Senhor vos faça crescer, e aumentar no amor… a fim de que sejam os vossos corações confirmados em santidade, isentos de culpa, na presença de nosso Deus e Pai, na vinda de nosso Senhor Jesus, com todos os seus santos” (1 Tessalonicenses 3:12-13).
(1)Tradução literal do texto em inglês.
Os irmãos em Tessalônica estavam aguardando o Senhor com tanta devoção que, quando alguém morria, achavam que esta pessoa não estaria mais preparada para encontrar-se com o Senhor. Estavam errado quanto a isto, e o apóstolo corrige o seu erro. Hoje, no entanto, quando um santo morre, prontamente se comenta que logo o seguiremos. Porém não é a esta possibilidade que o apóstolo aplica a sua ênfase. Suponha que eu fosse consolar um cristão que perdeu um ente querido: “Não se preocupe, Cristo o trará juntamente com Ele”. Esta pessoa certamente me terá como um bruto ou estúpido; mas é justamente esta a forma pelo qual o apóstolo os consola: “Deus, mediante Jesus, trará juntamente em sua companhia os que dormem” (4:14). A seguir, o apóstolo demonstra como ele fará isto: “Nós os vivos… de modo algum precederemos os que dormem”. A primeira coisa que o Senhor fará quando descer e buscar a Igreja será ressuscitar os santos que dormem. Jesus há de trazê-Ios com Ele. Se dormiram em Cristo, seus espíritos terão estado com Ele; mas aí receberão glória e, ressuscitados em glória, serão semelhantes a Ele (eles que outrora tinham sido semelhantes ao primeiro Adão); e, indo encontrá-LO no ar, estarão para estar para sempre com Ele. Portanto, quando Ele aparecer, trará juntamente consigo os santos que morreram, e eles aparecerão com Ele em glória.
Você verá que essa ideia da vinda também está presente, num formato bastante geral, no capítulo 5, onde Paulo deseja que todo espírito, alma e corpo dos tessalonicenses seja preservado sem culpa para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo.
Note, portanto, que esta esperança pelo retorno de Cristo é um elemento que faz parte da condição do cristão, sob todos os aspectos, pois tudo está ligado à vinda do Senhor:
1. (1 Tessalonicenses 1) A conversão, 2. (1 Tessalonicenses 2) A alegria no serviço, 3. (1 Tessalonicenses 3) A santidade, 4. (1 Tessalonicenses 4) A morte de um santo, 5. (1 Tessalonicenses 5) O alvo de ser irrepreensível.
Tome agora Mateus 25. As virgens sábias levam óleo nas suas vasilhas, porém caem no sono e esquecem que o noivo estava chegando. O que eu gostaria de indagar especificamente aqui é “Qual era o chamado original?”. A resposta clara e positiva é que elas saíram para encontrar-se com o noivo, mas como ele demorava “todas” vacilaram e dormiram – todas esqueceram a Sua vinda, tanto as sábias como as néscias. Certamente elas se acomodaram em um lugar bem confortável, pois acampar ao ar livre não é agradável à carne. Foi quando à meia noite, ouviu-se o clamor: “Eis o noivo!”. O que as acordou foi esse clamor. Desde o princípio, o propósito original da Igreja era de ir ao encontro daquele que vinha; mas até mesmo os verdadeiros crentes se esqueceram disso. O clamor ainda dizia: “Saí ao seu encontro”. O que as desperta do sono é um renovado chamado que ouvem agora para saírem ao Seu encontro por ocasião de Sua vinda. Na parábola a seguir, a dos talentos, observamos o mesmo enfoque com relação ao serviço e responsabilidade cristã. O Senhor sai na Sua jornada e diz aos discípulos, por assim dizer, “Ocupem-se até que eu volte”.
Outro fato relevante quanto a esta verdade é que ela sempre é apresentada como uma expectativa que opera no presente. Não há nenhuma ocorrência do Senhor ou dos apóstolos falando da vinda do Senhor e considerando a probabilidade de ela ser adiada para além da vida daqueles a quem estão falando. Poderia acontecer numa madrugada, ou pela manhã; mas eles deveriam estar aguardando dos céus a vinda do Filho de Deus. Nas parábolas referidas, as virgens que dormiram eram as mesmas virgens que despertaram. Os servos a quem os talentos foram confiados eram os mesmos que prestaram contas no Seu retorno. Sabemos que séculos já passaram, mas Ele não permitirá que nenhum atraso seja cogitado. “A hora em que não cuidais, o Filho do homem virá”. “Bem aventurado aquele servo a quem seu Senhor, quando vier, achar fazendo assim”. Repito então: Qual foi a causa da ruína da Igreja? Foi: “O meu senhor demora-se” . Não se dizia “Ele não virá”; mas “Ele tarda a Sua volta”. Aquele servo, então, começa a bater nos outros servos e servas, a comer e beber com os bêbados, e isso então acarreta no seu julgamento. Se a noiva ama o Noivo, o seu único anseio é querer vê-LO. Seu coração está onde Ele está. Quando a Igreja perdeu este caráter, ela se acomodou onde estava; ela se tornou mundana e já não se preocupou mais com a vinda do Senhor.
Vá agora para Lucas 12, e note como este esperar por Cristo caracteriza o cristão, bem como o modo de serví-LO durante Sua ausência. “Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração” (Mateus 6:21). Eles deveriam estar com os lombos cingidos e com suas candeias brilhando. Tal era a característica de um cristão; deveriam ser como homens que esperavam por seu Senhor, e estar de prontidão para recebê-LO. Sim, suas afeições concentradas no objeto correto, professando a Cristo, mas também vigilantes pela volta de seu Senhor. Não se trata de possuir a doutrina da vinda do Senhor. A benção descansa naqueles que estão vigiando, “como homens que aguardam por seu Senhor”. “Bem aventurados são os servos, os quais, quando o Senhor vier, achar vigiando. “Eles devem estar cingidos (2), com as candeias acesas no tempo de Sua ausência, e vigiar por seu retorno; por Sua vez, Ele os fará assentar à mesa. Se cingirá e os servirá”. Hoje, devemos estar cingidos (2) e vigilantes; nosso descanso não é aqui. “Mas”, diz o Senhor, “quando Eu tiver todas as coisas do meu jeito, vocês se assentarão à mesa, e Eu me cingirei e os servirei. Farei com que usufruam o melhor do que tenho nos céus, e Eu o ministrarei a vocês… apenas estejam vigilantes”.
Cristo assumiu a forma de servo, e em graça permanecerá eternamente em consonância com a forma que assumiu. Em João 13 temos que hoje mesmo Ele já está cingido. Os discípulos naturalmente pensariam que, uma vez assunto aos céus em glória, cessaria o serviço de Cristo em favor deles. Mas Ele diz: “Eu estou partindo; não me é possível permanecer aqui com vocês; sei, contudo, que não posso desampará-los. Visto não poder permanecer com vocês aqui na terra, tenho de fazê-los adequados a Mim que agora estarei no céu. Se eu não te lavar, não tens parte comigo”. Porém o agente passa a ser água, e não sangue. “Quem já se banhou não necessita de lavar senão os pés” (João 13:10). A nova vida decorrente da conversão, enfim, a salvação, é um fato consumado uma vez por todas; mas nos sujamos no caminho (e isso compromete a nossa comunhão e o andar cristão); é nesse momento que a Sua graça e advocacia estarão ali para lavar nossos pés, para readequar a nossa condição à presença de Deus – lá onde Cristo está. É certo que o cristão passa por um processo de crescimento, e o novo homem nele também, especialmente em vista da sensibilidade para manter-se absolutamente limpo. Se, porventura, não for vigilante, eu absorverei sujeira no meu caminho. Mas a presença dela impossibilita minha comunicação com o céu, e também minha comunhão com o que lá está. É então que o Senhor diz: “Eu não desampararei vocês por estar indo para Deus e para a glória; mas tenho de adequá-los para lá. Uma vez que já estão lavados (embora não todos, pois Judas estava lá), o meu propósito agora será mantê-los nessa aptidão e restaurá-los quando caírem. Mas vocês precisam vigiar enquanto eu estiver ausente”.
(2) Cingido: Vestido, preparado para o serviço.
Para mim é um conforto saber que todas as virgens despertaram a tempo, e eu creio que todos os Seus santos despertarão antes da volta do Senhor. Se olharmos ao redor, torna-se difícil para nós acatar isso, pois há muitos que não acolhem o chamado. Mas ao verdadeiro serviço ao Senhor está associado o “vigiar”.
É a esta atitude que estão vinculados a bênção e o banquete celestial. Mas há ainda outra coisa: a ordem, enquanto ele estiver ausente, é “servir”; e o resultado que se vê é: “Sobre todos os meus bens o porei”. Como é dito de Israel, é bem melhor comer do trigo mais fino, e isto na casa do Pai; contudo, se sofrermos com Ele, certamente também com Ele reinaremos. O serviço na Sua ausência reverterá no privilégio de governar; e da mesma forma o vigiar me levará ao banquete celestial. Seguindo aqui em Lucas veremos que o Senhor aborda outra vez o que já tínhamos visto em Mateus, o dizer: “O meu Senhor tarda em vir”.
O que o Senhor está querendo sublinhar quanto ao vigiar e também ao servir é: “Eu retomarei. Estejam, pois, vigiando por mim, como tais que esperam pelo seu Senhor”. Aí está o detalhe que deveria caracterizá-los como cristãos. Suponhamos que todas as pessoas nesta cidade estivessem realmente vigiando, esperando pela volta do Senhor dos céus, sem saber a hora exata em que Ele viria; não acha você que esta cidade inteira seria transformada? Uma pessoa certa vez me disse que, se todos cressem nisso, o mundo não poderia continuar o seu curso atual. E, quanto ao crente, ele definitivamente não pode seguir conforme o padrão mundano.
Se as pessoas estivessem aguardando o Senhor dos céus, todo o tom e caráter de sua vida seriam mudados. A posse da doutrina da vinda de Cristo não é indicador que estou de fato procurando por Ele. Cuidem, amados, eu não gostaria de estar acumulando riquezas quando Ele vier.
Vire agora para Filipenses 3. Paulo estava correndo uma corrida, e esquecia de tudo menos do alvo. “Esquecendo-me das cousas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão”. Como, então, neste contexto, ele fala de Cristo no final do capítulo? “Irmãos, sede imitadores meus… Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo” etc. Ele tinha visto Cristo, e não se contentaria até que se assemelhasse a Ele em glória. Estar com Ele então, sem dúvida, era melhor, mas não era este o alvo de seu coração. As pessoas falam de ir à glória quando morrem. Não existe este pensamento nas Escrituras de estarmos na glória quando partimos para estar com Cristo. Estaremos sim, com Ele; e que bênção e alegria isto será! – isto eu também gostaria de realçar. Mas será somente quando Ele voltar que transformará estes corpos vis à semelhança do Seu glorioso corpo. Estou esperando até que o meu corpo seja transformado, para ser como Cristo em glória; e o que é mais, Cristo está esperando também.
A vinda do Senhor afeta todas as verdades do Cristianismo. Absolutamente, Cristo não está no Seu próprio trono agora. De acordo com a Palavra em Hebreus 10 (e também Salmo 110), Ele está hoje assentado à direita no trono do Pai, como Ele mesmo disse na sua carta à Laodiceia. Em Sua primeira vinda, Ele resolveu a questão do pecado para aqueles que n’Ele creem, de modo que estes não têm mais consciência dos pecados; estão aperfeiçoados para sempre. Para os que O aguardam, Ele aparecerá uma segunda vez, sem pecado, para a salvação. Com vistas a isso, Ele hoje está aguardando nos céus até que Deus lhe ponha os seus inimigos debaixo de seus pés. Porque diz Ele “Seus inimigos?”. Porque, quanto aos Seus amigos, Ele está assentado – visto já ter feito tudo o que era necessário em favor deles (isto é, aqueles que n’Ele creem). Mas… e quanto a você? Todos seus pecados já foram eliminados da vista de Deus? (1 Pedro 2:24). Se não, quando serão? Que você esteja desgostoso por ter em sua conta tantos pecados – tudo bem! Porém, se não foram carregados e removidos lá na cruz, quando serão? Você poderia fazer Cristo morrer outra vez, segundo o seu critério? Poderia conseguir alguém mais que o fizesse? Se a cruz não se aplica a você, não haverá outro recurso que se aplique. Amigos, se a obra não foi realizada ali, não o será jamais por outro modo. Mas ela foi feita, e portanto, diz Ele, os adoradores, uma vez purificados, não mais têm consciência de pecados, “Porque com uma única oferta aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados” (Hebreus 10:2,14).
(3) (Ap 3:21).
Se olhar agora em Colossenses 3, você verá esse mesmo tema que estamos tratando(4) sendo apresentado como a nossa esperança: “Quando Cristo, que é a nossa vida, se manifestar, então vós também sereis manifestados com ele, em glória”. Ao falar de Sua partida para os discípulos, a Sua primeira promessa é: Ele viria novamente. Não se turbem (o que seria natural aos que perdiam o Amigo por quem tinham abandonado tudo); não estarei sozinho na casa de meu Pai. Lá, há muitas mansões, e Eu estou indo preparar um lugar para vocês. Não estejam inquietos, saibam que Eu não posso ficar com vocês aqui, mas é mister que Eu lhes tenha ali comigo. Por isso, a primeira coisa que lhes assegura é: “Virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo”. Não será um por um pela morte, mas pela ressurreição dos mortos e pela transformação dos vivos; Ele virá para recebê-las, ressurretos ou transformados, para que estejam com Ele ali onde está agora, à Sua semelhança, e assim estaremos em glória com Ele.
(4) N. do T. A glória de Cristo, que será então manifesta para nós quando de sua vinda.
Mais uma vez: Ao deixar os discípulos, qual a última coisa de viram dEle? Viram-no subir diante de seus olhos, e os anjos lhes disseram: “Por que estais olhando para as alturas? Esse Jesus … assim virá do modo como o vistes subir” (Atos 1:11). A vinda de Cristo permeia toda a vida cristã.
Qual a última palavra das Escrituras? “Certamente venho sem demora. Amém. Vem, Senhor Jesus” (Apocalipse 22:20). Temos isso também no início do referido livro, num contexto de avisos e ameaças: “Jesus Cristo, a fiel testemunha, o primogênito etc … Eis que vem com as nuvens, e todo olho o verá” (Apocalipse 1:7). Mais adiante, já no final, tendo cessadas as instruções proféticas: “Eu, Jesus, enviei meu anjo… Eu sou … a brilhante estrela da manhã”. Com isto percebo o que estes santos, e somente eles, veem. Não se veem estrelas quando o sol já levantou; se eles veem a estrela da manhã, a qual é vista um pouco antes do alvorecer, então a noite já está adiantada, o dia breve começará. Ele aqui denomina-se “a raiz e a geração de Davi, a brilhante estrela da manhã. O Espírito e a noiva dizem, Vem”. Pois bem, se a noiva tem a consciência de ser a noiva de Cristo, ela tem de desejar estar com o Noivo. Não terá amor apropriado para com Cristo a não ser quando deseja estar com Ele. Na ocasião em que Abraão disse de sua esposa: “Ela é minha irmã”; ela foi conduzida pelos egípcios – o mundo- para a casa deles.
Para que tenhamos considerado toda a esfera das afeições da Igreja, acrescento ainda a continuidade do trecho ora abordado. “O Espírito e a noiva dizem, Vem (isto dirige-se ao noivo). Aquele que houve diga: Vem”. Note que o cristão, tendo ouvido a palavra de sua salvação, entoa junto esse clamor. A seguir são chamados para vir aqueles que têm sede de água viva. Sim, os santos da Igreja podem dizer (apesar de não terem ainda o seu Noivo em glória) que possuem a água viva, e assim ousam clamar: “Aquele que tem sede, venha”, para depois ainda generalizar a I chamada: “Quem quiser receba de graça a água da vida”. Isto eles têm, apesar de ainda não terem o Noivo. A lição que tomo deste versículo é que, na Palavra de Deus, os pensamentos, os sentimentos, a conduta, os afazeres e as afeições dos cristãos são identificados com a vinda de Cristo. Contemple cada uma destas coisas, e você verá que são identificadas com a vinda do Senhor.
(5) No contexto da Bíblia, o Egito tipifica o mundo.
Leia a primeira epístola de João no capítulo 3: “Vede que grande amor … agora somos filhos de Deus [isto já está em vigor}, e ainda não se manifestou o que havemos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque havemos de vê-lo como ele é”. Amados amigos, somos predestinados a ser “conformes à imagem de seu Filho” (Romanos 8:29). Isto é o que Deus determinou para nós. Mas quando seremos como Cristo em glória? Quando Ele vier. Não é na ocasião da morte, quando o espírito partirá para estar com Cristo; pois neste evento a pessoa é como Cristo quando estava no túmulo; e eu não quero ser como Cristo quando estava no túmulo. Embora, morrendo eu, serei sim como Cristo quanto à Sua morte, mas não é isto que eu quero, mesmo sendo uma bênção. Eu quero ser semelhante a Ele na glória. E quando será isto? Quando Ele vier, transformará os nossos corpos corruptíveis, modelando-os segundo o Seu corpo glorioso. Portanto, hoje ainda não se manifesta o que seremos, mas quando Ele aparecer então seremos como Ele.
Observem, então, as consequências práticas incidentes sobre aquele que, quanto à sua fé, tem sido encaminhado nos propósitos de Deus. “A si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro” (1 João 3:3). Eu sei que serei perfeitamente semelhante a Cristo na glória, portanto, quero ser já aqui o quanto possível semelhante a Ele. Vemos aí uma coisa que a Sagrada Escritura ensina com bastante clareza: que o padrão para a santidade é a conformidade com Cristo em glória. Hei de ser semelhante a Cristo em glória, e para mim não há outro padrão. Lembre-se da passagem já citada: “a fim de que sejam os vossos corações confirmados em santidade, isentos de culpa, na presença de nosso Deus e Pai, na vinda de nosso Senhor Jesus, com todos os seus santos” (1 Tessalonicenses 3:13). Para o cristão este é o padrão de perfeição: ser como Cristo quando de Sua vinda. Em 1 Coríntios 15:42 é feita’ essa conexão com a ocasião da ressurreição: “Semeia-se em desonra, e ressuscita em glória”. Essa bendita segurança acompanha a verdadeira esperança da primeira ressurreição e de seus resultados.
Seremos perfeitamente semelhantes a Cristo quando estivermos ressurretos da morte. Então prestaremos contas de nós mesmos, mas somente o faremos quando formos semelhantes a Pessoa à qual prestaremos conta. Muitos não têm aplicado para si o propósito da primeira vinda de Cristo, e por isso as pessoas não se sentem confortáveis ao pensar na Sua segunda vinda. Mas ao santo ocorre-lhe: “Todos serão vivificados… cada um … por sua ordem: Cristo, as primícias; depois os que são de Cristo, na sua vinda”. (1 Coríntios 15:23). É Cristo as primícias dos maus? Certamente não. Ao ressuscitar a Cristo, Deus testemunhou publicamente Sua aprovação pela Pessoa e Obra de Cristo; e assim também a ressurreição dos santos será o testemunho divino que aprova os seus como sendo dEle; é o que vemos em Lucas 20:35-36: “Mas os que são havidos por dignos de alcançar a era vindoura e a ressurreição dentre os mortos, não casam nem se dão em casamento. Pois não podem mais morrer, porque são iguais aos anjos, e são filhos de Deus, sendo filhos da ressurreição” .
Pode alguém mostrar-me alguma passagem sobre uma ressurreição universal? Não existe tal pensamento nas Escritura. Cita-se Mateus 25 com esse propósito, argumentando que as duas classes ali presentes, os cabritos e ovelhas, representam as duas categorias dentre a humanidade. Porém esta passagem descreve Cristo vindo em glória sobre a Terra. Não se trata do grande trono branco, aquele onde todos serão citados; pois antes deste o céu e a terra ainda fugirão. Nesta passagem aqui Ele vem para a Terra e assenta-Se no Seu trono. Quando Ele vier, e lá se assentar, Ele reunirá todos os gentios as nações – para os julgar. É o julgamentos dos vivos, ou seja, dos que estarão vivendo naqueles dias. Mas temos aí três tipos de pessoas, e não dois; e também não há nada de ressurreição. Temos ovelhas, cabritos e irmãos (Mateus 25:40). Muito aquém de ser uma ressurreição universal, não vemos nenhuma referência à ressurreição; o tema é completamente outro. Além do mais, a única questão é: como eles trataram os irmãos dEle? A avaliação refere-se a um período de tempo específico e limitado, quando da pregação do Evangelho do reino; portanto, não é o julgamento universal. Pouco antes de Sua vinda em glória, ocasião em que julgará os vivos, será novamente anunciado o Evangelho do reino; e os que viverem naqueles dias, tendo o testemunho do reino, serão considerados de acordo como receberem os mensageiros de Deus; mas somente estes estão em julgamento.
O ponto ao qual volto agora é que a vinda do Senhor influencia e forma toda a vida do cristão. Não se pode separar nada de toda trajetória e circunstâncias do cristão da vinda do Senhor Jesus; e há somente a primeira vinda, e a segunda vinda. Ele apareceu a primeira vez quando venceu o mundo, e para aqueles que o procuram aparecerá a segunda vez para a salvação. É verdade que Ele vem e habita no nosso meio; mas procuramos ater-nos ao que a Escritura fala de Sua vinda efetiva. Tome então a santidade, o serviço, a conversão, o ministério confiado ou uma pessoa que morreu: tudo está ligado à vinda de Cristo. E Ele exorta para que sejamos encontrados vigilantes.
Eu poderia ainda citar outras passagens, mas já citei o suficiente para mostrar que a vinda do Senhor está ligada a tudo na vida cristã. Quando o veremos como Ele é, aí então, e somente então, seremos semelhantes a Ele, de acordo com os propósitos de Deus. E agora eu pergunto: Você está aguardando o Filho de Deus dos céus?
Ele levou os pecados de muitos, é esta a única base de esperança para qualquer pecador; é esta obra consumada – a Sua morte redentora – que nos capacita, por meio da fé, para aguardarmos por Ele quando selados pelo Espírito Santo. Se então indagar: O que estou esperando? Sei responder: Estou aguardando o Filho de Deus dos céus. Você poderia dizer: “Estou velando pela vinda de Cristo”? Não sabemos quando Ele virá. “Bem aventurado aquele servo a quem seu senhor, quando vier, achar fazendo assim” (Lucas 12:43). A questão não é se você conhece a doutrina da vinda do Senhor. É para vigiar e esperar por Ele que os discípulos se converteram. Aquilo que despertou as virgens foi o grito: “Eis o noivo!”. E você? Está realmente aguardando a vinda do Filho de Deus dos céus? Você gostaria que Ele viesse hoje à noite? Pedro explica a demora. Ele diz que Sua longanimidade é a salvação, não desejando que ninguém pereça. O que você pensaria se Ele viesse hoje à noite? Seria realmente aquilo que sua alma estava anelando? Eu irei sentar-me à mesa e Ele se cingirá, virá e me servirá. Algumas pessoas acham que a espera pelo Filho de Deus dos céus iria frear o Evangelho. Teria Noé parado de pregar porque creu no testemunho divino sobre o dilúvio? Longe de o impedir, foi justamente o que o deu força. Que o Senhor nos conceda estarmos prontos quando vier – e que nos encontre velando por Ele!
John Nelson Darby (18 de novembro de 1800 – 29 de abril de 1882) – Foi um pregador anglo-irlandês, figura muito influente entre os Irmãos de Plymouth e o fundador dos Irmãos Exclusivos. Foi considerado o pai do moderno Dispensacionalismo e do Futurismo. A teologia do arrebatamento pré-tribulacional foi popularizada extensivamente na década de 1830 por John Nelson Darby e os Irmãos de Plymouth, e se tornou ainda mais conhecida nos Estados Unidos no início do século 20 pela vasta circulação da “Scofield Reference Bible” (em português, Bíblia de Estudo Scofield). Produziu uma tradução da Bíblia baseada nos textos em Hebraico e Grego chamada The Holy Scriptures: A New Translation from the Original Languages by J. N. Darby, mais conhecida como Bíblia Darby.