Existem muitos livros, bem autenticados e bem detalhados, que contam a historia do cristianismo, desde o seu começo humilde em Jerusalém (At 2:41) até ao dia de hoje. Falam do seu desenvolvimento e das suas divisões; mostram a origem e a história das inúmeras denominações que professam ser a Igreja, ou uma parte dela. Esta história, porém, não é a história da Igreja de Jesus Cristo. É a história daquela pequena semente que tornou-se em grande árvore e as aves do céu fizeram ninho nos seus ramos (Mt 13:31-32). É a história de organizações que professam o Nome de Cristo (O texto é a íntegra do livrete “A História Esquecida”, publicação da “Editora Sã Doutrina”).
É uma história que nos empolga e ao mesmo tempo nos envergonha. Ficamos empolgados ao ler as histórias da fé e da coragem dos mártires que não negaram o seu Senhor. Envergonham-nos, porém, as intrigas, as heresias, as guerras chamadas santas e a Inquisição. Alegra-nos ler das conquistas do Evangelho, mas entristece-nos ver o abandono das doutrinas Bíblicas, e até da honestidade e da sinceridade.
A Igreja do Senhor Jesus Cristo, porém, não é uma organização; é um organismo vivo. Não tem sede em lugar algum na Terra; é celestial. Não tem líder humano; Jesus Cristo é o “Cabeça”. As igrejas que vemos no Novo Testamento pouco ou nada têm em comum com as organizações eclesiásticas do cristianismo histórico.
A Verdadeira História
A verdadeira história começou a ser escrita por Lucas, que nos deixou um livro inspirado pelo Espírito Santo, e portanto digno de toda a confiança. Neste livro vemos como o Evangelho foi levado de Jerusalém para outras cidades, países e continentes. Vemos também como os salvos em cada localidade se reuniam, formando igrejas locais. Segundo a história relatada em Atos dos Apóstolos, estas igrejas não se uniram para organizar uma “Igreja” composta de muitas “igrejas filiadas”; eram igrejas autônomas. Cada uma destas igrejas, diretamente responsável ao Senhor, tornou-se um centro de evangelismo, levando as boas novas a todos em redor, e desta forma se multiplicavam.
Seguindo a estrada do tempo, logo encontramos uma bifurcação. Até o ano 63 a.D. tudo é claro, pois o Espírito Santo registrou a história como Ele a viu. A partir desta data, porém, vemos dois caminhos que atravessam os séculos. Aquele que segue em frente parece estreito, escuro, e pouco movimentado. A maioria segue pelo outro caminho, que desvia ligeiramente para um lado, mas parece ser o principal, pois é bem iluminado e muito movimentado. A maioria dos historiadores seguiram este caminho largo, contando-nos a história da “Igreja Professa”. É bem documentada e bem conhecida. Neste livreto, porém, vamos caminhar pela outra estrada, observando o que pudermos da história esquecida. Este caminho é estreito, e relativamente pouco movimentado, porque a maioria desviou-se dele; é escuro, pois existem poucas informações a seu respeito, mas isto não deve nos assustar. Creio que nossa viagem por este caminho trará muitas recompensas, e a nossa fé será fortalecida.
O fato da maioria dos cristãos professos se desviarem do modelo bíblico não surpreende aquele que lê o Novo Testamento. Vez após vez o Espírito Santo avisou que isto aconteceria. Ao conversar com os anciãos da igreja em Éfeso, Paulo disse que lobos cruéis entrariam no meio deles, e também avisou que do meio daqueles presbíteros se levantariam homens que procurariam atrair os discípulos após si, dividindo a igreja (At 20:29-30).
Na primeira carta a Timóteo, o Espírito expressamente diz que nos últimos tempos alguns apostatariam da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores e doutrinas de demônios (I Tm 4:1). Na última carta inspirada que Paulo escreveu, aprendemos que muitos não suportariam a sã doutrina e resistiriam à verdade (II Tm 3:8 e 4:3). O apóstolo Pedro também avisou deste desvio da verdade, dizendo: “entre vós haverá falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição” (II Pe 2:1). E João, o último dos apóstolos, disse: “Amados, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus; porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo” (I Jo 4:1).
Poucas Informações
A escassez de informações quanto à história de igrejas neotestamentárias é devido a dois fatos importantes:
Através dos séculos, as organizações eclesiásticas dominaram e perseguiram aquelas igrejas autônomas que procuravam manter a simplicidade do modelo deixado no Novo Testamento. Em consequência disto, a literatura daquela época ainda existente é a do grupo dominante. Os escritos das igrejas locais foram, quando possível, destruídos pelos perseguidores, de sorte que a maior parte das informações que temos acerca destas igrejas é o que seus perseguidores escreveram a respeito delas.
A própria natureza destas igrejas contribuiu para esta escassez de informações. Sendo celestiais e espirituais, ficaram separadas das organizações e movimentos terrenos, e consequentemente há pouca menção delas na história secular. Também como igrejas locais e autônomas, não se filiaram a nenhuma organização, e portanto não chamaram a atenção dos historiadores.
Em O Cristianismo Através dos Séculos H. H. Muirhead diz: “Infelizmente os dados históricos não permitem traçar passo a passo a história das igrejas do NT. Isto porque a quase totalidade das informações acerca dos grupos divergentes procede dos seus maiores inimigos. Sustentamos, porém, que a continuação histórica das doutrinas essenciais pode ser traçada, e que Deus não tem ficado sem testemunhas” (pág. 76).
Igrejas Neotestamentárias
Apesar da escassez de informações, e das dificuldades que cercam este estudo, haverá grande recompensa para aquele que procura descobrir a história das igrejas de Deus. Ele descobrirá que nestes dois mil anos que já se passaram desde o começo da primeira igreja local (a de Jerusalém – Atos 2), sempre houve igrejas que procuravam seguir fielmente o modelo deixado no Novo Testamento. Neste livreto vamos chamá-las de igrejas locais porque, permanecendo fieis ao ensino do NT, não se filiaram a nenhuma organização ou movimento; continuaram sendo igrejas autônomas e, consequentemente, locais. Deus nunca se deixou a Si mesmo sem testemunho (At 14:17).
O historiador E. H. Broadbent escreve: “Há uma sucessão ininterrupta de igrejas, compostas de crentes, que procuravam praticar o ensino do Novo Testamento. Esta sucessão não é encontrada necessariamente num só lugar, pois frequentemente estas igrejas foram dispersas ou se degeneraram, mas outras, semelhantes, surgiram em outros lugares. O modelo é apresentado nas Escrituras com tanta clareza, que é possível haver igrejas semelhantes em diversos lugares, mesmo não sabendo que outros, antes deles, seguiram o mesmo caminho, ou que nos seus próprios dias alguns estavam fazendo isto em diversos lugares” (The Pilgrim Church, pág. 2).
H. H. Muirhead afirma: “… há duas linhas históricas a traçar; duas tendências que não se conciliam – a centralização administrativa e a fixidez dogmática, por um lado, e a reação em favor dos ensinos e práticas do Novo Testamento, simples e sem artifícios, por outro … A primeira delas tem o seu ponto culminante na hierarquia romana: a segunda, numa volta à norma apostólica” (O Cristianismo Através dos Séculos, pág. 75).
No final do terceiro século, a maioria das igrejas era muito diferente daquelas igrejas dos dias dos apóstolos. As mudanças foram realmente grandes. O livro já citado, O Cristianismo Através dos Séculos, ainda comenta: “Essa transformação, que gradualmente ia formando a Igreja Católica, foi motivada pela rápida influência judaica e pagã. Naturalmente essa transformação não poderia deixar de provocar protestos por parte dos mais espirituais nas igrejas, resultando em divisões”. E. H. Broadbent também escreve sobre esta transformação: “À medida que a organização do grupo católico de igrejas desenvolvia, surgiram no seu meio grupos que almejavam uma reforma; também algumas igrejas se separam dela; e ainda outras, perseverando nas doutrinas e práticas reveladas no NT, achavam-se isoladas daquelas igrejas que as abandonaram … Havia naquele tempo, como agora, várias linhas divergentes de testemunho … e vários grupos de igrejas que se excluíam mutuamente” (The Pilgrim Church, pág. 11).
Os Montanistas
Muitos daqueles que se opuseram às mudanças nas igrejas foram apelidados Montanistas, devido à grande influência de Montano que, partindo da região da Frígia, condenava corajosamente os desvios das igrejas que abandonavam o modelo bíblico da igreja local.
Os Montanistas, entre outras coisas, ensinavam que a direção das igrejas é prerrogativa do Espírito Santo, e resistiam à dominação exercida pelos “bispos”. Destacavam a necessidade de cada igreja deixar lugar para a operação do Espírito no seu meio. No leste do Império Romano logo surgiu uma separação definitiva, porém no ocidente os chamados “Montanistas” permaneceram em comunhão com as igrejas que aceitavam a autoridade dos “bispos” até o começo do século III, quando finalmente seguiram o exemplo dos seus irmãos do leste, separando-se daquele grupo que viria a ser a Igreja Católica. Um dos ensinadores mais destacados naquela época entre os Montanistas foi Tertuliano, cuja oposição à ideia de federação, e cuja defesa da autonomia das igrejas locais, foram decisivas nesta separação. O alvo dos chamados Montanistas era “fazer voltar o Cristianismo aos seus moldes primitivos” (O Cristianismo Através dos Séculos, pág. 85). A Shaff-Herzog Encyclopedia, Vol III, diz o seguinte a respeito deles: “Não foi uma nova forma de Cristianismo: foi a volta ao velho, à Igreja primitiva, em oposição à corrupção do cristianismo corrente” (pág. 1562).
Não devemos pensar, porém, que todas as igrejas que foram apelidadas “Montanistas” eram realmente igrejas segundo o modelo nas Escrituras. A “Igreja” perseguidora incluía sob este nome muitos que divergiam entre si, da mesma maneira que as palavras “crente” ou “evangélico” são usadas hoje. Muitos que se chamam de crentes em nossos dias professam falar em línguas desconhecidas e ter o poder de fazer milagres, expulsar demônios e curar os enfermos. São divididos em inúmeras denominações onde cada congregação tem o seu Pastor. Qualquer historiador daria ênfase a estes, pois são a vasta maioria, e se mencionasse aquelas igrejas que hoje seguem o modelo claro do NT as chamaria também de “crentes” ou “evangélicas”, embora estas nada têm em comum com as denominações.
Entre os chamados Montanistas havia divergências. Algumas destas igrejas, fugindo do erro de organização humana na obra de Deus, caíram em outro erro por não entender as Escrituras no tocante aos dons do Espírito Santo. Procuravam os dons de línguas, de profecia, e outros semelhantes que foram dados como sinais nos primeiros anos da era apostólica, não percebendo que tais dons haviam cessado (Mc 16:16-20 e Hb 2:3-4). Outras igrejas, porém, baseando-se no ensino da Palavra de Deus, sabiam que tais dons não mais existiam, e continuavam seu testemunho simples e fiel segundo a Palavra de Deus. Estes foram chamados de Novacianos.
Os Novacianos
Foram assim apelidados porque um certo Novácio, que mais tarde foi martirizado, foi um bem conhecido ensinador entre estas igrejas. Eles não aceitavam nome algum, mas afirmavam ser individualmente cristãos e irmãos. Não reconheciam como igreja aquela que uniu-se ao Estado, nem davam qualquer valor às suas ordenanças.
Estes irmãos, bem como os demais Montanistas, se opunham à hierarquia na igreja, e ensinavam e praticavam a verdade do sacerdócio de todos os salvos. Foram inimigos implacáveis das inovações que gnósticos e pagãos introduziam nas igrejas. Discordavam também daqueles Montanistas que diziam possuir dons espetaculares, tais como o de línguas e profecia (veja O Cristianismo Através dos Séculos, págs. 86-87).
Durante muitos anos estes irmãos continuaram o seu testemunho. Espalharam-se por diversas partes do Império Romano, especialmente no Norte da África e na atual Turquia. Em Ecclesiastical Researches o Dr. Robinson escreve: “Continuaram a florescer por duzentos anos. Depois, quando as leis penais os obrigaram a se esconder em lugares retirados e adorar a Deus secretamente, foram designados por vários nomes, e a sua sucessão continuou até a Reforma”.
No quarto século havia muitas destas igrejas na atual Turquia e na Armênia, muitas das quais haviam começado nos dias dos apóstolos (provavelmente fruto dos trabalhos de Paulo e seus companheiros). Além do Eufrates, onde provavelmente Pedro e outros trabalharam bastante, havia ainda muitas igrejas seguindo o modelo original. Retomaremos a história destas igrejas após uma breve referência aos Donatistas.
Os Donatistas
Este movimento no Norte da África foi influenciado pelos chamados Novacianos. Receberam o nome de Donatistas porque dois dos seus ensinadores mais notáveis se chamavam Donato. Este grupo separou-se da igreja dos bispos por questões disciplinares, mas manteve a mesma forma de hierarquia; não voltou ao modelo deixado nas Escrituras. E. H. Broadbent diz: “Os Donatistas, sendo muitos no norte da África, e tendo mantido muito da organização católica, possuíam condições para apelar ao Imperador no seu conflito com o grupo católico” (The Pilgrim Church, págs. 20-21). Discordavam da Igreja Católica, pois acreditavam que o caráter moral dos ministrantes afeta seu ministério. Foram condenados em concílios convocados pela Igreja Católica e cruelmente perseguidos. Foram finalmente extintos quando a invasão maometana atingiu o Norte da África.
Assim podemos ver que a ideia de que existia, nos primeiros três séculos, uma igreja verdadeiramente católica e unida está longe da verdade. Muito pelo contrário, a verdade incontestável é que naqueles dias, como agora, havia várias correntes de testemunho, vários grupos que mutuamente se excluíam. O livro O Cristianismo Através dos Séculos, comentando os primeiros três séculos do cristianismo, diz: “… o crescimento fora fenomenal … Também o Cristianismo ganhara alta posição social e, em muitas igrejas, grande parte dos membros eram ricos … Esta expansão, todavia, custou um alto preço. Se o Cristianismo venceu o paganismo, de seu turno, o paganismo operou transformação no Cristianismo … O mundo grego-romano fora cristianizado, e o Cristianismo, em parte, paganizado. Todavia, seria erro supor que esta situação prevalecesse … em todas as igrejas … Entre os grupos dissidentes havia uma aproximação ao Cristianismo primitivo” (págs. 126-127).
Constantino (Século IV e Posteriormente)
Quando Constantino entrou vitorioso em Roma ele pôs fim às perseguições aos cristãos. Estes haviam sofrido desde o começo, primeiramente nas mãos dos judeus e depois nas do Império Romano. Todos os grupos de igrejas, bem como aquelas igrejas que não faziam parte de grupo algum, sofriam a mesma perseguição.
Com o Imperador Constantino, porém, uma fase nova começou. Este Imperador, sem renunciar a sua posição de Pontífice Máximo da religião pagã, assumiu a mesma posição entre os cristãos. O célebre intelectual brasileiro, Rui Barbosa, escreveu na introdução do livro que traduziu (O Papa e o Concílio): “Foi o que entrou a suceder sob Constantino. Estreou-se aí o sacrifício do cristianismo ao engrandecimento da hierarquia. O Imperador não batizado recebe o título de bispo exterior; julga e depõe bispos; convoca e preside concílios; resolve sobre dogmas. Já não era mais esta … a igreja dos primeiros cristãos”.
No mesmo livro, Rui Barbosa continua descrevendo a Igreja que se uniu ao Império, e comenta: “de perseguida, tornou-se perseguidora”. Logo, todo o poder do Império estava à disposição dos bispos e, liderados pelos Metropolitanos, não hesitaram em perseguir aquelas igrejas que ainda mantinham fielmente o ensino apostólico. Na medida do possível eles procuravam exterminar os verdadeiros servos de Deus, e juntamente com eles destruíam, quando possível, todos os seus escritos. Esta é a razão da escassez de informações existentes quanto à história das igrejas locais. É necessário também lembrar que a Igreja Católica as difamava injustamente, chamando-as de hereges e dando-lhes nomes, tais como Paulicianos, Cátaros e outros; nomes estes que estas igrejas repudiavam.
Ao prosseguir por esta estrada escura convém lembrar de certos fatos. As acusações feitas pela “Igreja” perseguidora não são de confiança, a não ser quando há evidências para sustentá-las. Além disto, devemos lembrar da tendência de generalizar. As igrejas locais, como mencionamos acima, não reconheceram qualquer nome denominacional, mas os perseguidores as chamavam de Paulicianos, e outros nomes. Não devemos pensar que todos os que a Igreja Católica classificava de Paulicianos compartilhavam as mesmas crenças.
Em nossos dias, o nome de “crente” inclui muitos grupos com pensamentos e práticas diferentes, e foi assim através dos séculos. Qualquer historiador que tentasse escrever sobre o cristianismo no Brasil neste século XX daria destaque aos movimentos pentecostal e carismático, e pouco ou nada teria a dizer das igrejas locais que não fazem parte de organização alguma, porque mantém fielmente os princípios da Palavra de Deus (por exemplo, a autonomia de cada igreja local).
Mas, apesar da escassez de informações, surge um fato inegável: em todo este período, desde o Imperador Constantino até à Reforma, as igrejas locais continuaram a existir, e a seguir fielmente o modelo da Palavra de Deus. Veja algumas evidências disto.
Apesar da perseguição feroz e da difamação cruel, alguns escritos daquela época ainda existem, o que permite que a verdade seja conhecida, pelo menos em parte.
Os Paulicianos
Não se sabe ao certo por que receberam este nome, mas presume-se que foi devido ao destaque que davam às cartas de Paulo. A Igreja Católica os chama de hereges, e os acusa de toda a sorte de perversidade, porém a verdade é bem outra. Gregório, considerado um dos “Pais da Igreja”, e inimigo dos Paulicianos, escreveu: “não são acusados de perversidade de vida, mas sim de livre pensamento e de não reconhecer autoridade. De uma posição negativa quanto à igreja, eles tomaram uma posição positiva, e começaram a examinar o próprio fundamento, as Escrituras Sagradas, procurando ali um ensino puro, e direção sadia para a sua vida moral” (The Pilgrim Church, pág. 59-60). E. Gibbon, um historiador do século XVIII, escreveu dos Paulicianos: “Foi esta a forma primitiva do cristianismo”.
Estas igrejas se espalhavam na Ásia e na Armênia até além do Eufrates. The Pilgrim Church comenta que eram “igrejas de crentes batizados, discípulos do Senhor Jesus Cristo, que guardavam a doutrina dos apóstolos, num testemunho ininterrupto desde o começo” (pág. 44).
No ano de 1891 a.D., W. J. Coneybeare descobriu na Biblioteca do Santo Sínodo em Edjmiatzin, na Armênia, um documento provavelmente escrito por um dos chamados Paulicianos, entitulado A Chave da Verdade. A descoberta deste documento, e outros mais, permitiu que a verdadeira história deste povo, pelo menos em parte, fosse conhecida. Coneybeare comentou: “A igreja Pauliciana não era uma igreja nacional, nem de uma raça particular, mas uma velha forma da igreja apostólica”. Devemos lembrar que eles mesmos repudiavam o nome “igreja Pauliciana”. A Chave da Verdade mostra que eles destacavam a necessidade de arrependimento e fé antes do batismo; suas igrejas eram governadas por anciãos.
Sendo igrejas autônomas, sem um centro que dirigisse ou organizasse, é provável que havia certas diferenças entre estas igrejas, mas o pouco que sabemos deles mostra uma determinação de fazer tudo conforme o modelo nas Escrituras.
Constantino Silvano
Em cerca de 653 a.D. um cristão da Armênia hospedou-se na casa de um certo Constantino, e ao despedir-se deixou um presente de grande valor – uma cópia dos quatro Evangelhos e das epístolas de Paulo. A leitura das Escrituras impressionou muito este homem, e resultou na sua conversão. Imediatamente, ele “resolveu dedicar-se a trabalhar com todo o esforço, a fim de conseguir a volta do cristianismo à sua primitiva forma” (O Cristianismo Através dos Séculos, pág. 165). Outro historiador escreveu: “O estudo destes escritos … bem depressa afastou do espírito de Constantino qualquer ideia falsa que pudesse ter tido, e deu-lhe um sincero desejo de novamente ver a igreja naquele estado de simplicidade que a distinguia no tempo dos apóstolos” (A História do Cristianismo, A. Knight e W. Anglin). Ele foi um dos Paulicianos mais conhecidos, e devido ao seu zelo e fidelidade foi apedrejado em 690 a.D. Dizem que 100.000 Paulicianos foram mortos na Armênia, por ordem da Imperatriz Teodora.
Com o passar do tempo, sinais de degeneração começaram a aparecer. Alguns, provocados pela perseguição feroz nos dias da Imperatriz Teodora, pegaram em armas para se defenderem; abandonaram a atitude pacifista dos milhares de mártires que haviam selado seu testemunho com o próprio sangue. Alguns sinais de degeneração doutrinária também começaram a aparecer, e como exemplo disto citamos a questão do batismo. Inicialmente estas igrejas insistiam na necessidade de arrependimento e fé antes do batismo, o qual foi administrado por imersão. “Parece que o modo geral de batismo entre os últimos Paulicianos era afusão, ainda que … os primitivos praticassem imersão” (O Cristianismo Através dos Séculos, pág. 169-170).
Vemos outro exemplo desta degeneração na questão do pão e do vinho na Ceia do Senhor. Pelo menos alguns entre eles passaram a considerar que estes emblemas “abençoados” eram mudados no corpo e sangue de Cristo, e chamavam esta ordenança de “mistério da salvação”.
Expansão dos Paulicianos
Devido ao trabalho missionário dos Paulicianos o Evangelho chegou a muitos lugares, especialmente à Bulgária, Bósnia e Sérvia, e “no princípio do século VIII as doutrinas paulicianas espalharam-se por toda a Europa, firmando-se no sul da França, onde mais tarde floresceram os Albigenses” (O Cristianismo Através dos Séculos, pág. 68).
As igrejas que foram plantadas na Bulgária continuaram durante muito tempo, e mesmo no século XVII há evidências de congregações conhecidas como “Pavlicani” (Paulicianas). Estas foram descritas pela Igreja Ortodoxa como “hereges convictos”, enquanto que elas classificaram a Igreja Ortodoxa de “idólatra”. A degeneração espiritual também atingiu estas igrejas, e gradualmente foram desviadas das verdades que outrora defendiam, e pelo esforço de missionários franciscanos, finalmente foram absorvidas pela Igreja Católica Romana. Os candeeiros iam sendo removidos, mas o testemunho iria continuar em outros lugares.
Muitas igrejas na Bulgária foram apelidadas também de “Bogomili”, significando “amigos de Deus”, mas sendo perseguidas cruelmente pelo Império Bizantino, os cristãos fugiram para o oeste, e muitos entraram na Sérvia, mas o poder da Igreja Ortodoxa logo obrigou-os a fugir para a Bósnia.Bósnia
No século XII havia muitas igrejas locais na Bósnia, no tempo de Kulin Ban, um dos mais eminentes governantes daquele país. Ele e sua esposa, bem como milhares de Bósnios, deixaram a Igreja Católica. E. H. Broadbent diz no livro The Pilgrim Church: “Não havia sacerdotes; eles reconheciam o sacerdócio de todos os salvos. As igrejas eram guiadas por anciãos … vários deles em cada igreja. Reuniões poderiam ser convocadas em qualquer casa, e os lugares de reunião regular eram simples, sem sinos ou altares” (pág. 61).
No início do século XIII, sob ameaça de invasão, as autoridades da Bósnia cederam às pressões do Papa e a liberdade cessou, mas as igrejas continuaram, apesar de perseguidas.
O Papa finalmente persuadiu o Rei da Hungria a invadir a Bósnia por causa do fracasso das medidas anteriores, e a Bósnia foi devastada. As igrejas, porém, continuaram o seu testemunho. Diante desta situação o Papa convocou todo o “mundo cristão” para uma “guerra santa”, e também estabeleceu a Inquisição no ano de 1291, para destruir definitivamente “os hereges”.
É nesta época que observamos uma comunhão verdadeira entre estas igrejas e seus irmãos no sul da França, Alemanha e outros lugares, estendendo-se até a Inglaterra e Itália. Numa época de grande perseguição contra os chamados Albigenses no norte da Itália e sul da França, muitos irmãos conseguiram fugir e achar proteção na Bósnia (The Pilgrim Church, pág. 62).
Estas igrejas da Bósnia formam um elo entre as igrejas primitivas da era apostólica e as outras que surgiram posteriormente nos Alpes da Itália e França.
Quando muitos irmãos tiveram de deixar a Bósnia devido às perseguições, passaram pela Itália e chegaram ao sul da França. Pelo caminho todo encontraram com muitos cristãos que compartilhavam a mesma fé. Havia ainda nesta época cristãos que aceitavam as Escrituras como sua única regra de fé. Um dos seus perseguidores queixou-se bastante da atitude destes cristãos em recusar qualquer nome denominacional, e em não reconhecer homem algum como seu fundador. Ele escreveu: “Pergunte a eles quem é o fundador da sua seita, e não apontarão homem algum … Sob que nome ou sob que título poderá se arrolar estes hereges? Na verdade, sob nome algum, pois a heresia deles não é derivada de homens, mas sim dos demônios”. Mesmo assim outro líder dos Inquisidores os chamou de “Igreja dos Cátaros”, ou seja, “Igreja dos de vida pura”, e testificou que eles se estendiam desde o Mar Negro até ao Atlântico.
Nos vales dos Alpes estas igrejas se reuniam durante séculos e, embora recusassem reconhecer nome algum, foram conhecidos como Valdenses, Albigenses, etc. Diziam existir desde os tempos dos apóstolos. Não eram igrejas “reformadas”, pois nunca desviaram daquele modelo apresentado no Novo Testamento, como fizeram as igrejas que formaram a Igreja Romana, a Ortodoxa , e outras. A posição básica destas igrejas era a de considerar as Escrituras como o padrão para os seus dias, não sendo anuladas pelas mudanças nas circunstâncias. O seu alvo era manter o caráter do cristianismo original.
O testemunho dos seus perseguidores é impressionante. Um dos Inquisidores escreveu, em meados do século XIII: “Esta seita é a mais perniciosa de todas, por três razões:
- É a mais antiga; alguns afirmam que existe desde o tempo dos apóstolos;
- Alastrou-se muito: existe em quase todos os países;
- Eles tem vidas justas e creem tudo a respeito de Deus; apenas blasfemam a Igreja Romana e os seus clérigos”.
É um fato histórico que diversos grupos floresceram no sul da França, alguns mais, outros menos evangélicos, do princípio do século XII em diante. Já mencionamos como os perseguidores generalizavam, e isto aconteceu também neste caso, pois o nome Albigenses foi usado de todos os que não se sujeitaram à soberania do Papa. Daí vem muita confusão (veja O Cristianismo Através dos Séculos, pág. 306). Verdadeiras igrejas locais e grupos sectários se confundem na terminologia dos perseguidores, pois classificavam todos os que não reconheciam a Igreja Católica como Albigenses.
Apesar desta confusão, é mais que evidente que sempre houve igrejas conforme o modelo do Novo Testamento desde os tempos dos apóstolos, embora nem sempre no mesmo lugar.
Não há dúvida de que havia igrejas nos vales dos Alpes, conhecidas como Valdenses, que baseavam a sua fé e prática somente nas Escrituras, e eram verdadeiros seguidores daqueles que desde a era apostólica fizeram o mesmo. O livro já citado, The Pilgrim Church, diz: “Não possuíam nenhum credo, ou religião, ou regras, a não ser as Sagradas Escrituras, e não permitiam que a autoridade de homem algum substituísse a autoridade das Escrituras” (pág. 98).
Dois documentos datados do século XIII, e escritos por seus perseguidores, são importantes para nos dar uma ideia de quem eram estes Valdenses. Um destes documentos os descreve da seguinte forma: “vestiam-se com relativa simplicidade, comiam e bebiam moderadamente, eram sempre laboriosos e estudiosos, havendo entre eles muitos homens e mulheres que sabiam de cor todo o Novo Testamento”. O segundo diz que “rejeitavam os milagres religiosos e os festivais, etc”. (veja O Cristianismo Através dos Séculos, págs. 319-320). Os mesmos documentos mostram que rejeitavam o batismo de crianças e a transubstanciação. Os próprios depoimentos dos perseguidores mostram que estas igrejas perseguidas estavam seguindo bem de perto o modelo deixado no NT.
No final da chamada “Idade Média” havia, além das muitas igrejas locais bíblicas, movimentos de protesto dentro da própria Igreja Romana. Muitos verdadeiros cristãos, ainda ligados ao sistema papal, pregavam ousadamente o Evangelho puro, e muitos tiveram de pagar com a própria vida. Embora o nosso propósito seja seguir a história de igrejas locais, não podemos deixar de mencionar nomes como Marcílo de Pádua, na França, e mais tarde João Wycliff na Inglaterra, Conrado do Waldhausen, Pedro Chelcicky da Boêmia, João Huss de Praga, e um verdadeiro exército de reformadores como eles, antes da tão falada Reforma do século XVI.
A Reforma – Século XVI
Antes, e até à ocasião da Reforma, havia em muitas partes da Europa grupos de Igrejas que procuravam seguir o modelo do Novo Testamento, e consequentemente não aceitavam nome denominacional. Em 1463 a.D. e também em 1467 a.D. houve Conferências de alguns destes irmãos, quando consideraram juntos os princípios da igreja. Naquelas Conferências declararam formalmente a sua separação da igreja Romana, e se descreveram como “Unitas Fratrum”, ou seja, Irmãos Unidos, acrescentando que não queriam formar um novo grupo, nem separar-se dos irmãos que, sem qualquer denominação, reuniam-se em muitos países.
Por este fato podemos perceber que havia muitas igrejas naquela época que procuravam agir de acordo com o modelo bíblico de igreja local, mas havia entre elas algumas divergências. Algumas (como as igrejas dos Irmãos Unidos), ao mesmo tempo que procuravam manter a autonomia local, estabeleceram uma certa federação e adotaram, com reservas, um nome. Outras igrejas, porém, permaneceram fiéis ao modelo primitivo, recusando participar destas Conferências e recusando qualquer nome, mesmo o de “Irmãos Unidos”.
Não está no escopo deste livreto contar a bem conhecida história da Reforma, mas precisamos observar o efeito dela nestas igrejas locais. Geralmente se crê que a Reforma dividiu a Europa entre Católicos e Protestantes. O grande número de cristãos que reuniam na simplicidade do modelo do Novo Testamento é ignorado. Eram, porém, tão numerosos que tanto a Igreja Católica quanto as Igrejas Protestantes temiam que poderiam ameaçar a sua supremacia. Este fato levou tanto Católicos quanto Protestantes a perseguirem cruelmente aqueles cristãos que não reconheciam a sua autoridade.
Martinho Lutero
Martinho Lutero compreendeu claramente o plano de salvação pela fé, e por suas pregações claras e poderosas levou muitos à certeza da salvação. Também entendeu perfeitamente os princípios bíblicos da igreja, mas após uma intensa luta consigo mesmo os abandonou. Johannes Warns, no seu livro Baptism, comenta com surpresa que “um homem como Lutero, que em 1520 a.D. … defendeu a liberdade do cristão; que em 1526 a.D., no seu tratado German Mass and Order of Divine Service, testificou que conhecia bem o modelo duma igreja de crentes, biblicamente organizada, mais tarde mudou de forma tão radical, contradizendo seus próprios princípios” (pág. 184). Warns ainda afirma: “historicamente nada é mais incorreto do que a afirmação de que a Reforma foi um movimento para a liberdade de consciência” (pág. 188).
Os Anabatistas
É nesta época que aparece nas páginas da história o nome “Anabatista”. Significa “Rebatizador”, e foi usado para descrever todos aqueles que rejeitavam a aspersão de crianças, e praticavam a imersão de adultos já salvos. As igrejas locais que procuravam continuar na simplicidade do modelo do Novo Testamento sempre fizeram assim, e obviamente estavam incluídas sob este apelido, junto com diversos grupos que adotavam a mesma posição em relação ao batismo.
A Igreja Católica os perseguia até à morte. Lutero e Zwinglio, líderes das Igrejas Protestantes da Reforma, tomaram a mesma posição, causando o martírio de milhares de cristãos.
No início as igrejas locais se alegraram muito com o aparecimento de Lutero, passando a testemunhar de forma muito mais pública. A sua alegria e liberdade, porém, durou pouco. Johannes Warns, no já citado livro, diz: “Estas comunidades (as igrejas locais) receberam com alegria e com grande expectativa o advento de Lutero. Os princípios antigos duma comunhão cristã bíblica … foram proclamados abertamente … Quando, porém, Lutero e seus companheiros, bem como Zwinglio, abandonaram a ideia de formar igrejas de crentes conforme o modelo bíblico, preferindo estabelecer Igrejas unidas ao Estado, surgiu um antagonismo cruel” (pág. 191) contra todos que recusaram incorporar-se a estas Igrejas do Estado.
E. H. Broadbent escreve em The Pilgrim Church: “A esperança despertada entre os irmãos gradualmente desapareceu à medida que eles se viam entre dois sistemas eclesiásticos (Católico e Protestante), ambos dispostos a usar a espada para forçar conformidade” (pág. 147).
As igrejas locais sempre foram perseguidas. Nos primeiros três séculos desta era foram perseguidas pelos judeus, e depois pelo Império Romano. Desde a “conversão” do Imperador Constantino estas igrejas passaram a sofrer a perseguição por parte das Igrejas do Estado (Romana no ocidente e Grega no oriente). Agora, porém, havia mais uma agravante. As igrejas Protestantes de Lutero e Zwinglio as perseguiam também, queimando milhares de cristãos e afogando outros. Por não negarem a sua convicção quanto à autonomia da igreja local e o batismo somente daqueles que creem, e por não aceitarem a doutrina da Transubstanciação, foram martirizados pelos seus próprios irmãos em Cristo, os Luteranos da Alemanha e os Protestantes da Suíça.
Devemos esclarecer, porém, que nem todos que eram apelidados de Anabatistas estavam seguindo verdadeiramente o modelo bíblico. Havia joio no meio do trigo, mas é um fato inegável que as igrejas que aderiram aos princípios do Novo Testamento foram tão cruelmente perseguidas, tanto pelos católicos como pelos evangélicos, que quase desapareceram das páginas da história. Acharam refúgio por algum tempo na Áustria, mas os anos que seguiram à Reforma foram entre os mais difíceis para estas igrejas. Praticamente eliminadas na Alemanha e na Suíça, e perdendo a proteção na Áustria, alguns conseguiram fugir para a Holanda e daí para a Inglaterra, onde continuaram apesar de constantes perseguições. E. H. Broadbent comenta que além da Igreja Católica, a Igreja da Inglaterra, e as denominações evangélicas que havia naquele tempo na Inglaterra, “havia também grupos de crentes que correspondiam às igrejas de Deus do Novo Testamento … mas seu testemunho foi mantido … no meio de circunstâncias tão confusas que constituíram uma verdadeira prova de fé e amor” (pág. 247-248).
O Século XIX
No começo do século XIX a história registra um aumento realmente impressionante destas igrejas locais, começando na Irlanda e estendendo-se quase que simultaneamente a vários países na Europa. Sem dúvida alguma foi uma obra do Espírito Santo. Em 1827 a.D. alguns cristãos na cidade de Dublin, na Irlanda, começaram a reunir-se para partir o pão e edificar-se mutuamente. Não sabiam que outros, por exemplo perto de Omagh na Irlanda do Norte, e em Georgetown na Guiana Inglesa, já estavam fazendo a mesma coisa. Rapidamente mais e mais igrejas locais e autônomas surgiram em muitos lugares.
Logo no começo daquela igreja em Dublin destacou-se um irmão que teria um impacto muito grande, não só na Irlanda, mas em todo o mundo. Era J. N. Darby. Até hoje quantos cristãos e quantas igrejas sentem os resultados benéficos dos trabalhos incansáveis daquele saudoso servo do Senhor. Quando, porém, ele adotou a ideia de que o corpo místico de Cristo é algo visível na Terra, ele foi levado a conclusões errôneas que trouxeram muito prejuízo ao povo de Deus, provocando uma divisão entre igrejas que até então gozavam de preciosa comunhão mútua. Afirmou que os santos que já partiram estão com Cristo, e consequentemente nesta condição não fazem parte do corpo de Cristo que (a seu ver) é algo visível na Terra (Letters of J.N.D. Vol. 1, pág. 527). Desta forma, ele contemplava um corpo que o Novo Testamento não reconhece. A consequência inevitável deste ensino foi a formação duma seita – exatamente a ideia que ele procurava combater!
As igrejas que seguiram este ensino de J. N. Darby foram apelidadas de “Exclusivistas”, mas a bem da verdade devemos reconhecer que estes queridos irmãos não adotam este ou qualquer outro nome. Desde então houve frequentes divisões entre eles, e sub-divisões, o que é consequência inevitável do ensino errado quanto ao corpo de Cristo.
As igrejas que não seguiram este ensino se espalharam pelo mundo inteiro, mas muitas delas, embora dizendo ser igrejas neotestamentárias, tem desviado muito da sua posição original, imitando as práticas das denominações chamadas evangélicas e tornando-se como elas. Enquanto ainda professam aceitar o sacerdócio de todos os crentes, estão dependendo mais e mais da liderança dum chamado “obreiro”, que em muitos casos já é reconhecido como o Pastor da igreja. Ainda dizem ser igrejas autônomas, mas já faz bastante tempo que dizem ser do “Movimento dos Irmãos”. E esta descrição está sendo modificada em nossos dias, pois alguns já dizem que são das “igrejas dos Irmãos”. Ainda dizem que não são denominacionais, mas estão caindo no mesmo erro dos “Irmãos Unidos” ao realizarem suas Conferências em 1463 a.D e 1467 a.D.
Apesar da divisão triste do século XIX, e dos grandes desvios atuais, ainda há no mundo hoje, em muitos países, igrejas locais e autônomas. Obviamente não tem denominação, nem sede, pois aceitam somente as Escrituras Sagradas para sua orientação, e dependem dos dons e da direção do Espírito Santo para sua continuação.Estão, porém, sempre em perigo. Às vezes foram, e ainda são (em alguns lugares) cruelmente perseguidas, mas o maior perigo hoje é a inerente tendência humana de desviar-se de Deus. Muitas igrejas locais tem deixado de existir não devido à perseguição, mas devido ao seu desvio da Palavra de Deus. O Senhor mesmo removeu o candeeiro.
Conclusão
Temos caminhado rapidamente pelo caminho escuro seguido por igrejas locais durante estes quase dois mil anos desta dispensação. Temos percebido, mesmo nos primeiros anos do seu testemunho, quando os apóstolos ainda viviam, uma tendência constante de desviar-se de Deus e do modelo que Ele estabeleceu. Além disto, temos visto um esforço da parte de Satanás para destruir estas igrejas, desviando-as da simplicidade que há em Cristo (II Cor 11:3).
Devido à pouca informação confiável que possuímos, o caminho que acabamos de seguir é obscuro. Uma coisa, porém, fica perfeitamente clara. Apesar das falhas humanas e dos ataques satânicos, Deus nunca Se deixou a Si mesmo sem testemunho (At 14:17). Embora muitas igrejas desviaram da simplicidade original, degenerando-se ao ponto de serem removidas pelo próprio Senhor, sempre houve na Terra verdadeiras igrejas locais, desde a formação da primeira igreja em Jerusalém (Atos 2).
Quando “candeeiros” precisavam ser removidos, o Senhor levantava outras igrejas em outros lugares. O testemunho não se apagava; o candeeiro é que era removido. Em nossos dias, quase dois mil anos depois da primeira igreja, ainda há muitas igrejas conforme o modelo do Novo Testamento – Deus é fiel, Ele tem preservado o testemunho. Que nós sejamos fiéis, guardando a Sua Palavra, apesar dos desvios de muitos em nossos dias.
Nossa Responsabilidade
A fidelidade de Deus não nos livra de responsabilidade. Em nossos dias, provavelmente os últimos dias do testemunho de igrejas locais na Terra, vemos os ataques de Satanás se redobrarem cada dia. Igrejas que outrora amavam a simplicidade do modelo divino agora adotam as maneiras e os métodos das denominações. Com muita música e atividades sociais procuram atrair as pessoas e manter os jovens na igreja. Dão muita importância às tradições humanas e às opiniões da sociedade em que vivem, e deixam de lado a Palavra de Deus como algo fora de moda. Muitas já perderam todas as características das verdadeiras igrejas de Deus. A situação é confusa, mas ainda é possível manter o modelo que Deus estabeleceu nas Escrituras.
Deus não mudou. O modelo na Sua Palavra não mudou; a nossa responsabilidade é clara. O cristão não deve tornar-se membro de denominação alguma, mas sim separar-se de todas elas para reunir-se com outros cristãos, simplesmente como cristãos, em Nome do Senhor Jesus Cristo, formando assim uma igreja local e autônoma, onde o Senhor Jesus é a única atração, e a Sua Palavra a única autoridade. Estas igrejas não precisam, nem devem, unir-se a movimento algum; mas ao mesmo tempo que mantém a sua autonomia, devem cultivar comunhão com outras igrejas que seguem os mesmos princípios.
Tais igrejas podem ser fracas, pequenas, e desprezadas pelo mundo religioso, mas o Senhor lhes deixou uma promessa animadora: “eis que diante de ti pus uma porta aberta, e ninguém a pode fechar; tendo pouca força, guardaste a Minha Palavra, e não negaste o Meu Nome” (Ap 3:8).
“Pelo que saí do meio deles, e apartai-vos, diz o Senhor; e não toqueis nada imundo, e Eu vos receberei” (II Cor 6:17).
“Saiamos pois a Ele fora do arraial, levando o Seu vitupério”. (Hb 13:13).
Ronaldo E. Watterson