A Cruz de Cristo

A Pregação da Cruz

Nas Epístolas em que os fatos fundamentais do Evangelho são proeminentes, Paulo mostra uma variedade de facetas da cruz. Em 1 Coríntios, ele se refere à pregação (ou “palavra”) da cruz, que ele afirma e prova ser a revelação do poder e da sabedoria divinos, direcionando nossa atenção para o mistério que ela revela (1Cor 2:7-8). Ao escrever para as igrejas da Galácia, ele indica a perseguição e a calúnia que teve de suportar como pregador do Evangelho por parte dos inimigos da cruz de Cristo. Isso significou para ele “a ofensa da cruz”. Na carta aos Efésios, o Apóstolo exalta o poder da cruz pela qual o muro de separação entre judeus e gentios foi demolido, e a consequente unidade que a cruz efetuou (Ef 2:15-16). A igreja de Filipos é lembrada da humildade da cruz de Cristo quando Ele, que é ‘na própria forma de Deus, com a glória celestial coroada’, humilhando-se, assumiu a forma de servo e se submeteu à ‘morte de cruz’ com toda a sua vergonha e angústia. O triunfo da cruz é o aspecto especial tratado em Colossenses, pois pelo ‘sangue de Sua cruz’ a reconciliação com Deus se tornou possível (Cl 1:20; 2:14-15). Neste estudo final, estamos preocupados com quatro expressões relacionadas à cruz que ocorrem nessas cartas.

i. A “morte de cruz” foi o passo final na auto-humilhação de Cristo: (Fp 2:8)

ii. O “sangue de Sua cruz” leva o pecador a Deus em plena reconciliação: (Cl 1:20-21)

iii. “A palavra da cruz” é o tema central de todos os verdadeiros pregadores do Evangelho: (1Cor 1:18)

iv. “A ofensa da cruz” é a reprovação que eles recebem dos professores legalistas: (Gl 5:11)

(1) “A morte de cruz foi o passo final naquela tremenda descida do Filho de Deus da mais alta glória do Céu até as mais profundas profundezas da vergonha e da pobreza. O autor da epístola usa isso para aconselhar os cristãos de Filipos a possuírem e demonstrarem a humildade de espírito que caracterizava seu Senhor e Mestre. Kenneth S. Wuest, comentando a declaração nessa passagem (Fp 2:5-8) de que Cristo Jesus “se tornou obediente até a morte, e morte de cruz”, escreve: “Isso não significa que Ele se tornou obediente até a morte. Ele sempre foi o Mestre da morte. Nosso Senhor foi obediente ao Pai até o ponto de morrer”. A morte na cruz foi a punição de criminosos notórios que não tinham o privilégio da cidadania romana; e está além da compreensão humana que Aquele que ‘ocupava o lugar mais alto, adorado por todos os filhos da chama’, devesse se rebaixar a tal degradação. Se Ele, que é o Criador e Senhor de tudo, submeteu-se a tal morte e demonstrou tamanha humildade para cumprir a vontade de Seu Pai, certamente todos os que são de Cristo e proclamam esse Salvador devem estar constantemente imbuídos do mesmo espírito.

(2) A expressão em Colossenses 1:20 — ‘o sangue de Sua cruz’ — ocorre somente aqui. Devemos entender por ela, é claro, “o sangue que Ele derramou quando morreu na cruz”. O sangue de Cristo derramado na morte na cruz tornou possível a reconciliação com Deus de todos aqueles cuja associação com o pecado criou uma barreira que os excluiu de Sua santa presença. O propósito da cruz — reconciliar todas as coisas consigo mesmo — foi, portanto, completamente cumprido quando, na cruz, “Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não lhes imputando as suas ofensas” (2Cor 5:19). Para aqueles santos em Colossos e irmãos fiéis em Cristo Jesus a quem a carta foi endereçada, essa reconciliação já havia se tornado efetiva, pois o Apóstolo lhes diz: “Vós, que noutro tempo éreis estranhos e inimigos no vosso entendimento, por obras iníquas, agora, porém, vos reconciliou”. O embaixador de Cristo, portanto, proclama a cruz como prova e argumento do amor reconciliador de Deus, suplicando aos homens que, no lugar de Cristo, se reconciliem com Deus por meio da mediação dAquele que não conheceu pecado, mas foi “feito pecado por nós”. Todo crente, portanto, embora já tenha sido um inimigo, foi reconciliado com Deus por meio da morte de Seu Filho (Rm 5:10).

(3) Ao escrever para os santos de Corinto, Paulo depreciou o espírito de desunião e as divisões que haviam prejudicado sua vida espiritual e seu testemunho. Em vez de manter a unidade do Espírito no vínculo da paz, os cristãos de lá haviam se formado em facções, reunindo-se em torno de seus líderes populares e adotando nomes denominacionais. Alguns alegavam ser seguidores de Paulo, outros de Pedro, enquanto outros se associavam a Apolo. Paulo rejeita a liderança de qualquer partido e, como prova disso, protesta que sua missão não era batizar ou angariar apoio, como os candidatos a cargos públicos que fazem uma exibição de sua oratória, mas pregar o Evangelho. Sua mensagem era, portanto, ‘a palavra da cruz’, que todos ‘sendo salvos’ reconheciam ser o poderoso instrumento de Deus para sua salvação. A expressão “a palavra da cruz”, em contraste direto, no contexto em que aparece, com “a sabedoria das palavras”, enfatiza a simplicidade da pregação do apóstolo. Ao mesmo tempo, ele reconheceu a profundidade transcendente de seu tema, uma vez que estava além da compreensão dos príncipes deste mundo. A simplicidade, a sinceridade e a lucidez devem caracterizar a pregação de todo verdadeiro evangelista. Nisso, Paulo é nosso exemplo, pois, na cidade de Corinto, altamente culta, mas grosseiramente imoral, ele decidiu não conhecer e pregar nada além de Jesus Cristo e Sua cruz. No entanto, que riqueza de sabedoria divina essa mensagem continha, pois em Cristo “estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento”.

(4) A palavra grega, traduzida como “ofensa” na última das quatro expressões que estamos considerando, é a palavra da qual derivamos nossa palavra inglesa “escândalo”. Ela é traduzida em outros lugares como “pedra de tropeço” (Rm 14:13; 1Cor 1:23). Em Romanos 10:4, Paulo afirma que Cristo é o fim da lei para a justiça de todo aquele que crê. Professores judaizantes haviam visitado as igrejas da Galácia na ausência do apóstolo e insistiam que esses cristãos, convertidos dos gentios, deveriam ser circuncidados e guardar a lei para serem justificados. Em Gálatas 2:21 e 3:13, Paulo mostra a eles que a cruz teria sido desnecessária se uma posição justa diante de Deus pudesse ser alcançada pelas obras da lei. A falsa doutrina que foi promulgada na época por esses mestres legalistas está sendo propagada em nossos dias por seitas que apontam o quarto mandamento da lei como sendo essencial para a salvação.

A. Naismith — “Escritos dos Irmãos de Plymouth”

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